É uma viagem que pede pouquíssima bagagem (na verdade, só a carteira), pouca roupa no corpo, o sapato mais velho nos pés, muita disposição para andar de um lado para o outro por 92 mil metros quadrados e coração e mente abertos para se deslumbrar. É um programa masculino – porque são os homens os grandes amantes do que está ali dentro –, mas cada vez mais cobiçado por mulheres, crianças e adolescentes. É a 22ª edição do Salão Internacional do Automóvel, a maior feira de negócios da América Latina, que entre os dias 10 e 20 de outubro vai levar pelo menos 500 mil pessoas ao Pavilhão de Exposições do Anhembi, em São Paulo. Uns vão sonhar – na verdade, a maioria. Ah! como seria boa a vida em um Porsche Boxster S, conversível como se dizia antigamente, cabriolet hoje. Custa
US$ 105 mil com o S, e US$ 89 mil sem – não é o mais caro da linhagem criada pelo professor Ferdinand Porsche (1875-1951) – mas é um dos
que fazem bater mais depressa o coração de seus seguidores (a frota de Porsche no Brasil é de 900 “jóias”, como diz Bob Sharp, responsável pelo marketing e relações com a imprensa no País). Mas é a Cayenne a
grande novidade da grife. Não chame de van. É um utilitário esportivo (“sport utility” é como os iniciados falam) que marca a entrada da Porsche nesse mercado. Custa US$ 115 mil. Tem novo motor V8 de 32 válvulas, câmbio automático com seis marchas. Resumindo: voa (260km/h) com segurança.

Muita coisa que está no Salão do Automóvel voaria se tivesse asas: os esportivos Spyder e Coupé, da Maserati, que atingem mais de 280 km/h e aceleram de zero a 100 km/h antes que você termine de pronunciar o nome da marca italiana. Vêm com quatro airbags, piloto automático e sensores nos pára-choques, entre dezenas de detalhes de sedução. Ou a nova Ferrari GT 575M Maranello, nome que faz uma indicação abreviada da capacidade, que aumentou de 5.500 para 5.750 cm3. Não se preocupe se não entender esses números. Eles simplesmente refletem o aumento da potência (515 cavalos a 7.250 rpm) e do torque da máquina, que vem com câmbio de Fórmula 1.

A linha “sport utility” brilha no salão e uma de suas grandes estrelas é o EcoSport, da Ford, que chegará ao mercado no começo do ano que vem. É o segundo modelo que a montadora produz na Bahia, um compacto com tração 4×4 e motor 2.016V. A Mitsubishi trouxe o recém-lançado Pajero TR4 (menção à tração nas quatro rodas), motor 2.0, pneus para “todo terreno” e, de série, ar-condicionado, cd player, airbarg, freios ABS, direção hidráulica, entre outros. A Volvo arrasa em sua estréia no segmento. Apresenta o Volvo XC90, lançado este ano em Detroit com todas as honras de première na categoria. Tem o visual forte da marca e, como todo Volvo, traz a segurança como preocupação principal: vem com o exclusivo sistema RSC, que se traduz no controle de estabilidade anticapotamento. Na linha jipe, tem o Troller, marca jovem e esportiva, com um índice de nacionalização de 93%, fabricado no Ceará por uma empresa nacional, alheia ao circuito multinacional.

Custa acima de R$ 50 mil e carrega o charme de ter conquistado vários títulos em competições nacionais e internacionais, incluindo o Paris–Dakar. Concorre também com a linha Defender, da Land Rover, que tem carroceria totalmente de alumínio. Dá para passear e trabalhar e enterra para sempre aquela história de que jipe não tem conforto. Eles podem ter direção hidráulica, ar-condicionado e até teto solar.

Este, aliás, é o salão do teto solar, que se abre e fecha em segundos, para delírio da platéia. O 206 coupé cabriolet da Peugeot, que já conquistou vários prêmios de design na Europa, tem bancos esportivos de couro, ar-condicionado automático, freios ABS com repartidor eletrônico de frenagem e airbags laterais e duplo frontal. Não cabe a sogra no banco de trás. Em compensação cabe dois tacos de golfe. Vem da França, onde foi lançado em maio de 2001, e pode custar em torno de R$ 60 mil. A sogra também não entra no BMW Z4, lançado no último Salão de Paris, mas o porta-malas tem capacidade para até 260 litros, o suficiente para acomodar duas sacolas de golfe. Pode atingir até 250 km/hora.

O visitante do 22º Salão do Automóvel tropeça em objetos do desejo. São 400 modelos. O novo Audi A8, design limpo, construção leve, dinamismo e qualidade irrepreensível, é um exemplo que se destaca. O carro, inteiramente de alumínio, desliza (se a pista favorecer), graças à suspensão a ar com três estágios de regulagem (que reduz as oscilações da carroceria ao mesmo tempo que otimiza a aderência). A transmissão é automática, de seis velocidades, com opção de mudança no volante e função sport, que permite trocas mais rápidas.

Pode ficar de boca aberta, mas não deixe de sonhar. A Citroën está trazendo o C3 do Salão de Frankfurt do ano passado. É um carro compacto, que será produzido a partir do primeiro semestre de 2003 em Porto Real, no Rio de Janeiro, para circular na faixa dos R$ 25 mil a R$ 35 mil. O modelo será equipado com motor 1.6 (16 válvulas), direção com assistência elétrica, painel digital, airbag, apoio de braços, freios ABS… O Fiat Stilo, modelo médio que pode custar de R$ 30 mil a R$ 48 mil (podendo chegar a R$ 70 no top do top), é o primeiro carro produzido no Brasil a oferecer itens como teto solar com cinco lâminas de vidro que se estendem até a parte traseira do teto, oito airbags, sistema que permite regulagem de temperaturas distintas e, mais interessante, o sistema batizado de “my car stilo”, que personaliza várias funções do carro (bancos, ar, etc.).

A Volkswagen perde a seriedade alemã com sua menina-dos-olhos: o Polo, lançado em maio deste ano e apresentado numa belíssima versão alaranjada. É irreverente, justamente o que estava faltando à VW, uma das maiores do mundo, que caprichou no salão: mostra um Passat que sai blindado da fábrica, um New Beetle com teto retrátil (cerca de US$ 29 mil) e, entre tantos produtos, coloca em destaque o W12, um protótipo que vai de zero a 100 em três segundos e alcança 350 km/h.

Charme – Mas é na área da Chrysler que está o modelo mais surpreendente do Anhembi: o PT Cruiser, fabricado em Toluca, no México, grande sucesso nos Estados Unidos, comercializado no Brasil desde o início de 2001 na versão limited. Por fora parece carro de gângster das décadas de 50 e 60. Por dentro é pura vanguarda: piloto e transmissão automáticos, bancos de couro, motor 2.0 de 16 válvulas, airbag… um charme incomparável. “É o grande encontro entre o design do passado e o design do futuro”, diz Sergio Duarte, jornalista com 30 anos de especialização no setor.

Como a vida fora dos sonhos não está fácil, este salão celebra a blindagem. A indústria de veículos blindados, em ascensão na última década, reúne cerca de 15 expositores em quase 3.000 m2 este ano, uma espécie de minissalão. “A demanda por serviços de blindagem automotiva cresceu muito devido ao aumento da violência nos grandes centros do País nos últimos anos e por este motivo temos um número maior de empresas que realizam esse tipo de serviço na feira”, diz Evaristo Nascimento, diretor do evento e da Alcântara Machado, a empresa que promove o salão. Nesse sentido, o visitante do estande da blindadora O’Gara poderá passar sete minutos de absoluta adrenalina num simulador de direção defensiva e evasiva em situação de risco. É o trem fantasma urbano. O simulador dá ao ocupante uma sensação em 360 graus. Ele ensina como o motorista sai vivo de uma situação de perigo. São sete minutos intermináveis, com tiros na janela, manobras malucas, freadas de arrepiar… e os ladrões ali, batendo no vidro com a arma. No fim é bom porque você, enfim, venceu os bandidos. “O simulador é importante para mostrar como as pessoas devem reagir em caso de abordagem nas ruas”, diz Grace McDarby, gerente de marketing Mercosul da empresa.

Para se recompor de tamanho desgaste, saia do espaço blindado e dê alguns passos em direção ao estande da Mercedes-Benz. Seu coração vai continuar acelerado. Verá a estréia de um verdadeiro clássico da empresa: o Classe G, um off-road capaz de superar os mais difíceis obstáculos e terrenos com a máxima segurança e o conforto característico dos sedãs luxuosos da marca. Com baixo consumo de combustível, o sistema promete oferecer alto nível de prazer ao dirigir e a suavidade de um motor de seis cilindros. A potência do novo C 180 Kompressor chega aos 143 cavalos. O desempenho do novo motor é igualmente exemplar: acelera de zero a 100 km/h em apenas 9,7 segundos. A velocidade máxima é de 223 km/h, 13 km/h a mais do que antes.

Se você não perder o fôlego, dê uma voltinha no estande para apreciar a nova SL 500, que em 16 segundos transforma-se em conversível. É a chance de vislumbrar Lilian Bragança, 22 anos, uma morena brejeira como Sônia Braga nos tempos de Dona Flor, destaque entre as centenas de loiras que se espalham pelo salão. Quando conseguir sair de lá, passe pelo estande da Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), onde poderá testar um Chevrolet Vectra que atende às ordens do motorista. Uma frase curta, com um verbo e um predicado preestabelecidos, fará funcionar automaticamente as travas das portas, pisca alerta, setas de direção, vidros, lanternas, faróis, sistemas de ventilação. A tecnologia foi desenvolvida em parceria com o Genius Instituto de Tecnologia.

Mas o carro não precisa ser tão inteligente para seduzir o visitante do salão. “O automóvel é uma paixão dos latinos, significa várias coisas, e o salão, nesse sentido, é uma grande força”, diz Evaristo Nascimento, o diretor do evento. “Você pode olhar, curtir, cobiçar, imaginar, sonhar.” Pode levar para casa um kit Ferrari, com uma camisa Polo e um carrinho, por R$ 120, ou a encomenda de um Porsche, pode fazer um plano para comprar o carro de seus sonhos no futuro e pode até imaginar que está em outro planeta, como dona Maria do Carmo, moradora da periferia de São Paulo, que, desempregada, arrumou no salão um emprego de dez dias, por R$ 300. Ela também está viajando. Nunca viu tanta “coisa esquisita” na vida, mesmo não despregando os olhos do piso do salão, sua única responsabilidade na festa.