Para um país que foi o berço de Joana D’Arc, a guerreira medieval sacrificada na fogueira, e de Simone de Beauvoir, a musa do existencialismo do pós-guerra, a França contemporânea vinha exibindo uma estranha escassez de protagonistas femininos, principalmente na política. Mas a situação agora começa a mudar e o país poderá finalmente ter, a partir de 2007, uma mulher na Presidência. Trata-se da socialista Ségolène Royal, 53 anos, e que há seis meses está à frente de todas as pesquisas de intenção de voto para o Palais de l’Elysée. Na última, ela obteve 34% das intenções de voto, contra 30% do mais bem posicionado candidato da direita, o atual ministro do Interior, Nicolas Sarkozy. A ascensão dessa dama vem provocando a inveja dos velhos dirigentes do Partido Socialista, os chamados “elefantes”. Laurent Fabius, ex-primeiro-ministro e também pré-candidato socialista, chegou a desdenhar das sondagens, dizendo que a diferença entre elas e as eleições “é a mesma que existe entre a astrologia e a astronomia”. Não contente, ele escorregou para o discurso machista: “Quem vai cuidar das crianças?” Tanto veneno talvez se explique pelo fato de Fabius ter 4% das preferências do eleitorado, enquanto Ségolène é considerada a melhor candidata presidencial por 43% de seus compatriotas.

Bonita, elegante, integrante da nata intelectual do país formada pela prestigiosa École Nationale de Administration (ENA), Ségolène é casada, embora não de papel passado, com o atual secretário-geral do PS, François Hollande, com quem tem quatro filhos. Ela começou sua carreira política durante a presidência de François Mitterrand (1981-1995), ocupando os cargos de ministra do Meio Ambiente e vice-ministra do Ensino, da Família e da Infância. Atualmente é a administradora da região de Poitou-Charentes, cargo para o qual foi eleita no ano passado, derrotando o candidato do então primeiro-ministro Jean-Pierre Raffarin.

Ségolène soltou alguns balões de ensaio que irritaram os dirigentes socialistas. Primeiro, ela defendeu um programa rigoroso de segurança pública, com medidas repressivas contra a delinqüência juvenil – uma bandeira tradicional da direita. Depois, posou de “esquerdista” ao criticar o regime de 35 horas de trabalho, adotado pelos socialistas em 1998. A pré-candidata lembrou que esse sistema aumentou a “precarização” do trabalho, embora tenha criado 350 mil empregos. Para a maioria dos “elefantes”, tal incoerência reforça a tese de que Ségolène é apenas uma “bolha midiática”, sem programa definido. Pode ser. Mas até novembro, eles terão que decidir se embarcam na bolha ou se preferem que a direita continue no Elysée.