A possibilidade de ter detalhes incômodos da vida revelados em biografias não autorizadas costuma gelar o coração dos famosos. Mas o craque Ronaldo, o Fenômeno, alvo das atenções de Jorge Caldeira no livro Ronaldo: glória e drama no futebol globalizado (Editora 34-Lance Editorial, 352 págs.,
R$ 34), pode dormir sossegado. Esse rico perfil não deixa, de expor, é verdade, alguns detalhes curiosos sobre a trajetória do astro que já disputou três copas, venceu duas delas, foi vice na outra, terminou a última como artilheiro com
oito gols e, de quebra, na terça-feira 3 conquistou o título mundial
de clubes pelo Real Madrid. Mas, após o apito final, o que se vê é
uma detalhada apresentação de todas as fases e episódios importantes da vida do atacante. “Ao contrário das personagens históricas que estudo, o Ronaldo é um cara da geração internet. A vida dele está
toda na rede, numa montanha que cresce a uma média de 1,5 mil
textos por dia no mundo”, explica o autor. “Isso facilitou a pesquisa
e contribuiu para que o trabalho, iniciado depois da final da
Copa 2002, fosse concluído rapidamente”, completa.

O autor, chamado pelos amigos de Cafu, sabe muito bem do que fala. Jornalista, sociólogo, torcedor fanático da rebaixada Portuguesa,
Caldeira é também um dos mais sensíveis e disciplinados pesquisadores
do mercado editorial brasileiro. Suas longas investidas em arquivos nacionais e estrangeiros geraram, entre outros, o livro Noel Rosa, de costas para o mar, publicado pela extinta Editora Brasiliense, e Mauá,
o empresário do império
(Companhia das Letras, 1994), a excelente biografia do desbravador Barão de Mauá. Em Ronaldo, escrito entre uma
e outra pesquisa sobre o patriarca José Bonifácio de Andrada e Silva, Caldeira utilizou sua habitual voracidade na tarefa de reunir dados (mais de 50 mil reportagens catalogadas nos dez primeiros dias de pesquisa) como alicerce para a construção de um texto com fluidez, apesar de incorporar um alto calibre de informações. Caldeira revela, por exemplo, que o índice de 0,7 gol por partida do craque na Inter de Milão, sua pior temporada internacional (a média geral é de 0,82), é quase duas vezes maior que a do genial Diego Maradona no Napoli. E que, em 2001,
Ronaldo – que fatura US$ 5 milhões anuais em salários e pelo menos
duas vezes esse valor em marketing – ficou em nono lugar na lista
dos que mais contribuíram para o imposto de renda italiano.

Na final do Mundial de Clubes na terça-feira 3, o craque fez o primeiro dos dois gols do Real Madrid
e foi eleito o melhor da decisão. Com o título, acaba de entrar, junto com o lateral Roberto Carlos,
seu companheiro de Real Madrid, para o seleto
time dos campeões mundiais de seleções e de
clubes num mesmo ano. Fontes da Fifa garantem que, por tudo isso, o Fenômeno venceu a disputa com o francês Zinedine Zidane e o goleiro alemão Oliver Kahn pelo título anual da Fifa de melhor jogador do mundo. Receberá o prêmio – o terceiro
de sua carreira – na segunda-feira 16, na Suíça. O trabalho começa
no subúrbio carioca de Bento Ribeiro, onde Ronaldo nasceu, e termina
nos dois gols da final do Mundial de 2002, na cidade japonesa de Yokohama. Um dos capítulos mais interessantes revela as circunstâncias em que o craque sofreu convulsões na final da Copa de 1998. Ronaldo
é boa opção para quem gosta de futebol e de boa leitura. Um tiro
certeiro como os que o biografado costuma dar.