Desde que a administração do Iraque ocupado se revelou muito mais problemática do que o governo do presidente George W. Bush previa, com ataques diários à força de coalizão e muitas baixas no Exército americano, o governo dos Estados Unidos se esforça para se livrar desse abacaxi. Em ano eleitoral e percebendo a tendência descendente de sua popularidade, o presidente Bush iniciou uma ofensiva diplomática no intuito de dividir, com a comunidade internacional, o ônus político e humano da administração iraquiana. Mesmo após a vitória no Conselho de Segurança (CS) da ONU, que aprovou por unanimidade uma resolução anglo-americana colocando fim à ocupação de 430 dias do Iraque no próximo 30 de junho, Bush voltou a reforçar a impressão de que sentiu os estragos causados no Iraque. Durante encontro do G-8, na quarta-feira 9, no Estado americano da Geórgia, ao lado de seu fiel aliado, o premiê britânico, Tony Blair, o mandatário americano insistiu em um apoio da Organização dos Tratados do Atlântico Norte (Otan) no Iraque. Mas o presidente francês, Jacques Chirac, feroz opositor à guerra, não demonstrou querer ajudar a descascar esse imenso abacaxi: “Não acho que seja missão da Otan intervir no Iraque.” A aliança militar, que no Iraque só ajuda na logística, tem experiência como força de paz em missões no Kosovo e no Afeganistão.

Mesmo com a renitência francesa sobre o papel da Otan, ao menos no Conselho de Segurança, Washington alcançou na terça-feira 8 uma bela vitória. Foi unânime a aprovação da proposta anglo-americana que legitima o governo iraquiano indicado pelos EUA. Fruto de muita negociação e reescrita quatro vezes em duas semanas, a resolução prevê um calendário eleitoral. A atual ocupação terminará em 30 de junho com a volta do administrador americano no Iraque, Paul Bremer III, aos EUA. Então, assumirá o governo indicado pelos EUA na primeira semana de junho – como presidente, o sunita Ghazi Yawer, e como primeiro-ministro, o xiita Iyad Allawi. Ambos passaram muito tempo de suas vidas na Europa e nos EUA. O médico Allawi, inclusive, é tido como um antigo colaborador da CIA.

Eleições livres – Em janeiro de 2005, estão previstas eleições para uma Assembléia Nacional (sob supervisão da ONU), que indicará um novo governo. Esse novo governo será responsável pela elaboração de uma Constituição definitiva que terá de ser referendada pela população. No final desse ano, deverão acontecer finalmente as eleições gerais e diretas, para que, no início de 2006, um governo genuinamente eleito tome posse. Justamente a data em que expira o mandato da força multinacional. Segundo o acordo, o petróleo do Iraque ficará sob controle iraquiano.

Apesar da transferência de poder, a resolução garante a manutenção de quase 160 mil soldados americanos, dessa vez sob a alcunha de “força multinacional”, com autonomia sobre as operações militares na região. França e Alemanha queriam que a autoridade iraquiana pudesse ter poder de veto sobre as ações militares da força multinacional. O secretário de Estado americano, Colin Powell, ofereceu uma “parceria” com os iraquianos, mas garantindo à força multinacional “a autoridade para tomar quaisquer medidas necessárias para a manutenção da segurança e estabilidade no Iraque”. Em suma, que seja mantida a ocupação militar do país. Outro problema a ser resolvido pelo futuro governo é a espiral de violência entre a minoria curda e a maioria xiita. O clérigo xiita aiatolá al-Sistani é contrário a uma Constituição que dê autonomia aos territórios curdos no Iraque.