28/04/2004 - 10:00
Depois de 45 anos de trabalho, a agência espacial americana Nasa lançou na terça-feira 20 a Sonda B de Gravidade, que vai testar pela primeira vez no espaço a teoria geral da relatividade, do físico alemão Albert Einstein. Concebida em 1915, ela aponta uma nova visão da força de gravitação no Universo. Nela, tempo e espaço são uma única estrutura capaz de se curvar na presença de um corpo. O tamanho dessa distorção depende da massa. Quanto maior um objeto, maior a curvatura ao seu redor. É como se uma bola de ferro fosse jogada numa superfície elástica. Ao ser lançado na mesma superfície, outro objeto seria automaticamente atraído pelo buraco ao redor da bola, não porque há uma força de atração da gravidade, mas pela deformidade do espaço-tempo, a chamada quarta dimensão.
Segundo Einstein, o fenômeno ocorre com a luz, ainda que em menor escala. Seu efeito, porém, só pode ser observado quando a luz passa perto de um objeto de massa muito grande, como o Sol. A grande chance de comprovar essa teoria ocorreu em maio de 1919, na cidade cearense de Sobral. Na ocasião, um eclipse solar permitiu que cientistas britânicos fotografassem estrelas que seriam invisíveis por estarem atrás do Sol. Eles compararam a posição em que determinada estrela era vista pelos observadores com o local onde ela estava de fato. Assim, calcularam o ângulo de desvio que a luz dessa estrela sofreu ao passar perto do Sol. O resultado confirmou os cálculos matemáticos de Einstein. “O problema concebido por meu cérebro foi resolvido pelo luminoso céu do Brasil”, disse o físico, tempos depois.
Desenvolvida pela Nasa e pela Universidade de Stanford, a um custo de US$ 700 milhões, a sonda americana deve fazer no espaço um experimento parecido com o de Sobral, só que de maneira mais precisa. Além de comprovar a teoria de Einstein, o projeto busca evidências científicas de outra teoria, segundo a qual um objeto de grande massa, ao rotacionar em torno de si, pode não só deformar o que está a seu redor como também arrastar o espaço-tempo. Exatamente como um copo de milk-shake grosso: quando se mexe o canudo, o copo acompanha o movimento.
A sonda é composta por um telescópio e quatro giroscópios esféricos que giram sobre o mesmo eixo e estão lacrados no vácuo, numa espécie de garrafa térmica gigante cuja temperatura beira o zero absoluto (-273o C). O telescópio fica apontado para uma única estrela, IM Pegasi. Caso a teoria se comprove, os giroscópios sofrerão pequenas alterações ao passar pela curvatura da Terra. A sonda terá então condições de medir as oscilações, a prova cabal de que Einstein estava certo.
Alguns cientistas criticam a iniciativa. Dizem que é dinheiro demais para comprovar uma teoria testada várias vezes em terra. Outros defendem: “É importante verificar na prática os novos aspectos da teoria”, diz Élcio Abdalla, do Instituto de Física da Universidade de São Paulo. Tamanho interesse tem ao menos duas justificativas. A primeira é que seus efeitos não são observados no dia-a-dia, já que a variação da curvatura de um corpo na Terra é ínfima. Em segundo lugar, porque até hoje ninguém conseguiu resolver um dos maiores desafios da física atual: unir a teoria da relatividade à mecânica quântica, que descreve o mundo das coisas muito pequenas, como os átomos. “Não acreditamos que Einstein esteja errado. A comprovação dessa teoria é necessária para se saber por que até hoje não conseguimos unificar essas duas teorias, que em tese deveriam se complementar”, diz Francisco Xavier de Araújo, pesquisador do Observatório Nacional do Rio de Janeiro. A resposta, só o tempo dirá.