O Carnaval já começou em Salvador. E o tema não poderia ser mais adequado. A idéia é homenagear o povo brasileiro e resgatar a diversidade das suas raízes musicais. Espaço para isso não falta na capital baiana. Além dos camarotes, trios e blocos tradicionais de axé, o folião que visitar a cidade vai relembrar o samba reggae – sucesso nos anos 80 que deu origem ao axé –, curtir sambas de roda, partido-alto, batuque afro, música eletrônica (ou dance music), reggae e até mesmo as inesquecíveis marchinhas de outros carnavais. Isso sem falar em artistas emergentes, como a banda Babado Novo, liderada pela bela Cláudia Leite, que já é chamada de “a nova Ivete Sangalo”. “Esse Carnaval é afro-pop”, decreta a cantora Margareth Menezes, que acaba de gravar um disco ao vivo. Não é bem o fim do ritmo que consagrou o É o Tchan de Carla Perez, mas, sem dúvida, o axé perdeu espaço na folia – que agora reverencia as raízes do Brasil.

Segundo a Empresa Municipal de Turismo S.A (Emtursa), a participação das gravadoras no Carnaval da cidade vem caindo ao longo dos anos. Com a indústria fonográfica em crise, sobra espaço para artistas independentes e sonoridades regionais. Este ano, pela primeira vez, um trio de reggae desfila no circuito, o Expresso do Reggae. “Temos dez blocos novos neste Carnaval. Mais de 80% são afro-descententes”, conta Eliana Dumet, presidente da Emtursa. Um dos mais fortes nesse conceito é o Cortejo Afro, que existe há seis anos e desfila com 200 pessoas. Resultado de um projeto social de educação sob a bênção de dona Santinha, respeitada mãe-de-santo da comunidade de Pirajá, na periferia de Salvador, o bloco caiu nas graças de Caetano Veloso e do irreverente produtor americano Arto Lindsay. Resultado: o artista plástico americano Matthew Barney – marido da cantora islandesa Björk – resolveu participar do bloco. E de uma forma bastante arrojada: ele fará uma intervenção estética durante o desfile no domingo de Carnaval. Alberto Pitta, artista plástico e presidente do Cortejo, explica: “Ele vai trazer dois tratores que vão empurrar uma árvore pela avenida.” Por essas e outras, Björk já está em Salvador com marido e filho, mas avisou que veio como esposa de Barney e não pretende fazer show na cidade.

Antes do Carnaval, o Cortejo Afro ensaia às segundas-feiras e às sextas participa dos ensaios do bloco Os Mascarados, ao lado de Margareth Menezes. O Cortejo vai desfilar quase todos os dias no circuito Bairro-Ondina e, num deles, ao lado de Daniela Mercury. Outra novidade que simboliza o clima revival deste Carnaval em Salvador está no Circuito Batatinha, no centro histórico da cidade. Este ano, será montado um palco na Praça Castro Alves no qual se apresentarão bandas e artistas que já fizeram sucesso em outros carnavais, como Luiz Caldas e Sarajane, além de grupos tradicionais de samba de roda e pagode.

Mas a folia não pára por aí. Nos últimos meses, as atrações que mais têm atraído a moçada são os grupos de samba de mesa. Influenciados pelo samba carioca de raiz, eles se apresentam sentados, não usam teclados e abusam da percussão. No repertório, partido-alto e sambas no melhor estilo Zeca Pagodinho. No ano passado, surgiram mais de cinco grupos. Um deles, Samba Eu, Você e Sua Mãe, é formado por advogados, bancários e um estudante de medicina e surgiu nos botecos de Salvador. “A gente ensaiava na casa de dois irmãos integrantes da banda e a mãe deles participava, servia tira-gosto, cerveja. Por isso o nome do grupo”, conta Thiago Gonçalves, um dos nove integrantes. Apesar da influência do samba de raiz carioca, eles avisam que não há como fugir da baianidade. “A gente toca tudo em ritmo de samba. Até mesmo axé e reggae. A idéia era fazer samba carioca, mas temos muita influência daqui”, explica. Samba Eu, Você e Sua Mãe ensaia todas as quartas, sextas e sábados em bares e vai se apresentar no Camarote Planeta Othon quinta-feira, sábado, domingo e terça-feira de Carnaval. O sonho deles, agora, é adaptar o show para o trio elétrico. “Seria um boteco elétrico”, brincam.

Outra novidade que já faz sucesso e promete agitar o Carnaval de Salvador é a banda Babado Novo. Encabeçada pela vocalista Cláudia Leite, 23 anos, a banda foi revelação em 2003 e deve se consagrar neste ano. Cláudia, fã de Clarice Lispector e Vinícius de Moraes, é a nova musa de jovens em todo o Nordeste. Com sua inseparável guitarra rosa, ela não gosta de ser comparada a Ivete – o que é inevitável por causa da semelhança no timbre de voz. “Imagina me comparar com Ivete? Ela é poderosíssima. Sinto-me lisonjeada, mas as pessoas sabem que somos diferentes”, diz Cláudia, que gosta de blues e idolatra Etta James. A banda Babado Novo puxa o bloco Papas, que vai desfilar no Circuito Barra-Ondina. É nesse caminho, inclusive, que estará o camarote da banda, a Casa Rosa, onde Claudinha vai receber seus convidados. A julgar pelo carinho das pessoas nas ruas (algumas choram ao vê-la) e das multidões que vão aos seus shows – cerca de 50 mil pessoas no Festival de Verão, que terminou na semana passada –, ao que tudo indica, ela veio para ficar, trilhando o mesmo caminho das musas precursoras Daniela Mercury e Ivete Sangalo.

E são elas as homenageadas do Expresso 2222, criado pelo ministro Gilberto Gil. O trio elétrico será capitaneado por Daniela em três dos cinco dias de Carnaval – nos outros dois o comando é de Preta Gil. Ivete ficará com o camarote de 1.500 metros quadrados só para convidados, onde deve receber ministros de Estado e até o presidente da República, além de amigos e personalidades do mundo artístico, como Fernanda Torres e Andrucha Wadington. A produtora Flora Gil explica: “A Dani inventou o camarote no Carnaval de Salvador em 1998, com o Trio Tropicália. Ela é a pioneira no circuito Barra. E este ano, o Expresso com Ivete é o maior de todos”. A programação musical do camarote Expresso será bem variada: até as dez da noite, uma banda vai relembrar os velhos carnavais tocando marchinhas e músicas brasileiras mais antigas e animadas. Da meia-noite às duas, shows com bandas de pop-rock baiano que geralmente ficam de fora do Carnaval, como Márcio Mello e Lampirônicos. Os DJs, principais estrelas do Expresso no ano passado, entram às duas da manhã. E nada de “bate-estaca”. Só hip hop, funk e muito swing, com quatro DJs, como Marlboro e Zé Pedro. De qualquer maneira, os adeptos da música eletrônica têm para onde ir no Carnaval de Salvador. Este ano, pela primeira vez, um bloco de dance music vai desfilar. Além disso, o tradicional clube Fantoches da Euterpe promove, em todas as noites, um baile só com música eletrônica, o Fantoches Boom Club. É a diversidade brasileira dignamente representada no eclético Carnaval baiano.

Para mais informações sobre camarotes, abadás e blocos, disque (71) 380-4200 ou acesse:
www.portaldocarnaval.ba.gov.br
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