09/08/2002 - 10:00
Ronaldo Fenômeno tem 25 anos, é famoso, fatura US$ 6 milhões anuais de salário e embolsa quase o dobro disso em contratos de publicidade. É pentacampeão mundial, foi artilheiro da Copa 2002 com oito gols, pode ser eleito o melhor jogador do mundo pela terceira vez, é casado com uma loira bonita e tem um filho animadíssimo. Talvez seja difícil para muitos acreditar, mas esse rapaz disse ao mundo inteiro, na semana passada, que ainda busca a felicidade. “Fico triste, mas entendo a reação da torcida. Não estou agindo motivado por dinheiro – quero apenas ser feliz”, abriu o coração. O Fenômeno está abatido porque quer deixar a Inter de Milão, mas o presidente do clube, Massimo Moratti, e o técnico, o argentino Hector Cuper, estão dificultando a sua saída. Nos últimos anos, Ronaldo foi protagonista de vários dramalhões. Sofreu uma convulsão antes da final da Copa 1998 e, após duas cirurgias no joelho, voltou a jogar o fino. Quando tudo parecia uma maravilha, percebeu nuvens
pesadas no céu. Dias atrás, o técnico penta Luiz Felipe Scolari o chamou de “mimado” e afirmou que ele “será no máximo 80% ou 85% do que era”. O Fenômeno manteve a elegância e, na quarta-feira 7, o treinador disse gostar do jogador “como um filho”.
Arestas aparadas, Ronaldo passou a sofrer com o dramalhão italiano. Na terça-feira 6, atravessou o Atlântico para uma conversa com Moratti. De férias, o presidente escalou o dirigente Rinaldo Ghelfi, o que teria desagradado Ronaldo e seus assessores. Cem torcedores aguardavam o craque no aeroporto, com uma faixa em que se lia “Ronaldo ingrato”. Não chegaram a vê-lo. O Fenômeno deixou o avião acompanhado de um segurança e, ainda na pista, entrou num carro. Na reunião, confirmou a Ghelfi o que um de seus empresários, Alexandre Martins, dissera a Moratti três meses antes: queria deixar o clube. O tempo fechou. No site da Inter, torcedores o apelidaram de “Robaldo”, “Mercenaldo” e Ingrataldo”. Numa das mensagens enviadas ao site do jogador, o torcedor não fez por menos: “Quebraremos as suas pernas quando você chegar a Malpensa (o aeroporto de Milão)”.
Dois assessores ouvidos por ISTOÉ, amigos próximos do jogador, garantem que a gota d’água teria sido um boicote de Cuper e de seu preparador físico, Juan Manuel Alfano, após a segunda cirurgia sofrida pelo jogador. Cuper e Alfonso, afirmam eles, duvidaram da recuperação do Fenômeno, evitaram colocá-lo em campo no final do campeonato, implantaram um sistema de treinamento que resultou em mais de 30 contusões no grupo e boicotaram, por ciúme, o trabalho do jogador com o fisioterapeuta Nilton Petrone, o Filé. “Esse argentino tem um histórico de ódio contra brasileiros. Fez de tudo para mandar embora o atacante Adriano, um belo jogador, e conseguiu”, acusa um deles. Ronaldo recebeu em dia o salário anual de US$ 6 milhões, pago com a ajuda da Nike. Mas sentiu que a maioria dos dirigentes importantes do clube não levava fé na sua volta. Com a volta por cima, decidiram faturar alto. O destino mais provável do craque seria o Real Madrid, onde receberia US$ 7 milhões anuais. “Foi uma enorme c… As pessoas deveriam questionar o caráter desse jogador. Não queremos mercenários”, atacou o alemão Karl-Heinz Rummenigge, ex-jogador da Inter e atual dirigente do Bayern de Munique. “Chamar Ronaldo de mercenário por causa de US$ 1 milhão por ano é piada. Ele não precisa disso. Ganha quase o dobro de seu atual salário anual com a sua imagem”, atesta o assessor Rodrigo Paiva.
O contrato não tem multa rescisória, mas vincula o craque ao clube até 2006. “A multa é ter que aguentar o Cuper”, brinca Martins. Se rompesse o compromisso de forma unilateral, sofreria uma longa retaliação na Fifa e na Justiça. Moratti falou em impensáveis 100 milhões de euros (cerca de US$ 97 milhões) para liberá-lo. Diante da proposta indecente, os dirigentes espanhóis recuaram. Tudo indica que Ronaldo deixou claro que a Inter é pequena demais para ele, Cuper e Alfano. O problema é que Moratti não deseja abrir mão de Cuper e, ao mesmo tempo, pede uma fortuna para soltar o Fenômeno. Enquanto não surge um clube disposto a colocar tanto dinheiro na parada, o presidente joga o craque contra a torcida e o força a engolir Cuper. “Ronaldo já se apresentou. Se não aceitarem negociá-lo em outras bases, ele cumprirá o contrato até o fim”, afirma Martins. Paiva ainda acredita em mudanças. “Tudo pode acontecer. O torcedor quer o craque, mas não dá para obrigar pessoas que não se entendem a trabalharem juntas.” Ronaldo também espera que o bom senso prevaleça. Assim, além de jovem, milionário, bem casado, pai orgulhoso, pentacampeão, artilheiro e famoso, voltará também a ser feliz.