Dezessete anos separam A hora da estrela – estréia consagradora na direção da paulista Suzana Amaral – de seu segundo trabalho, Uma vida em segredo, em cartaz no Rio de Janeiro e em São Paulo a partir da sexta-feira 19. A despeito das óbvias semelhanças entre uma obra e outra, o que deve ser ressaltado neste bem-vindo retorno de Suzana às telas é que sua maneira honesta de fazer cinema não mudou nada durante o longo hiato. Nesta história intimista, passada numa pequena cidade da zona rural de Minas Gerais, estão novamente presentes o estilo contido, a economia de recursos e, mais importante, a mesma aposta num cinema que envolve o espectador, sem grandes efeitos ou lances espetaculares.

Difícil saber se é a escritura própria de Suzana que busca narrativas perfeitas para seu temperamento de diretora ou se são os livros nos quais se inspira que pedem uma aproximação tão comedida. Tanto faz. Se antes ela foi buscar o tema da incomunicabilidade na Clarice Lispector de A hora da estrela, desta vez fala da incapacidade de se abrir para o mundo a partir do romance homônimo de Autran Dourado. O enredo acompanha a trajetória de Biela (Sabrina Greve), jovem e rica interiorana criada numa fazenda, que depois de ficar órfã vai morar na cidade com a família do primo Conrado (Cacá Amaral). Autêntico bicho-do-mato, Biela não parece talhada para as prendas domésticas. No auge da sua aversão pelas regras citadinas, adota um cachorro vira-lata, Vismundo, que passa a ser seu canal de comunicação com a vida. Como fez em A hora da estrela, em que revelou o rosto comum de Marcélia Cartaxo, agora Suzana aposta na figura esquia e fora dos padrões de beleza de Sabrina Greve, que soube desvendar aos poucos os mistérios da alma silenciosa de sua personagem.