26/06/2002 - 10:00
Desde o início, seu discurso poético-musical esteve atado às raízes e ascendência negras. Só que os tempos de racismo encoberto ficaram para trás e agora o cantor e compositor paraibano Chico César resolveu ser mais contundente. Basta prestar atenção na incisiva vírgula no título de seu quinto e mais recente disco, Respeitem meus cabelos, brancos. Só faltou a exclamação. Mas seria óbvio demais e Chico César pode ser tudo, menos óbvio. Sua sensibilidade musical tem cumprido ciclos que se iniciam na pequena cidade natal de Catolé do Rocha, passam por São Paulo, vão à Europa e voltam energizados para se espalhar nordestinamente pelo Brasil. Seu disco anterior, Mama mundi (1999/2000), em essência, recorre à uma sonoridade planetária que causou estranheza no público. No geral, seu novo trabalho conserva o mesmo estranhamento, mas só até o ouvinte perceber a riqueza sonora imaginada por Chico César, que, na produção, contou com a ajuda preciosa do anglo-suíço Will Mowat.
São canções de caráter, ligadas ao pensamento e atitude de Chico em pedir respeito à sua particularidade. A faixa Sem ganzá não é coco é um bom exemplo. Ao ritmo nordestino foram acrescentados os metais da banda paraibana Metalúrgica Filipéia, com uma percussão internacionalizada pelo internacional Naná Vasconcelos. Na sequência de multiplicidade de sons, Antinome, com participação de Chico Buarque, enfatiza um tango tropicalizado pela sanfona de Toninho Ferragutti. Quando eu fecho os olhos é uma balada com letra de Carlos Rennó, que traz a percussão sempre luxuosa de Marcos Suzano e a delicadeza do arranjo das cordas de Nelson Ayres. Para os fãs dançantes, os reggaes Respeitem meus cabelos, brancos e Nas fronteiras do mundo são diversão pura. Fecha o disco Experiência, que poderia ser o conceito do trabalho. Chico César reuniu o grupo inglês Smoke City e o percussionista africano Sena Mbaye el Hadji Mahamadou, que faz um drum’n’bass nordestino regido pelos arranjos de Carlinhos Brown. É a ponte musical Catolé do Rocha/Londres com várias escalas.