Nada de hotel cinco estrelas, cassinos de luxo ou visitas a shopping centers. Cada vez mais, o público se rende aos atrativos naturais de destinos preservados e embarcam na maré favorável do turismo ecológico. A Organização Mundial do Ecoturismo (OMT) acredita que o fluxo de ecoturistas aumenta 20% ao ano, enquanto o turismo convencional cresce 7,5%. Apesar de insipiente, a escolha por destinos ecológicos já representa 5% do turismo mundial e deve chegar a 10% na próxima década. Ainda segundo cálculos da OMT, os investimentos na área saltaram 90% nos últimos 15 anos. As cifras foram suficientes para inspirar a Organização das Nações Unidas a escolher 2002 como o ano internacional do ecoturismo. No Brasil, famoso por destinos como Amazônia, Pantanal e Fernando de Noronha, há quem fale em praticantes de ecoturismo, como se visitar ambientes naturais fosse uma modalidade esportiva. Este curioso esporte, segundo dados do Instituto de Ecoturismo do Brasil (IEB), já arregimenta quase dois milhões de brasileiros, clientes em potencial das mais de 250 operadoras e agências especializadas.

Ainda é pouco, diante do tamanho do Brasil. Na Costa Rica, por exemplo, as áreas de proteção ambiental cobrem mais de 25% do território, enquanto por aqui elas não chegam a 1%. Decisões políticas como esta fizeram dessa pequena nação da América Central – menor do que o Estado de São Paulo – o principal destino ecológico do continente, alvo preferido dos ecoturistas americanos. Além da Costa Rica, outros destinos reconhecidos mundialmente são as Ilhas Galápagos do Equador, a barreira de recifes de Honduras e Belize, Nova Zelândia, Austrália, Peru, Bolívia e países do Sul da África, como Quênia e Zimbábue. Em todos esses lugares, a concentração de estrangeiros com alto poder aquisitivo e o número de lodges e hotéis de alto padrão colocam na berlinda a tradicional imagem do ecoturista bicho-grilo, pedindo carona com a mochila nas costas e um mapa nas mãos. “Ainda convivemos com o mito de que o ecoturista é aquele que vai para o mato encontrar mosquito. Mas isso é um erro. As pousadas nos destinos ecológicos são confortáveis e os pacotes custam normalmente o dobro de uma viagem convencional”, comenta José Zuquim, sócio da Ambiental Expedições, uma das maiores operadoras do País.

Preocupada em conhecer os interesses de seu público, a Ambiental colocou em seu site uma lista com 20 perguntas e, computadas as respostas de 350 pessoas, conseguiu desvendar o perfil do ecoturista brasileiro. De acordo com a pesquisa, o ecoturista típico é uma mulher solteira, de 20 a 40 anos, sem filhos, que ganha de R$ 2 mil a
R$ 5 mil por mês e gasta em média R$ 1.500 por viagem (clique sobre a foto). Costuma viajar com o companheiro, mas não descarta as férias em família ou com um grupo de amigas. “Claro que a pesquisa já restringe de certa maneira o público, na medida em que foi feita pela internet e no nosso site. Provavelmente, quem respondeu foram os clientes da Ambiental”, assume Israel Waligora, sócio de Zuquim na operadora, para quem a pesquisa é pioneira. Foram eleitos também os destinos mais cobiçados. Os campeões foram a cidade de Bonito (MS), com 14% dos votos, e o arquipélago de Fernando de Noronha (PE), com 12%.

Para quem procura um local para visitar nas férias de julho, há opções que só recentemente despertaram o interesse das operadoras, como a Ilha de Boipeba, na Bahia, a região do rio Araguaia, no Tocantins, e o Pólo Ecoturístico do Lagamar, no litoral sul de São Paulo. Implantado em 1995, após capacitação da população local coordenada pela Fundação SOS Mata Atlântica, o Lagamar foi eleito, em 1999, o melhor destino ecológico do mundo pela revista americana Condé Nast Traveler. A região compreende cidades há muito devastadas pelo homem, como Peruíbe e Cananéia, além da mata da Juréia e do Parque Estadual da Ilha do Cardoso, e não pode ser encarada como um destino novo. No entanto, a ocupação atual em nada lembra a invasão de farofeiros que há dez anos ameaçava a região. “Na Ilha do Cardoso, a comunidade de Marujá tem 300 habitantes e recebe os turistas nas próprias casas. Além de passear de barco por rios e manguezais, é possível assistir a autênticas apresentações de fandango, a dança típica da região”, conta Alysson Costa, diretora da operadora Econautas. Hoje, o Lagamar virou espelho em que se miram outros 96 pólos de ecoturismo indicados pela Embratur que esperam incentivos para implantação.

O impasse do deixa-que-eu-deixo entre o Ministério do Turismo e o Ministério do Meio Ambiente em diversos países foi apontado como obstáculo de primeira relevância na Declaração de Quebec, redigida por representantes de 132 países após o término da Cúpula Mundial de Ecoturismo, realizada em maio. Outro tema martelado foi a necessidade de certificação para a atividade, reivindicação antiga dos ambientalistas brasileiros. Presente à reunião, o presidente da SOS Mata Atlântica, Mario Mantovani, lembra que o ecoturismo deve ser uma ferramenta para proteção ecológica, e não o oposto. “Uma regulamentação do ecoturismo vai impedir a implosão de alguns destinos. Mangue Seco foi destruído após a novela Tieta e, em breve, Itacaré corre o risco de se perder”, explica. “Muito empreendedor ouve dizer que o ecoturismo é a atividade que mais cresce e resolve vender pacotes. Mas nem sempre o que ele está fazendo é ecológico”, alerta. Garantir tratamento de esgoto e emprego de mão-de-obra local são algumas das normas que certamente seriam contempladas em uma regulamentação do governo. Na sexta-feira 28, será implantado em São Paulo o Conselho Brasileiro de Turismo Sustentável, de olho na certificação. “Se houver um selo de qualidade eficiente, o ecomodista e o ecooportunista vão desaparecer. Sem o selo, o ecoturismo é uma atividade tão perigosa quanto a mineração e a indústria”, compara a consultora Paula Arantes, uma das coordenadoras do programa. Discussões quentes eram esperadas no ano internacional do ecoturismo. Até para garantir o futuro de paraísos como Fernando de Noronha e Bonito. Mas isso é só o começo: o ano está apenas na metade.