19/06/2002 - 10:00
A reserva do lago Cuniã é um vilarejo perto do rio Madeira, em Rondônia. O caminho mais fácil até lá é sair da vila de São Carlos do Jamari (a 100 quilômetros por via fluvial de Porto Velho), caminhar duas horas por uma trilha e depois navegar mais 30 minutos. Por causa da dificuldade de acesso, as visitas são raras. No começo de julho, entretanto, a expectativa dos 400 moradores do lugar começa a crescer. O líder comunitário José Maria Cruz, por exemplo, fica de sobreaviso, esperando a chegada de uma turma barulhenta de estudantes paulistas de odontologia, medicina, farmácia, psicologia, educação física e biologia.
Como ocorreu nos últimos cinco anos, o grupo de voluntários passará dez dias no local para tratar doenças comuns na região (entre elas, as micoses, as cáries e a malária) e ensinar os moradores a cuidar da saúde. Cruz também espera reencontrar o amigo João Marcelo Capelossi, 23 anos, estudante de odontologia da Universidade de Bragança Paulista (SP), que participará pela segunda vez da viagem. João Marcelo tem a mesma expectativa. “Conversei bastante com o Cruz no ano passado, enquanto tratava os dentes de seus filhos. Aprendi muito com ele sobre as necessidades da população”, diz.
A expedição é organizada pelo Núcleo de Apoio às Populações Ribeirinhas da Amazônia, o Napra, entidade não-governamental. Criado há sete anos, o projeto atendeu a mais de 12 mil pessoas e levou 350 estudantes para a maratona de visitas a diversas comunidades. O impacto do trabalho já pode ser sentido. “Em três anos, reduzimos em 40% o número de cáries”, conta o dentista Hamilton Rigato, 25 anos, coordenador do projeto. Na área médica, os estudantes orientam adultos e crianças a mudar hábitos para diminuir, por exemplo, as verminoses e dores nas costas. O estudante de medicina Felipe Piza, 22 anos, viu que uma das causas das lombalgias é o plantio de melancia e o jeito como a fruta é colhida. “Mostramos a forma certa de agachar, flexionando os joelhos, e orientamos os mais idosos a evitar dormir em rede”, conta Piza. Os jovens têm o apoio do padre Francisco Viana, que vive na região. Ele assegura a hospedagem e cede o barco-saúde, uma embarcação equipada com sala de cirurgia e laboratório de análises, construída com verbas de ongs e do governo de Rondônia.
Desde o ano passado, o Napra sobrevive de campanhas de arrecadação de fundos e doações (alimentos, medicamentos, material hospitalar e de higiene bucal), batalha que começa assim que os estudantes voltam da temporada amazônica. “Recebíamos apoio da Universidade São Francisco, de Bragança, que garantia o transporte. Mas a escola cortou as verbas para programas sociais”, lamenta Rigato. Agora, para assegurar a visita deste ano, a ong está batendo na porta de empresas de ônibus e aéreas para conseguir passagens, inclusive para os médicos, dentistas e outros profissionais de saúde mais experientes que acompanham o trabalho.