Nos dias atuais, é difícil encontrar alguém
que não pense em fazer ajustes na rotina
para viver mais e melhor. Proteger a saúde, perder peso… quem não quer? O mercado de alimentos já reflete essa preocupação. É o que atesta um levantamento feito pelo Instituto AC Nielsen em 59 países, cujos resultados foram divulgados na semana passada. Entre os quatro grupos de alimentos que mais apresentaram crescimento nas vendas entre 2003 e 2004 três são conhecidos pelos benefícios à saúde. Em primeiro lugar estão as bebidas à base de soja, com crescimento de 31% no período. Em segundo, ficaram os iogurtes líquidos (19%) e, em quarto, atrás dos ovos, o segmento de cereais (14%). Com exceção do ovo, todos são alimentos com qualidades funcionais. Além de nutrir, eles têm algum tipo de ação reguladora de funções ou sobre o metabolismo. Desse modo, ajudam a reduzir o risco de tumores e problemas cardiovasculares, entre outros efeitos.

O interesse pela qualidade da comida é um fenômeno ao qual até as cadeias de fast-food estão se adaptando. A rede McDonald’s, por exemplo, introduziu no menu salada, filé de frango e maçãs entre as opções. “A população está cada vez mais consciente do que come”, diz a nutricionista Maria Luiza Ctenas, consultora da empresa. Muitos restaurantes oferecem opções light e há outros cujo apelo é oferecer comida saudável. No Equilibrium (SP), duas nutricionistas de plantão orientam a dieta do cliente. “Atendemos pacientes com hipertensão e outras alterações”, explica a nutricionista Cynthia Antonaccio.

A indústria também corre para atender ao desejo por mais saúde. Nesta semana, a Unilever anuncia que as marcas Doriana, Claybom e Delicata terão o nível de gordura trans reduzido para menos de 1% do volume total. É uma ótima notícia. Esse tipo de gordura é extremamente prejudicial. “A trans influencia o aparecimento ou o crescimento de placas de gordura nas artérias”, explica a médica Tânia Martinez, do Instituto do Coração (SP). Essa gordura é encontrada em três situações: como resultado do processo da hidrogenação (empregado para dar consistência cremosa à margarina), na fritura (quando parte do óleo se solidifica ao redor do alimento) e em produtos de origem animal. Baixar a quantidade da trans para menos de 1% significa que as margarinas estão quase livres da vilã. Hoje, isso já acontece com a Becel e a Doriana Light, ambas da Unilever. E ainda neste mês será lançada a primeira maionese sem colesterol do mercado. A novidade, da Hellmann’s, se deve à retirada da gema do ovo. “É nela que o colesterol se encontra. Mantivemos a clara e a consistência é praticamente a mesma do produto tradicional”, conta a gerente de marketing da empresa, Marcela Mariano.

Essas novidades são resultado de um movimento feito em duas direções. A primeira é a sofisticação tecnológica da indústria, capaz de proezas como uma maionese sem ovo. A outra diz respeito ao conhecimento garimpado nos laboratórios sobre os alimentos. Combinados, esses avanços prometem mais. Só para se ter uma idéia do que pode vir, no Japão, por exemplo, há produtos invejáveis, como bebidas que contribuem para o controle da pressão arterial (elas contêm um composto extraído de um peixe que tem esse efeito).

Na busca pelos segredos da comida, os cientistas estão atentos aos compostos encontrados nos alimentos que protegem o organismo de alterações celulares nocivas e, consequentemente, reduzem as chances de adoecer. Essas substâncias são os fitoquímicos. Uma delas é o licopeno, encontrado em maior quantidade no tomate e eficaz contra o câncer de próstata. O resveratrol (presente no vinho tinto e no suco de uva, entre outros) também se revelou um recurso para a prevenção de males cardiovasculares.

Os pesquisadores estão lançando mão de instrumentos requintados nessa investigação. Diversos centros de estudo, por exemplo, medem o impacto dos compostos sobre os genes humanos. “É um caminho para entender por que o organismo de uma pessoa reage melhor à ação de moléculas presentes na uva do que outra”, exemplifica Franco Lajolo, da Universidade de São Paulo (USP), que iniciou um estudo para avaliar o glucosinolato, encontrado em couves e repolhos, e seu possível efeito na redução dos riscos de câncer de fígado. Outro desafio é entender se os compostos atuam sozinhos ou em grupo. “É necessário saber se a ação depende de outras substâncias da planta”, diz Jorge Mancini Filho, coordenador de diversos estudos na USP. Algumas das avaliações conduzidas pelo pesquisador comprovaram a ação de temperos como salsinha, orégano, alecrim e sementes de mostarda como antioxidantes (protegem as células de reações danosas ao seu funcionamento).

E também há estudos para revelar as propriedades de frutas deixadas de lado até agora, como o caju. “O caju tem substâncias fitoquímicas. Espero que isso aumente seu aproveitamento”, diz a nutricionista e pesquisadora Elma Wartha, do Rio Grande do Norte. Às vezes, esses esforços servem para refrear expectativas. Muitos alimentos não passam pelo crivo do microscópio – os efeitos da berinjela contra o colesterol, por exemplo, ainda não foram comprovados.

Esses conhecimentos, além de atenderem às necessidades da indústria, alimentam o crescimento de uma especialidade médica, a nutrologia (lida com a manutenção da saúde pelos alimentos). O nutrólogo Edson Credídio, professor na USP de Ribeirão Preto, se abastece das novidades e tem tido sucesso. “Ajudei um garoto a sair da fila da hemodiálise melhorando sua atividade renal com um plano alimentar que excluía carnes e incluía a soja”, conta. A nutricionista Liliana Bricarello, da Sociedade de Cardiologia de São Paulo, por sua vez, recomenda aos pacientes o consumo regular de azeite e tomate para proteger as artérias e o coração. O oncologista Agnaldo Anelli (SP) é outro que aposta num bom cardápio. “Estudos mostram a redução dos casos de câncer retal, gástrico, de mama e próstata com a ingestão elevada de fibras”, lembra. Na semana passada, dois trabalhos divulgados com a chancela do Instituto Nacional do Câncer dos Estados Unidos reforçam que o caminho está certo. Eles revelaram poderes inusitados no cafezinho. Depois de observar uma população de 90,4 mil pessoas por dez anos, cientistas japoneses concluíram que a incidência de tumores de fígado foi 52% menor em pessoas que tomaram doses diárias da bebida. Ótimo para nós.

Agradecimento: Cynthia Antonaccio, nutricionista e proprietária do restaurante Equilibrium (SP), responsável pela elaboração dos cardápios