13/06/2002 - 10:00
No verão, o entardecer na baía de Sydney é, sem exagero, um dos maiores espetáculos da Terra. Ao sair de cena, o sol esparrama os últimos raios na Harbour Bridge, a famosa ponte que liga a região central ao norte da cidade. Ao lado, as luzes da Opera House realçam o ritmo alucinado de barcos, navios e os charmosos ferryboats, os símbolos de uma metrópole modelo para o mundo. Para muitos, esse moderno e poético conjunto arquitetônico, cartão-postal das Olimpíadas/2000, tornou-se, após a queda das torres do WTC, em Nova York,
o mais belo skyline do planeta. A cada ano, mais brasileiros estão tendo o privilégio de assistir a este show. A Austrália e a sua vizinha Nova Zelândia entraram de vez na rota de estudantes e turistas brasileiros. Os dois países são ótimas alternativas para quem está fugindo dos Estados Unidos pós-11 de setembro ou quer algo diferente das paisagens européias. Há outra vantagem: o câmbio é atraente. Os interessados que se apressem. Junho é o mês-limite das matrículas para quem quer cursar o high-school, equivalente ao ensino médio brasileiro.
Quem enfrenta os quase 15 mil quilômetros de distância e o temido fuso horário, que na Nova Zelândia chega a 16 horas de diferença, quer o domínio da língua inglesa. Mas o aprendizado do idioma é apenas um dos itens deste pacote, que inclui qualidade de vida, segurança, aventura, natureza e esportes radicais. “Apostamos na Austrália e na Nova Zelândia porque são mercados que têm tudo para crescer. Os países são fantásticos e têm preços competitivos”, afirma Valéria Garcia, diretora-geral da Study n’Travel, de São Paulo, uma das empresas que estão voltando seu foco à Oceania. No ano passado, 13 mil brasileiros viajaram à Austrália. A grande maioria, estudantes. Até dezembro, espera-se um crescimento de 25%. Neste mesmo período, a Nova Zelândia recebeu oito mil brasileiros, 3,6 mil estudantes. O país não exige visto para quem comprovar que irá ficar menos de três meses por lá.
A sensação de liberdade provoca verdadeiro delírio nos adolescentes. O cearense Valentino Kmentt, 15 anos, sua conterrânea Ana Carolina Girão, 16, o paraibano Renan Nobrega, 18, o mineiro Luiz Felipe Moreira, 17, e a paulista Mariana Leme, 16, chegaram a Camberra, a pacata capital australiana, no início de fevereiro. Valentino e Renan estudam no Lake Tuggeranong College. Nos fundos da escola, construída com as sobras de material do Parlamento, tem até um lago artificial para a prática de esportes. Ana, Luiz e Mariana estão no Erindale College. O colégio tem piscina coberta e aquecida, academia de ginástica, um grande teatro e um ginásio poliesportivo de primeira linha. Detalhe: trata-se de uma escola pública. “Eu iria para os Estados Unidos. Mas os atentados mudaram meus planos. E desde pequena era louca para conhecer a Austrália”, conta Mariana. Logo nos primeiros meses, a galera percebeu que a sonhada liberdade tem suas restrições. “As festas para adolescentes acabam cedo. E aqui eles não deixam a gente entrar nas baladas que começam mais tarde”, conta Ana. Em relação ao estudo, há algumas diferenças. “No Brasil, eu nunca tirei dez. Aqui consegui nota máxima em matemática. Equações que aprendemos na sexta série são ensinadas no segundo colegial”, diz Valentino.
Os pais do paulista Marcelo Gulman, 25 anos, não tiveram condições de dar a ele um presentão como o recebido pela galerinha de Camberra. Mas ele não tem do que reclamar. Há três anos vivendo em Brisbaine, na Austrália, o rapaz é hoje gerente de intercâmbio do Shafston International College, uma das maiores escolas de línguas do país. O ex-vendedor da Pirelli resolveu dar um basta ao Brasil depois de ter um Uno Mille zero e uma potente moto Suzuki 900 cilindradas roubados em menos de dois anos. Como quase todo brasileiro, foi obrigado a correr atrás de um subemprego. Trabalhou como entregador de comida, feirante, operador de tele-marketing e panfleteiro de rua. Bom marqueteiro, desenvolveu um projeto para atrair mais estudantes brasileiros para a escola. O plano foi apresentado aos diretores do Shafston, que o contrataram na hora. “Hoje, falo dois idiomas e consegui trazer mais de 600 estudantes para o Shafston. Meu plano inicial era ficar um ano. Já se passaram três e não sei dizer quando ou mesmo se volto para casa”, diz Marcelo.
Ele é um dos três mil brasileiros que trocaram de vez o Brasil pela Austrália. Na Nova Zelândia, este número é bem menor. De acordo com dados da Embaixada brasileira na capital, Wellington, aproximadamente 500 têm residência fixa no país. Na Austrália, quase 70% da colônia vive em Sydney ou nos seus arredores. Este é o caso da publicitária paulista Cristiane Andrade, 29 anos. Em 2000, um amigo comum a apresentou ao neozelandês John Wood, 30 anos. O Kiwi, como são chamados os habitantes daquele país, veio ao Brasil aprender capoeira, que conhecera alguns anos antes, em sua primeira visita ao Brasil. Apaixonada, desgostosa com o emprego em uma grande montadora e sem maiores vínculos com o Brasil (ela havia perdido o pai e a mãe), fez as malas e foi viver com o amado em Sydney. Feliz, reside a menos de um quilômetro de Bondi Beach, uma das praias mais badaladas da cidade, famosa pelo topless e um dos pontos de encontro da brasileirada na cidade. Voltar para o Brasil? “Por mais que eu goste do nosso país será muito difícil voltar. A Austrália é um lugar sensacional. Não consigo me imaginar vivendo naquela loucura chamada São Paulo. Sem contar o John, né!”, diz ela, que tem cidadania australiana temporária e espera pelos dois anos de casamento para solicitar a definitiva.