26/03/2003 - 10:00
Barra-pesada e problemas com a censura era assuntos constantes                de Plínio Marcos. No final dos anos 60, depois do recrudescimento                do regime militar, o dramaturgo tinha todas as suas peças                proibidas, embora fosse figura popular na televisão. Ou seja,                podia aparecer, mas era impedido de se expressar. Seu trabalho refletia                esta claustrofobia ao estabelecer um diálogo selvagem entre                censura e criador e ao reproduzir o conflito entre o sistema e a                sociedade. É justamente este tom de pesadelo recorrente e                infindável que falta a
  2 perdidos numa noite suja (Brasil, 2002) – em cartaz                no Rio de Janeiro
 e em Belo Horizonte na sexta-feira 28 –, filme de José                Joffily baseado
 na peça de mesmo nome, escrita pelo autor santista em 1966.                A história já havia chegado às telas em 1970,                dirigida por Braz Chediak, mas
 a versão de Joffily se distingue pelas modificações                introduzidas juntamente com o roteirista Paulo Halm. Agora, o diálogo                agressivos de dois marginais num muquifo paulista transformou-se                no retrato de dois brasileiros perdidos em Nova York.
Tonho (Roberto Bomtempo) é um mineiro bronco de Governador                Valadares, que vive de bicos e casa-se com uma qualquer para conseguir                visto americano de permanência. Paco (Débora Falabella)                seria um prostituto drogado, se não fosse mulher. Seu sonho                é gravar um disco
 de rap e ficar famosa. Como atriz, Débora – a Mel da                novela global O clone – impressiona. Dona de um despudor                beirando o desconcertante, praticamente acua o sóbrio Bomtempo.                O resultado tem sua força. Mas, se comparado ao texto original                de Plínio Marcos, a atualização do 
 assunto se mostra equivocada. A força dos personagens iniciais                estava no distanciamento. A marginalidade era o outro lado do espelho                para
 a maioria do público. Na atual versão, Tonho e Paco                exalam a familiaridade e a vacuidade típica dos participantes                de reality show. Talvez Joffily e Halm tenham encontrado um novo                conceito de barra-pesada: a vida expressa em clichês.