O futebol não é apenas uma paixão do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, corintiano roxo. O esporte nacional serviu como uma verdadeira inspiração na arquitetura de sua quarta campanha para conquistar o Palácio do Planalto. Como um bom técnico, Lula, desta vez, exigiu carta branca de seu partido para armar o time a seu modo. Cansou de brincar de candidato. Avisou aos petistas: “Quero o melhor publicitário, infra-estrutura e liberdade para fazer as alianças políticas.” Quando foi derrotado pela terceira vez, em 1998, Lula não perdeu tempo. Começou a construir pacientemente os pilares de sua quarta e última tentativa em um casarão de vidro fumê, na rua Pouso Alegre, no bairro do Ipiranga, em São Paulo, onde está instalada a ONG Instituto Cidadania. Foi o embrião de sua candidatura vitoriosa. O IC transformou-se num verdadeiro quartel-general de Lula, onde não tinha que dar satisfações ao PT. Livre das amarras das cobranças ideológicas das correntes xiitas, cada vez menos influentes, Lula pôde organizar, a partir de 1998, seminários que resultaram em projetos de políticas públicas com a participação de petistas e não petistas. Até tucanos havia no conselho consultivo da ONG. Poucos perceberam que, ao chocar os mais radicais chamando o empresário Antônio Ermínio de Moraes e o pefelista Antônio Carlos Magalhães para debater soluções para o País, Lula já erguia os alicerces para construir o pacto social que prometeu realizar em seu governo. Ao convocar sua seleção, Lula chamou quem quis, sem interferências de correntes internas do PT. Trouxe sua equipe do IC e os petistas mais próximos. Fez uma aposta de alto risco dentro de seu próprio partido. Se perdesse, Lula seria posto na fogueira. Ficou livre, leve e solto. Sem patrulhas, sem brigas internas, manteve o bom humor durante toda a campanha. O resultado, todos viram. No lugar do candidato carrancudo, surgiu o Lulinha paz e amor.

Antônio Palocci

Prefeito licenciado de Ribeirão Preto (SP), ele foi o regente da elaboração do programa de governo de Lula, o mais completo já apresentado numa campanha eleitoral. Era uma das obsessões de Lula caprichar na apresentação do programa, que acabou se desdobrando em vários cadernos temáticos. Um dos principais representantes da ala moderada do PT, Palocci também fez a ponte com o empresariado. Ele já havia colocado em prática na sua primeira gestão como prefeito, em 1993, e depois, em 2000, o pacto com as elites que Lula tanto apregoa. Chocou o partido ao realizar concessões à iniciativa privada em áreas como saneamento e ao fazer parcerias com o empresariado em vários setores. Tudo que Lula promete fazer em seu governo. “É uma linha alternativa às privatizações e deu muito certo”, diz Palocci. Assim como Lula, ele tem um vice empresário. Na eleição de 2000, escolheu como colega de chapa o presidente da Associação Comercial de Ribeirão Preto, Gilberto Maggioni.
 

Quem conhece bem a rede de relações do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva sabe que José Graziano é um dos homens mais influentes do líder petista. Está ao lado de Lula há duas décadas. Responsável por fornecer subsídios para debates e entrevistas do petista, ele tem
um farto currículo: formado em agronomia, fez mestrado em ciências sociais e doutorado em economia. Tem ainda dois pós-doutorados: um sobre estudos latino-americanos, na Universidade de Londres, e outro sobre desenvolvimento regional, na Universidade da Califórnia. Apesar da farta bagagem cultural, Graziano se destaca pela discrição e pela simplicidade. Autor do projeto de Combate à Fome, que é a menina dos olhos de Lula, Graziano não gosta apenas dos livros: adora acompanhar Lula pelas viagens, tanto nas caravanas da cidadania como nas campanhas. Também nesse quesito ele é um doutor. Seguiu Lula País afora em todas as eleições.

Guido Mantega

Principal assessor econômico de Lula, este professor de economia da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas é a calma e serenidade em pessoa. Participou da primeira campanha presidencial de Lula, em 1989, e foi diretor de orçamento da prefeitura petista de Luiza Erundina, em 1988. É um especialista no assunto. Também exerceu papel fundamental na delicada relação entre o petista e o mundo financeiro. Guido Mantega fez várias viagens internacionais para explicar a investidores e banqueiros da Europa e dos Estados Unidos as idéias do petista. Fez um estudo para adaptar o projeto de autonomia do Banco Central inglês para o BC brasileiro. Numa campanha recheada de crises econômicas, que levaram o Brasil a recorrer ao FMI, este economista nascido em Gênova, na Itália (tem dupla cidadania), foi decisivo nas posições que o petista tomou sobre o assunto durante a campanha. Lula andou o tempo todo no fio da navalha e no final saiu ileso. Ponderado, defensor de um capitalismo humanizado, ele já enfrentou muitas caras feias dos xiitas do PT. Mas hoje essas correntes estão cada vez mais enfraquecidas dentro do partido. Tanto que há sete anos não conseguem tomar a direção do partido das mãos dos moderados.

Luiz Soares Dulci

Com seu jeito mineiro, Luiz Soares Dulci foi uma das figuras-chave para as costuras políticas feitas em torno da candidatura de Lula, principalmente em torno do governador Itamar Franco (sem partido). Tranquilo, com voz mansa, esse professor de português integrou a primeira bancada de deputados federais do partido, eleita em 1982. Dulci participou de todas as campanhas presidenciais. Desta vez, ele integrou o cérebro político do quartel-general de Lula juntamente com José Dirceu, Antônio Palocci e Luiz Gushiken. Nas articulações políticas, percorreu parte do País conversando com líderes de outros partidos em vários Estados e com os radicais do PT, dividindo a tarefa com o secretário de organização do partido, Sílvio Pereira. “Como sempre, fui do diretório nacional (instância decisória máxima do PT), tive que fazer muitas viagens pelo País e assim fiquei conhecendo muita gente do PT e de outros partidos”, explicou. Hoje, é secretário-geral, um dos cargos mais importantes na hierarquia petista. É também presidente da Fundação Perseu Abramo, ligada ao PT, que edita livros e realiza pesquisas.

Luiz Gushiken

Este ex-dirigente do Sindicato dos Bancários e ex-deputado federal foi o coordenador executivo da campanha, ajudando José Dirceu. Enquanto Dirceu viajava o tempo todo trabalhando as alianças políticas, Gushiken ficava incrustado no comitê, no bairro da Vila Clementino. Nos últimos tempos estava afastado do PT, depois de ter sido coordenador da campanha de Lula em 1998. Mas o candidato fez questão de tê-lo a seu lado na sua quarta batalha eleitoral. Com seu jeitão zen, de fala mansa e tranquila, Gushiken não precisa elevar a voz. Suas opiniões, sempre ponderadas e equilibradas, são ouvidas atentamente pelo presidente eleito. Uma característica geral da maior parte dos homens de confiança de Lula é a discrição. Lula, que na campanha prometeu fazer um governo conciliador, escolheu a dedo seus principais colaboradores – a chamada turma da maçaneta. Levou em conta não só a confiança, mas também o estilo de jogo de cada um.

José Carlos Espinoza

Ele não gosta de ser chamado de anjo da guarda de Lula. Mas com seus 2,02 m de altura e sua presença marcante ao lado do petista há 16 anos, José Carlos Espinoza impõe respeito. Não só pela estatura ou pelo vozeirão inconfundível. É umas das pessoas em quem Lula mais confia. Exigente, meticuloso, este ex-sindicalista da Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (Sabesp) não tem uma, mas mil funções: anima comícios, organiza as viagens em todos os seus detalhes e cuida com maestria do esquema de segurança de Lula, com o apoio de outros dois escudeiros: Freud Godoy e Aurélio Pimentel. Ele só sofreu uma agressão na sua vida pública: foi em 1989, quando um integrante do PRN, antigo partido de Fernando Collor, jogou um ovo na cabeça de Lula, em Osasco. O barbudo Espinoza, de tanto andar com Lula, já está parecido com ele. É um Lula grandão. Quem se dispuser a procurar as fotos antigas de Lula em campanha certamente vai ver em várias delas sua figura imponente.

Clara Ant

Esta arquiteta conhece Lula há 25 anos. Dois importantes colaboradores de Lula nesta campanha vieram do Instituto Cidadania: Clara Ant e Paulo Okamoto, presidente do IC. Okamoto foi peça-chave na campanha mais organizada e estruturada que o PT já fez: foi o coordenador de infra-estrutura e logística. Clara Ant e o economista Antônio Prado fizeram a triagem das contribuições para o programa de Lula. Resultado: além do texto geral do programa, saíram do forno nove cadernos temáticos (Educação, Agricultura, Saúde, Questão Indígena, Empregos, Cooperativas, Combate à Corrupção, Combate ao Racismo e Amazônia). Somam-se ainda mais quatro programas elaborados no IC : Moradia, Segurança Pública, Combate à Fome e Energia.

Gilberto Carvalho

Fez dupla com José Carlos Espinoza na difícil tarefa de coordenar a agenda de Lula na campanha, além de ter acompanhado o petista em boa parte de suas viagens, pronto para descascar todos os abacaxis que aparecessem pela frente. Filósofo, ex-seminarista, Gilberto Carvalho foi secretário-geral, secretário de comunicação e secretário de formação política do PT. Antes de vir para a campanha de Lula, era secretário de Governo da Prefeitura de Santo André. Este petista tranquilo e dono de um temperamento doce e bem-humorado funcionou como um verdadeiro pára-raios. Os problemas geralmente paravam em Gilberto. Não chegavam aos ouvidos do candidato. Talvez por isso o petista tenha conseguido permanecer Lulinha paz e amor durante toda a campanha. Outra importante peça de Lula para trilhar o sucesso nas urnas foi o secretário-geral do PT, Luiz Dulci. Com seu jeitinho mineiro, Dulci aparou arestas, evitando muitas vezes as tradicionais crises internas no PT.

Jacinto Ribeiro

Este personagem saiu do baú da história. Assim como o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, Jacinto Ribeiro dos Santos, o Lambari, é um ex-torneiro mecânico. Nesta campanha, trabalhou como motorista no comitê do amigo e cunhado. Ficaram amigos quando tinham 18 anos. Dividiu com Lula as experiências mais duras. Ambos ficaram desempregados na mesma época, em 1966, e saíam juntos para tentar arranjar um trabalho. Não sai da memória de Lambari o sofrimento de Lula ao saber da morte de Maria de Lourdes, sua primeira esposa. “Eu fui ao hospital com ele levar a roupinha do menino, que já estava morto dentro da barriga da minha irmã. Lá, soubemos que ela havia falecido, de hepatite. Uma enfermeira nos contou que de noite ela gritava de dor, chamava pelo Lula, mas ninguém a acudiu. Pensei que ele fosse cair quando o médico deu a notícia. Lula rodopiou e se apoiou na parede. Mas não quis tomar injeção”, lembra.

André Singer

Sua função foi inovadora no Brasil: porta-voz do candidato. A idéia foi inspirada nas campanhas eleitorais inglesas. O cientista político e jornalista André Singer teve a função de falar pelo candidato quando fosse necessário e explicar as posições de Lula sobre os mais variados e delicados temas que surgissem na campanha. Cuidadoso com cada palavra. Singer deu um toque de formalidade necessária à campanha de um candidato que sempre foi informal e brincalhão. É autor de um livro que pautou os movimentos políticos de Lula, aproximando-se do centro, como o PL e setores do PMDB: Esquerda e direita no eleitorado brasileiro. O livro mostra que a escolha do eleitor converge para o centro.

Mônica Zerbinato

É secretária de Lula há sete anos. Formada em letras, Mônica Zerbinato é organizada e cuidadosa. “Como Lula e Marisa adoram flores, de manhã sempre passo numa floricultura. Ultimamente tenho colocado lírios brancos em seu escritório. Mas ele gosta de cravos vermelhos também”, conta. Em seu colo caem os milhares de presentes que Lula recebe, como bíblias, estrelas de todos os tipos, caricaturas, quadros e estatuetas com a figura do petista. O ex-torneiro mecânico é elogiado como patrão: “Ele é muito educado e atencioso, principalmente quando alguém está com problemas de saúde.” Lula tem uma memória de elefante e, segundo ela, é paciente. “Ele gosta muito de ouvir as pessoas”, diz.

Ricardo Kotscho

Coordenador de Imprensa da campanha, o jornalista Ricardo Kotscho é amigo de Lula de longa data. Os dois se conheceram quando Kotscho foi destacado pela revista ISTOÉ para cobrir a greve dos metalúrgicos do ABC, liderada por Lula no final da década de 70. Ele trabalhou como assessor de imprensa de Lula em todas as campanhas presidenciais, com exceção da de 1998. Foi o
único que fez todas as caravanas da cidadania com Lula e Marisa. A primeira viagem aconteceu em abril de 1993, quando Lula refez a trajetória de sua infância, saindo de Garanhuns até o litoral
paulista. O petista, acompanhado de jornalistas e especialistas, como o geógrafo Aziz Ab’Saber, parava nas cidades e entrevistava a população local para conhecer os principais problemas. Tudo foi gravado e seria usado na propaganda eleitoral de televisão na campanha de 1994. Mas uma lei proibiu os candidatos de mostrar imagens externas. “Lula sempre diz que a caravana da cidadaia foi a maior experiência de sua vida”, conta Kotscho.

Carlos Tibúrcio

Chefe da redação da campanha de Lula, Carlos Tibúrcio comandou uma equipe de 12 profissionais e oito voluntários, com os jornalistas Ricardo Kotscho e Bernardo Kucinski. Um dos organizadores do badalado Fórum Social Mundial, Carlos Tibúrcio foi trazido por Kucinski para assessorar Lula há três anos, no Instituto Cidadania, o embrião da estrutura da campanha deste ano. O grande desafio destes jornalistas foi tentar mudar o padrão de relacionamento de Lula com a mídia, marcado por muitos conflitos. Um dos capítulos mais importantes da campanha de Lula foi justamente o da comunicação. Lula se apresentou simpático, sereno e evitou ao máximo brigar com a imprensa.