14/06/2006 - 10:00
Dono de um apartamento dúplex de 220 metros quadrados num bairro nobre do Recife, filho de usineiro e político sem voto, o chefe petista Bruno Maranhão teve uma idéia para tirar do ostracismo o seu MLST – Movimento pela Libertação dos Sem Terra, organização que no passado recebeu R$ 9 milhões do governo federal. Essa idéia foi invadir e depredar o Congresso, como se viu na terça-feira 6, de maneira premeditada e covarde. O plano da invasão começou a ser pensado dois meses atrás, quando Maranhão, então no cargo de secretário de Organização Popular do PT, reuniu cinco chefes do MLST no Recife e concluiu que sua facção precisava ganhar visibilidade, ofuscada pelas freqüentes invasões de terra patrocinadas pelos concorrentes do MST – o Movimento dos Sem Terra. Na semana anterior ao ataque, com o requinte de uma gravação em vídeo, os últimos detalhes foram acertados em Brasília. No melhor estilo dos guerrilheiros, escolheu-se, ali, o papel de cada invasor durante a missão e a estratégia a ser seguida. “Entraremos como um cavalo doido”, definiu um dos soldados de Maranhão. O plano – do ponto de vista dos agressores – foi um sucesso.
Atônito, o País assistiu a um agrupamento de 540 homens, mulheres e crianças tomarem de assalto as dependências do Congresso. A partir das duas horas da tarde da terça-feira 6, a turba do MLST forjou uma briga na entrada dos fundos do Congresso, agrediu seguranças com pedradas e golpes de porretes, estilhaçou vidros, invadiu o prédio, revirou um automóvel, decapitou estátuas, danificou equipamentos, enfim, fez de tudo para atingir uma das pilastras do regime democrático. Nada menos que 41 pessoas ficaram feridas. Os prejuízos materiais foram estimados em R$ 150 mil. Pergunta-se: no governo do PT, o petista Maranhão e seu séquito terão a punição que merecem?
Sabe-se, até agora, que a polícia fez 537 prisões entre os invasores. Era esperada para o final de semana, porém, a libertação da grande maioria. A velocidade do processo é uma incógnita. O certo é que, caso tivesse vontade política, o governo Lula poderia ter abortado o nascimento de mais essa organização. O Gabinete Militar do governo tem em mãos um documento que prova que a sustentação financeira do MLST vem do caixa de indenizações fraudulentas pagas pelo governo a donos de terras invadidas. Segundo registra o “livro branco das superindenizações”, feito pela Corregedoria do Incra, está provado que o MLST promove invasões em Pernambuco em combinação com donos de terras improdutivas. Esses proprietários chegam a subsidiar o movimento, dando dinheiro para apoiar as invasões. Quando o MLST acampa em suas terras, os proprietários têm apenas o trabalho de pedir indenizações para o governo. Sem os sem-terra em cima de suas propriedades, esse dinheiro jamais poderia ser requerido. Quando a indenização é paga, sustentam as investigações do Incra, ela é sempre muito maior do que o valor de mercado das terras. O esquema é tão amigável que familiares do líder Bruno Maranhão, donos da Fazenda Araripe, tiveram suas terras invadidas pelo MLST e já receberam suas indenizações.
Outra faceta desconhecida da organização é sua prática de assaltos à mão armada. O serviço de informação do governo já sabe que foi de responsabilidade do MLST o assalto a uma agência do Banco do Brasil no interior da Bahia, seis anos atrás. Depois disso, sempre em nome de promover a reforma agrária, os bandoleiros passaram a roubar cargas de caminhoneiros na região Nordeste. No Triângulo Mineiro, outra área de atuação do MLST, depoimentos de militantes colhidos pela Polícia Civil mostram que os que tentam sair do movimento têm a própria vida ameaçada. Nada muito estranho para uma facção que se orgulha de misturar, em sua ideologia, idéias de Mao Tsé-tung e Che Guevara. Um coquetel que, em nome da liberdade, permite roubar e, até, matar. Isso explica a extrema violência empregada pelos invasores do Congresso contra Normando Fernandes, da polícia legislativa. Agredido à base de pedradas, ele sofreu traumatismo craniano e teve de ser levado às pressas a uma unidade de terapia intensiva.
A julgar pelas primeiras atitudes do governo, o caso, que é único e exclusivo de polícia, poderá ser interpretado como um ato político. Afinal, o MLST diz que sua razão de existir é a reforma agrária. Tem até militância contumaz dentro do PT, o partido em que Maranhão fazia parte da comissão executiva até a semana passada, quando foi afastado – e não expulso com desonra, como caberia. Essa militância se dá por meio da corrente chamada Brasil Socialista. A tendência não tem nenhum parlamentar diretamente identificado com sua cartilha, mas em tempos de eleições muitos petistas atrás de votos visitam os assentamentos do MLST, que, neste momento, somam cinco fazendas, com cerca de mil famílias em cima da terra.
Dentro do MLST, o chefe Bruno Maranhão só divide seu poder com duas pessoas: sua secretária Raquel, que aparece na agenda do líder apreendida na quinta-feira 8 pela polícia de Brasília como a responsável “para fechar os números do PT e o orçamento das passagens para R$ 6 mil”, e José Aruti, que também aparece na fita de vídeo dizendo que vistoriou a Câmara durante 15 dias antes do ataque.
Segundo seus amigos, Bruno é um homem educado, vaidoso e centralizador. Experiente na política, ninguém que o conhece acredita que a baderna do Congresso tenha acontecido por falta de controle do movimento. Todos são unânimes, como foi comprovado pelas fitas de vídeo, que a ação foi planejada.
O Palácio do Planalto, após a invasão do Congresso, limitou-se a expedir uma nota com uma condenação do ato. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo, durante a invasão evitou até o último instante chamar forças policiais. A pré-candidata a presidente do PSOL, senadora Heloísa Helena, tentou repudiar o vandalismo, mas cometeu o ato falho de dizer que o maior problema estava na troca do endereço da invasão, apontando o alvo certo como sendo o Palácio do Planalto. Bem melhor fez o ultra-esquerdista José Maria de Almeida, presidente do PSTU. “Qualquer pessoa que some um mais um saberia que essa idéia de invadir o Congresso estava errada”, afirmou. “Isso é tudo o que a reforma agrária não precisa.”
Militantes do MLST já assaltaram um banco na Bahia, roubaram
caminhoneiros no interior e receberam dinheiro de fazendeiros