21/06/2006 - 10:00
O prefeito Cesar Maia, do Rio de Janeiro, é hoje o aliado mais adversário que o candidato tucano Geraldo Alckmin já viu. Diz que faz tudo para ajudar, mas também fala tudo o que pensa. E isso significa disparos verbais na direção do presidente do PSDB, Tasso Jereissati, do governador de Minas, Aécio Neves, e em toda a estrutura de campanha montada à volta do candidato. Para Maia, o conselho político organizado pelos tucanos só serve “para tirar fotografia”. Ele acredita que já se desenha um quadro de campanha com caciques de mais e índios de menos. “Ninguém tem tarefas para cumprir”, lembra. Nesta batida, o prefeito não poupa nem o próprio candidato. Em sua ótica, o certo teria sido José Serra como candidato a presidente. Isso só não aconteceu porque Alckmin contrariou sua natureza de político que não gosta de brigas e saiu a campo. “Mas em seguida descansou, como um corredor que completa uma maratona.” Depois dessas duchas geladas, o prefeito concede uma oportunidade para o tucano. Acredita que, caso Alckmin aproveite os tropeços do presidente Lula, mesmo os involuntários – a começar pelo episódio em que os militantes do obscuro MLST, com um chefe petista à frente, invadiram o Congresso –, ainda dá para vencer. “A candidatura tinha tudo para dar errado, mas a partir do episódio do MLST pode haver uma virada.” A ISTOÉ, Cesar Maia concedeu a seguinte entrevista:
Todos trabalhávamos com a expectativa de que Serra seria o candidato. Essa expectativa se mostrou errada. Acho que quando se casa não se deve volta e meia perguntar se com uma namorada anterior seria melhor.
Em qualquer lugar do mundo se estrutura uma candidatura presidencial com, pelo menos, um ano de antecedência. O PSDB resolveu fazer diferente. Lá para setembro a candidatura do partido já devia estar se desenvolvendo, mesmo sem a escolha do candidato, mas não aconteceu nada. Não faço a menor idéia dos motivos pelos quais a campanha não começou na hora certa. Para ser escolhido, Alckmin realizou um esforço pessoal, saindo do seu natural para derrotar o Serra na pré-campanha. Quando esse processo se completou, porém, foi como se ele tivesse vencido a campanha. Naquele momento, ele descansou, como um corredor que cumpriu uma maratona.
O PFL é parceiro, dá opinião quando é acionado. A campanha é comandada pelo candidato ou pelo núcleo do candidato. Depois da primeira reunião do conselho político da campanha, não houve nem convocação para uma segunda reunião. Era um conselho para tirar fotografia? Ao terminar a reunião, deveria haver distribuição de tarefas: um vai fazer levantamento no Nordeste, outro vai tratar com o governador (Germano) Rigotto (do Rio Grande do Sul), e assim por diante. Pois acabou a reunião e ninguém teve tarefas. As pessoas voltaram para casa e continuaram suas vidas. Nem uma encenação política, uma espécie de “teatro”, que é fundamental, nem o que se chama de “carinho” está sendo feito.
Quando um candidato vai se encontrar com um desafeto de um político aliado de outro Estado, a assessoria deveria antes ligar para o aliado e explicar-se. Esses cuidados não existem nessa campanha.
Li no jornal que o Alckmin tinha se encontrado com Garotinho na casa do Michel Temer. Eu soube, mas fiquei na minha. Todos sabem que o nosso contraponto aqui no Rio são Garotinho e Sergio Cabral. Aí sai uma nota no jornal: “Alckmin pensa em ter três palanques no Estado do Rio.” Ele não pode pensar nada sem antes consultar. Vem e diz: “Olha, Cesar, nossa situação é muito difícil. Quero saber como a gente faz para você poder fazer campanha aí e ao mesmo tempo ele me apoiar.” Ele errou. Mas ele não tem nenhuma responsabilidade de saber essas coisas. Mas a equipe tem.
Cicatrizar? Não tem cicatrização. Eu estou dando a minha colaboração. Não quero abrir feridas. O que tento fazer é dar remédios.
Se ele tivesse um projeto de campanha pronto, não teria tempo para fazer brincadeiras. Estou falando de Tasso Jereissati. Eles teriam que contundentemente enquadrar e disciplinar quem estava atingindo a lógica da campanha. Como não tem lógica de campanha, eles partem para outro terreno. Esse talvez seja o maior problema: a campanha do PSDB não tem lógica. Aquele bate-boca foi fruto da escolha de José Jorge para vice de Alckmin. Tasso se envolveu como não poderia ter se envolvido na campanha do nosso líder, Agripino Maia, que inclusive é meu primo. Ele se envolveu com a certeza da vitória, perdeu e não se conformou. Atribuiu a derrota à liderança da Câmara dos Deputados (o líder do PFL é o deputado Rodrigo Maia, filho do prefeito).
Falei da condição de ele ser um governador muito popular de um Estado que hoje seria decisivo na eleição. Eu disse que não via na campanha a dedicação que um líder como ele deveria ter. Por exemplo: houve a visita do Alckmin à feira do zebu em Uberaba. No dia seguinte, ocorreu a inauguração de uma estrada de ferro histórica, entre Ouro Preto e Mariana, com o presidente Lula assumindo simbolicamente o comando da locomotiva. Foi primeira página de todos os jornais. Aécio deve ter cuidado para que o presidente não tenha por parte dele um destaque maior que o candidato Alckmin.
Ela tinha tudo para dar errado, parecia que tinha um comando para dar errado, mas aí vieram esses dois casos recentes: a invasão do Congresso pelo MLST e a discussão do TSE sobre a verticalização, que eu apelidei de TSEnami. Esses episódios produziram um impacto que estanca o processo de formação de opinião. Certamente produziram uma interrupção nesse processo de crescimento do Lula, pelo fato de o presidente estar dentro do MLST.
O (Antonio) Lavareda (sociólogo especialista em campanhas eleitorais) fez uma pesquisa telefônica recente em São Paulo. Tem um viés de classe média, você precisa corrigir um pouco, mas essa pesquisa deu 40 a 29 para o Alckmin. A pesquisa detectou um fato novo, que deve ser percebido pela equipe de campanha do PSDB na sua verdadeira dimensão: o candidato tem agora uma chance de iniciar a campanha para valer e não terá uma segunda oportunidade. Até então, vínhamos num processo que era em direção à vitória do Lula.
A probabilidade de vitória para quem faz uma campanha de reeleição é muito grande. Tem a máquina, tem a tendência da população de não querer mudanças. O eleitor diz: “Se as coisas vão mais ou menos, deixa como está.” Para que o eleitor não vote pela reeleição, seria necessário que estivéssemos vivendo um desastre – o que não é o caso – ou que se detecte um desastre pela frente – o que é o caso. Quando se diz que o segundo governo Lula será um desastre, basta reunir os elementos comprobatórios.
Alckmin tem que aproveitar o caso do MLST. Usar o líder Bruno Maranhão, que é da direção nacional do PT, para colar no presidente e mostrar que esse é o Lula de amanhã. Tem que dizer: “Não vote nele. Você está sendo iludido. O PT do próximo governo vai desmontar esse país.” Na verdade, Lula é um Chávez oculto.
Totalmente. O mensalão não significa corrupção, significa subversão. Uma coisa é um político corrupto tomar uma comissão. Isso é corrupção. Quando alguém sistematiza um processo em que compra o bloco de deputados com vista a estabelecer uma maioria permanente, está subvertendo um poder pelo outro.
Não é difícil perceber. Olhe o tratamento que o Lula deu ao caso da
Bolívia. Ele entendeu as razões do Evo Morales porque aquelas são as suas
razões. No caso dos movimentos sociais, identifica-se que existe um personagem que ganha R$ 6,8 mil por mês do PT e que é o responsável pela mobilização na
rua. Esse é Bruno Maranhão. Quando você pega os fatos e começa a costurar,
é fácil compreender.
Com a Venezuela, talvez. Com a Bolívia não é possível comparar, o Brasil é um país muito grande. Seria um governo nacional-populista. Aliás, o governo Lula é nacional-populista. Não digo que ele fará uma radicalização à esquerda, mas uma radicalização nacionalista e populista, sem dúvida.
Eu temo pelo País, pelos setores assalariados, pelos mais pobres, que já são objeto de manipulação hoje. Imagine o presidente da República, na parte
da tarde, parar o trabalho para fazer uma
videoconferência com os jogadores da Seleção,
para os meios de comunicação saírem fotografando.
Ele tinha que fazer isso às três horas da manhã, no
café da manhã dos jogadores.
Médici já fez isso na época do radinho de pilha. Lula está fazendo agora com tevê de plasma. Não sei se a população digere bem esse processo. Político não se mete nisso. Lula capitalizaria muito mais ficando distante do evento do que se metendo no meio.
Acho que sim. Eu sou prefeito do Rio de Janeiro, uma prefeitura financeiramente fortíssima, e mesmo assim noto a dificuldade que o PFL tem
de conseguir pessoas e empresas que contribuam. Do lado das empresas está
todo mundo apavorado. Se contribui por fora, há um medo tremendo. Por dentro,
um medo tremendo também. Nesse sentido, tendemos a ter um menor volume
de recursos na campanha. Isso significa uma demanda menor. O preço do material de campanha deve cair.
Espero que não, porque o voto nulo só ajudaria Lula, já que reduziria o total de eleitores úteis. O que está acontecendo hoje é que o voto nulo está sendo trocado pelo voto na Heloísa Helena. A pessoa vota nela pensando em apoiá-la, claro, mas está elevando o patamar para o segundo turno e dificultando a tarefa do Lula. Isso é bom para o Lula. Por isso, a campanha de Alckmin não pode brigar com a Heloísa Helena. O voto nela vale para o Lula.