16/06/2004 - 10:00
partir dos anos 1980, o cantor cubano Ibrahim Ferrer se transformou numa espécie de fantasma. Nem sequer sabia-se se estava vivo. Foi por acaso descoberto no abandono pelo percussionista Juan De Marcos Gonzalez, líder da banda Afro-Cuban All Stars, que, em 1997, o apresentou ao guitarrista Ry Cooder. Pai de sete filhos, que lhe deram 14 netos e cinco bisnetos, Ferrer morava em um pequeno apartamento de Havana Velha, sustentado por uma pensão de US$ 15. O colega gringo logo o transformaria numa estrela internacional ao gravar junto com outros músicos pátrios o álbum Buena Vista Social Club – produzido por Cooder –, que originou o documentário homônimo dirigido pelo alemão Wim Wenders. Ibrahim Ferrer se apresenta em São Paulo, nos dias 17 e 18; em Belo Horizonte, dia 19; e no Rio de Janeiro, dia 20, à frente de uma banda que inclui celebridades cubanas, como o baixista Orlando “Cachaíto” López e o guitarrista Manuel Galbán. Aos 77 anos, jovial e brincalhão, o cantor conversou com ISTOÉ de Havana, ao lado da simpática secretária Asela, que traduziu seu sotaque saleroso para um inglês neutro.
Nascido em 1927 em Santiago de Cuba, província mais a leste da ilha, “o berço
da revolução”, Ferrer nunca foi à escola nem aprendeu música. “Já cantava no
ventre da minha mãe, tanto é que fui parido durante um baile”, conta. Sua carreira teve início em 1941. Dos grupos locais saltou para as orquestras de Pacho Alonso
e de Chepin, com quem gravou, em 1956, Il platanal de Bartolo, seu primeiro disco. Em seguida trabalhou com o lendário Benny Moré, época em que ficou amigo de Rubén Gonzales, então pianista de Enrique Jorrin, o criador do cha-cha-cha. Só conheceria Compay Segundo durante as gravações do Buena Vista Social Club.
Após a repercussão internacional do grupo, lançou Buena Vista Social Club apresenta Ibrahim Ferrer e o recente Buenos hermanos. Os álbuns lhe garantiram dois Grammy, que ele não pôde receber porque o governo americano lhe negou o visto de entrada.
Hoje, Ferrer vive numa casa espaçosa que comprou em Miramar, de frente para a praia. Com uma existência mais confortável, quer se apresentar em lugares menores, mais perto do público. Também pretende dar vez aos jovens, que o adoram. Uma prova da sua aura cult é a participação na música Latin Simone
(que pasa contigo), do disco de estréia do grupo virtual inglês Gorillaz. “Fui até homenageado pela revista Bilbao, Billboy, não sei bem”, disse. “Billboard” , corrigiu a atenta Asela. A intromissão de nada adiantou. Sem se importar com o erro, Ibrahim Ferrer caiu na gargalhada.