26/05/2004 - 10:00
Pés nas nuvens, cabeça no chão.
Assim vive a piloto Claudine Melnik Caldas Camargo, 34 anos, pioneira
na profissão no País
O vestibular de 2005 poderá ser diferente se o governo conseguir emplacar suas propostas de mudança no acesso à universidade. No começo deste mês, o Ministério da Educação encaminhou dois projetos de lei ao Congresso que prometem gerar muito debate. Um deles é o Universidade para Todos, que cria vagas para alunos carentes com renda inferior a um salário mínimo em universidades filantrópicas e particulares. O alvo do outro projeto são as universidades federais. A intenção do governo é reservar 50% das vagas para candidatos que tenham cursado o ensino médio em escolas da rede pública.
O executivo tem pressa em aprovar as mudanças. O ministro da Educação, Tarso Genro, disse que sua colocação em prática mudará radicalmente o modelo de ensino superior no País, abrindo as portas para a população com renda mais baixa. Segundo o Ministério da Educação, a aprovação do projeto Universidade para Todos permitirá liberar entre 60 mil e 70 mil vagas no ensino superior privado e filantrópico para alunos de baixa renda já no segundo semestre deste ano. Isso explicaria a intenção inicial do governo de estabelecer as novas regras por meio de uma medida provisória, idéia depois abandonada.
O líder do PSDB, na Câmara, o deputado mineiro Custódio Motta, diz que o tema é do mais profundo interesse e pensa em convocar um seminário com todos os setores envolvidos. Em relação ao projeto que cria cotas de 50% nas universidades públicas, acredita que a proposta do governo não está bem amadurecida. “Democratizar o acesso à universidade é imprescindível, mas há muitas propostas. Precisamos discutir, por exemplo, se isso não vai dar margem a discriminações”, afirma. Já o ex-ministro da Educação e senador pelo PT Cristovam Buarque defende a criação das cotas, mas discorda que o projeto possa representar uma virada radical. “Esse projeto vai beneficiar os alunos das escolas públicas, mas não se pode mentir dizendo que serão os alunos pobres”, analisa Buarque. De fato, apenas um terço dos alunos que ingressam no ensino médio da rede pública concluem o curso. “Precisamos garantir que 100% deles se formem. Isso sim seria investir na cota mais verdadeira e mais decente”, sustenta o ex-ministro.
Genro: pressa em aprovar as cotas fez pensar em medida provisória
Um dos efeitos mais prováveis do projeto que reserva cotas na escola pública será a migração de alunos da rede privada para a rede estadual, na opinião de vários especialistas em educação entrevistados por IstoÉ. Para o ex-ministro Buarque, o impacto desse aumento de demanda poderá ser positivo. “A chegada de uma classe média vai aumentar a exigência por melhorias na qualidade de ensino da escola pública”, afirma. A educadora Leila Ianone, da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas de São Paulo, concorda e acredita que isso poderá até implicar alguns ajustes na rede estadual. “Mas, por enquanto, tudo isso é especulação. No entanto, vai evidenciar a necessidade de investir mais no ensino fundamental e médio. Seria o certo para igualar as condições de disputa entre alunos da rede pública e da particular”, afirma.
A divisão das vagas na universidade traz mais algumas questões à tona. Atualmente, cerca de 41,8% dos aprovados no vestibular provêm de escolas públicas (dados do Exame Nacional de Cursos). No entanto, são mais numerosos em cursos menos disputados, como letras e história. Um de seus desdobramentos poderá ser o acirramento na disputa entre os candidatos às vagas universais nos cursos mais valorizados, como direito, medicina e engenharia. “Num primeiro momento, também pode haver a diminuição da nota de corte entre alunos que disputam as vagas egressos de escolas públicas”, observa o coordenador do Núcleo de Apoio aos Estudos de Graduação da Universidade de São Paulo (Naeg-USP), Adilson Simonis. “O que vai acontecer é que o sistema de cotas tornará menores as chances dos alunos que saem de escolas particulares”, diz o presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo, José Augusto Lourenço. “Somos contra as cotas. Isso fere o princípio da igualdade”, afirma. A entidade representa 7.800 escolas de ensino fundamental e médio.