A três meses das eleições, surge a primeira suspeita oficial de manipulação financeira promovida com dados eleitorais da campanha presidencial. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão do Banco Central, decidiu apurar se alguns bancos usaram pesquisas eleitorais para especular e aumentar seu faturamento. “Estamos apurando”, disse o presidente da CVM, José Luiz Osório. A investigação, segundo ele, terá continuidade na gestão do seu sucessor, Luiz Leonardo Cantidiano, que assume nesta segunda-feira. O Bank of America é uma das instituições financeiras estrangeiras investigadas. Ele solicitou pesquisa eleitoral ao Ibope, segundo o processo 6504/2002, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Há suspeitas sobre outros bancos e corretoras, como a Ágora Senior, que teria encomendado uma pesquisa ao Ibope. Também é investigada pela CVM uma pesquisa indicando que o candidato do PSB, Anthony Garotinho, passaria o candidato do PSDB, José Serra, o que não se confirmou. Uma das pesquisas teria causado o aumento do volume de negócios na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F).

Os advogados Célio Borja, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, e Fábio Comparato, professor de direito da Universidade de São Paulo (USP), apoiaram a investigação da Comissão. “Os bancos estão preocupados com o colapso argentino e, como as barbas do vizinho estão queimando, querem pôr as suas de molho”, disse Comparato. O professor da USP afirmou que “os bancos que atuaram no Brasil tiveram os maiores lucros do mundo. A política adotada pelo governo desde a época em que o economista Gustavo Franco presidia o Banco Central é uma política de favorecimento aos bancos estrangeiros e nacionais”.

Ciranda financeira – Comparato disse ainda que “os bancos ganharam muito mais dinheiro negociando títulos da dívida pública do que exercendo atividades relacionadas com o crédito”. Por isso, admitiu, é compreensível que estejam tão preocupados com as eleições brasileiras. O professor da USP afirmou ainda que “o modelo adotado no Brasil deixou o sistema financeiro brasileiro ‘hiperdrogado’ por altas doses de especulação, porque o organismo econômico do País está intoxicado, e ainda não se sabe como recuperar o paciente”. Francisco José de Toledo, do Instituto Toledo & Associados, diz que em 25 anos de atuação na área nunca viveu algo parecido: “Numa das pesquisas que fizemos para ISTOÉ a boataria chegou ao limite. Diretores de bancos e agências de risco me ligavam sem parar para ter informações privilegiadas. É um absurdo ver gente usando pesquisa para fins que nada têm a ver com política.”

Mas a preocupação dos bancos com o processo eleitoral brasileiro, segundo um advogado de Brasília, torna-se ainda mais óbvia quando seus consultores levam em conta o impacto dos fatores externos na economia nacional. O ex-ministro Célio Borja disse que “as pesquisas eleitorais ainda são inconsistentes, mas o que deve ser investigado é se houve ação ilícita para manipular dados dos institutos para criar situações ou estados de pânico no mercado ou tirar proveito financeiro”.