Quando o tecno começou a virar moda no Brasil, qualquer DJ que ousasse colocar nas pistas uma música cantada em português era chamado de careta. Hoje, ser moderno é fazer as pessoas dançarem ao som de clássicos da MPB remixados com a alucinada batida eletrônica. O primeiro sinal de mudança se deu com a fusão de samba, bossa nova e batuque digital feita pela turma do drum’n’bass, que resultou no contagiante remix de Carolina Carol bela, de Toquinho e Jorge Ben Jor. Sucesso das baladas, a versão dos DJs paulistanos Marky e XRS, faixa do álbum Audio architeture: 2, foi lançada na Inglaterra em julho. Subiu direto para o cobiçado Top of the pops, da BBC, à frente do Oasis. “Estou com algumas cartas na manga que vão ser fatais”, anuncia Marky, que prepara novas investidas no tesouro musical verde-amarelo.

Antenadas com a tendência, as gravadoras começam a apostar na novidade. Na surdina, a Sony Music prepara um CD só com releituras dance de Roberto Carlos. Marky está às voltas com Se você pensa, Ramilson Maia finaliza Eu quero apenas (um milhão de amigos) e Patife, Eu sou terrível, enquanto XRS já toca no rádio e nos clubes sua versão adrenalinada de O calhambeque. “Escolhi esta música porque tem um andamento mais próximo do drum’n’bass. Só reforcei a bateria e a linha de baixo, mantendo o violão.” Mentira. Basta Roberto dizer o tradicional “bye!” para a releitura virar uma explosão sonora de arrepiar os cabelos brancos do Rei.

Como de bobo da corte o DJ Zé Pedro só tem os exuberantes
chapéus exibidos no É show de Adriane Galisteu, ele saiu na frente
com o CD Música para dançar, no qual acelera canções como Morena
de Angola
, conhecida na voz de Clara Nunes, ou Não deixe o samba morrer, marca registrada de Alcione. Mas trata-se de um trabalho apressado, com escolha óbvia e minguado de boas idéias. “O País tem problema de memória, por isso procurei manter o essencial das músicas”, defende Zé Pedro.

Um bom remix não é só fiel ao original. Investe na ousadia, oferecendo uma roupagem nova e surpreendente, como na versão de Ramilson Maia para Fato consumado, de Djavan, em que ele registra um mantra com um vocalise do cantor alagoano. “Remixei porque adoro esta faixa e queria tocar na noite”, afirma Maia. “O neguinho que a conhece passa mal quando escuta. É legal resgatar a nossa música.” Agora, Ramilson só precisa da autorização de Djavan para editar em disco sua versão. Outro exemplo feliz é Você me veste, do carioca Marcão DJ, que transformou uma declamação de Maria Bethânia – a mesma usada pelo DJ Zé Pedro em seu disco – num canto-falado com batida pesada, grande sucesso nas pistas do Rio de Janeiro. Com a mesma criatividade, a dupla paulista Drumagick usou o refrão de Take it easy, my brother Charles, de Jorge Ben Jor, para criar Easy boom. Além de metais de big band, a dupla usou uma linha de baixo diferente da original. “Como pegamos apenas um elemento da música, não considero o resultado um remix, mas outra canção”, afirma Jr. Deep, do Drumagick. Agora só falta uma legislação que reconheça estas parcerias inusitadas.