As características de nossa política externa expressam a continuidade dos princípios internacionais – consagrados na Constituição Federal – e inovação diplomática. Esta ora se pende mais para áreas da grande política, com relativa postura estratégica através dos regimes internacionais de paz e segurança e das agendas multilaterais (direitos humanos, meio ambiente, etc.), ora se inclina, como agora, para as áreas da economia global, do comércio e das finanças internacionais. Sua condução deve ser feita com profissionalismo e rigor, através de mudanças temperadas e cautelosas para que as vantagens da inserção internacional não resultem em perdas e crises, causadas por nossas bravatas e intempestividades. Diz-se que a política externa de um país é reflexo da política interna. A globalização econômica, a crescente interdependência entre Estados e a informação veloz e instantânea são novos ingredientes que romperam com as fronteiras internas e externas. Sofrem influências recíprocas de fatores comuns ou de conflitos, com intensas negociações, de interação e reação. O governo Lula-PT aspira implantar “novo projeto de desenvolvimento nacional alternativo” e inclina-se a renovar as nossas políticas de âmbito internacional, destacando o “pacto regional de integração” (América do Sul), com política externa comum. Viabilizado, tal pacto servirá para fazer frente à Área de Livre Comércio das Américas (Alca), agravada com medidas de protecionismo adotadas pelo governo americano. Sem claras compensações – pela existência de desníveis entre os países do hemisfério –, a Alca não será um acordo de livre comércio, mas um “processo de anexação econômica do Continente”. Para não se submeter, o Brasil negociará essencialmente com a moeda do “interesse nacional” acrescido do “pacto regional”. São pontos centrais do projeto do governo Lula-PT para a política externa brasileira nos próximos quatro anos. Aspiração anunciada (e muita transpiração), teremos que enfrentar, na mesa de negociações, embates e desafios muito reais com impactos diretos, positivos ou negativos, sobre a nossa vida. Por isso, é essencial fortalecer o poder de barganha do Brasil para negociar soberanamente nossa inserção internacional com ganhos e custos. Pelo seu conteúdo e perfil, o novo governo poderá conquistar uma base interna necessária e possível (dependendo de sua ação responsável) e tornar o Brasil mais vigoroso e altivo no plano internacional. A idéia de vivenciar nova identidade nacional a ser projetada em nossas relações internacionais é esperançosa. Se Lula consagrar essa identidade mestiça, no seu mais alto significado cultural e político, será um formidável instrumento para redefinir a política externa e ampliar nossas relações regionais (Mercosul, Pacto Andino e, principalmente, com o México) e com os EUA (que não pode ser reduzido à esfera puramente governamental). Haverá maior aproximação com a África (explorando os laços étnicos e culturais), com países e culturas das dimensões do Japão, da China, Índia e Rússia, além de aprofundar a associação com a União Européia. Com todos eles, a raiz cultural será uma grande moldura para explorar com mais eficácia e resultados as relações de cooperação e comércio internacionais. Do mesmo modo e bem calculado, Lula deverá ampliar a inovação nacional de conhecimento em pesquisa e desenvolvimento, com peso maior do setor privado e ampla política de cooperação internacional, particularmente relacionada com as novas tecnologias de informação, buscando alicerçar parcerias estratégicas com países como Coréia do Sul, Japão, Alemanha, etc. Eis um real e desafiador panorama sobre o qual o governo Lula terá de se debruçar e construir a partir da postura de inaugurar uma nova política externa. Para tanto deverá começar a renovação pela própria casa que representa oficialmente a política externa, dar-lhe mais substância nos resultados (“colocar nas embaixadas os nossos mascates”) e, ao mesmo tempo, criar uma nova agência de comércio exterior. Feito esse dever de casa e com bons resultados para o País, Lula terá garantido ao Brasil um novo grau e maior maturidade para a nossa inserção no mundo.