23/02/2005 - 10:00
Na longa madrugada da terça-feira 15, o governo Lula sofreu sua maior e
mais sangrenta emboscada política, com a derrota do candidato oficial à presidência da Câmara dos Deputados, Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), para o concorrente azarão Severino Cavalcanti (PP-PE). Severino é um legítimo representante de segunda linha do quinto maior partido da Casa.
Mostrou-se uma verdadeira ave-bala da tocaia armada contra o governo
pela maioria silenciosa que encarna a fatia mais inexpressiva, anônima e fisiológica do plenário – o notório “baixo clero”, agora alçado ao cume do poder. Após 17 horas de eleição, intrigas e traições, os “companheiros” aliados do PT usaram o voto secreto para impor um revés humilhante ao Planalto. Às 4h da madrugada, o primeiro choque: Greenhalgh ficou 50 votos aquém dos 257 necessários para ganhar no primeiro turno.
Nas duas horas seguintes, consumou-se a emboscada – inflada pelo ressentimento dos parlamentares contra a desatenção dos ministros, atiçada pela empáfia do PT, potencializada pela inépcia do Planalto na negociação política e precipitada pela chance que a oposição ganhou de decretar a morte matada do candidato governista. Na contagem final do segundo turno, Greenhalgh passou pelo vexame de ter 12 votos a menos: foram 195, contra os esmagadores 300 votos que consagraram Severino e seus fiéis. Sem nenhum lugar entre os sete dirigentes da Mesa que vai comandar a Câmara nos próximos dois anos, o PT se prepara para enfrentar uma vida severina com seus irmãos deputados. “Não quero ser de oposição, mas não aceito ser tratado como qualquer um”, avisa Severino (leia entrevista à pág. 26), que promete impor um regime de seca à enxurrada de Medidas Provisórias. A primeira será a MP 232, que aumenta tributos dos pequenos e micro-empresários, o baixo clero da área de serviços que terá em Severino um devotado protetor. Na primeira conversa entre Lula e Severino – ambos nascidos no Nordeste –, o presidente brincou: “Pernambuco agora está no poder.” Na conversa, Severino alertou: “A medida provisória como está não passa. Fiz a ponderação ao presidente, que é um homem aberto e não tem idéia fixa. Quem tem idéia fixa é doido e doido não pode chegar a lugar nenhum.” A MP será o primeiro teste com o novo comando do Congresso. Os empresários já foram a Brasília protestar num encontro com o novo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), este sim eleito pacificamente num acordo envolvendo o Planalto, sua base e a oposição.
O desastre petista começou com a candidatura avulsa de Virgílio Guimarães (PT-MG), que, magoado com o atropelo da cúpula, se lançou contra seu partido e o governo, sinalizando a anarquia. Na semana decisiva, Greenhalgh chegou a reunir dez ministros do governo – o mesmo governo que os parlamentares condenam pelo crônico desprezo e pouco espaço que abriu em sua agenda nos últimos dois anos. “Esperei 45 dias para ser atendido pelo ministro José Dirceu. Quando ligaram, já tinha esquecido o que queria”, lamenta um senador da base governista. “Eu fiquei esperando oito meses até ser atendido pelo ministro dos Transportes”, reclamava, na manhã trágica de terça-feira, o próprio líder do PT na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP). Resultado: nos partidos aliados, que somavam 150 votos, menos de um terço cravou o nome de Greenhalgh no segundo turno.