17/05/2006 - 10:00
Foram apenas 160 milímetros de chuva entre dezembro de 2004 e fevereiro de 2005 na Serra Gaúcha. No verão anterior, haviam sido 570. A umidade relativa do ar caiu de 74% em 2004 para 68% no ano passado, em média, e a temperatura saltou de 20,6oC para 21,9oC. Foi o suficiente para deixar os produtores de vinho em êxtase. O clima quente e seco durante a maturação das uvas fez surgir tintos encorpados, com forte aroma de frutas vermelhas, cor intensa e baixa acidez. Nunca os vinhos nacionais foram tão saborosos quanto os da safra 2005, considerada por todos os especialistas e produtores a melhor da história do País.
Tradicionalmente, os altos índices de chuva e umidade no mês de fevereiro colaboram para que fungos ataquem as videiras gaúchas e exijam uma colheita precoce. “Com medo de perder as uvas, o produtor as colhe antes do momento certo”, explica o pesquisador da Embrapa Mauro Zanus, de Bento Gonçalves (RS). “Assim, o vinho sai mais ácido do que deveria, com menos aroma e ligeiramente aguado se comparado ao produto desenvolvido em condições ideais”, diz. Isso não aconteceu em 2005, quando as frutas atingiram o grau máximo de maturação. “Fazia 40 anos que não tínhamos um verão tão seco. Por ironia, o mesmo clima que destruiu a produção de soja foi excelente para os vinhos”, compara o enólogo Lucindo Copat, da Salton. A colheita de 2004 já havia despertado grandes elogios, o que fez aumentar a surpresa no ano seguinte. “A estiagem deve se tornar uma constante. Torço para que, todos os anos, tenhamos a felicidade de comemorar a melhor safra da história”, enaltece o presidente da Associação Brasileira de Enologia, Dirceu Scottá.
As condições climáticas descritas acima são comuns nos melhores vinhedos do Chile e da Argentina. Dessa vez, é provável que muitos produtos nacionais superem em qualidade concorrentes vizinhos tradicionalmente melhores em suas faixas de preço. A conjuntura foi especialmente favorável para os tintos, já que a estiagem resseca os bagos e faz aumentar a porcentagem de casca em relação ao suco, fornecendo maior intensidade de cor e maior maciez nos taninos, a substância responsável pela sensação de adstringência semelhante à provocada pelo caju. “Nossos vinhos chegaram a ter 16% de álcool, o que só se consegue em grandes safras”, explica Neimar Godinho, dono da Casa de Amaro. “Para não causar estranheza, vamos combinar esse vinho com amostras menos alcoólicas e lançar garrafas com 13%, após alguns meses de envelhecimento”, diz.
Enquanto muitos vinhos 2005 esperarão algum tempo nos tonéis de madeira ou
nas garrafas, a maioria das vinícolas já disponibiliza alguns rótulos. “São vinhos jovens, que obedecem à tendência mundial dos tintos, cada vez mais frutados
e aromáticos, para valorizar as características primordiais da fruta”, interpreta Adriano Miolo, diretor da empresa que leva o nome de sua família. É o caso dos
dois novos rótulos da Lídio Carraro, Elos e Singular. “São apenas 3,3 mil garrafas do primeiro e duas mil do segundo, o que deixa os clientes ansiosos”, comenta a produtora Patrícia Carraro. Além deles, vale a pena experimentar a nova linha Series, da Salton, e os já tradicionais Casa Valduga Duetto, Miolo Reserva, Fortaleza do Seival, Lovara, Dal Pizzol e Aurora Varietal. Tintos como esses prometem se tornar
as melhores opções para o inverno. Muitos desaparecerão das prateleiras antes de julho. É melhor ficar atento.