As pesquisas eleitorais têm mostrado o crescimento da Frente Trabalhista na disputa eleitoral, mas Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, candidato a vice-presidente na chapa de Ciro Gomes, não vive um bom momento. Passou a última semana tentando se defender da acusação de usar laranjas para a aquisição de imóveis e agora é acusado de usar um intermediário para tentar comprar o silêncio de antigos companheiros que poderiam fazer novas denúncias envolvendo a Força Sindical em desvio de dinheiro público, particularmente recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Quem se apresenta como intermediário de Paulinho é Marcos Cará, um dos fundadores da Força Sindical, que hoje auxilia na campanha da Frente Trabalhista e presta assessoria aos sindicatos dos motoristas de Campinas e de São Paulo, ambos filiados à Força Sindical. A “testemunha” a ser comprada é Vagner Cinchetto, também fundador da Força, que em outubro do ano passado procurou o Ministério Público Federal e, em depoimento gravado, denunciou uma série de falcatruas que teriam sido praticadas pela central sindical, como o superfaturamento de imóveis comprados com verbas do governo. Até hoje essas acusações estão sob investigação.

Cará começou a procurar Cinchetto no final de junho, logo depois de confirmada a indicação de Paulinho para vice de Ciro. Foram diversos telefonemas, um deles para a irmã de Cinchetto, que reside em Dois Córregos no interior paulista. Segundo Cinchetto, Cará ligava em nome de Paulinho e insistia em marcar um encontro alegando que o candidato a vice queria saber qual seria o preço para ter a certeza de que não seriam feitas novas denúncias. Desconfiado de que pudesse estar no centro de uma cilada, Cinchetto só concordou em jantar com Cará depois de tomar algumas precauções. Contou o que estava acontecendo a um advogado, a três jornalistas de diferentes órgãos de imprensa e ao procurador da República Luiz Francisco de Souza. “É verdade. Ele me avisou que estava sendo procurado pelo pessoal do Paulinho e eu o aconselhei a marcar o encontro e levar a conversa adiante. Disse também a ele para levar um gravador nesses encontros. É o método Juruna de flagrar corruptos”, afirmou o procurador, referindo-se ao ex-deputado indígena Mário Juruna, que gravava todas as suas conversas.

Na terça-feira 30, Cinchetto e Cará jantaram no restaurante Almanara da rua Sete de Abril, no centro de São Paulo. Um jornalista permaneceu o tempo todo sentado à mesa ao lado e, enquanto folheava uma revista, pôde presenciar a conversa. Cará relatou que Paulinho estava tenso e politicamente fragilizado. Ele temia que uma nova denúncia pudesse afastá-lo da disputa presidencial, pois já estaria sofrendo pressões políticas dentro da própria Frente Trabalhista, uma vez que o ex-senador Antônio Carlos Magalhães, segundo o auxiliar de Paulinho, estaria jogando nos bastidores para indicar um novo vice para Ciro Gomes. Cinchetto respondeu que estava realmente empenhado em denunciar outras falcatruas da Força Sindical, e citou casos que disse serem concretos, como o desvio de verbas do FAT destinadas ao Instituto Paulista de Educação e Cultura (Ipec), que nos últimos meses teria recebido cerca de R$ 58 milhões do governo federal.

O preço do silêncio – O dinheiro deveria ser usado para a compra de vales-transporte, alimentação e material didático para os trabalhadores que fazem os cursos oferecidos pelo Ipec. Segundo Cinchetto, a maior parte dos alunos não recebe o vale-transporte e no final do mês esses vales seriam trocados por dinheiro em empresas de ônibus cujos trabalhadores são ligados à Força Sindical. Depois de muito bate-papo, Cará afirmou que levaria a Paulinho a proposta de pagar R$ 3 milhões pelo silêncio de Cinchetto, disse que ficaria com parte do dinheiro, avisou que o negócio teria que ser rápido e ficou de marcar nova conversa no dia seguinte. Na quarta-feira 31, Cará ligou por volta das 16 horas. Disse que Paulinho havia ido ao médico e só o recebeu no comitê de campanha depois do meio-dia, mas que aceitara pagar os R$ 3 milhões. Os dois marcaram um segundo encontro, que ocorreu às 17 horas na pastelaria Yokohama, na avenida Lins de Vasconcelos, próximo à casa de Paulinho. Dessa vez, Cará estava acompanhado de sua mulher, Kátia. Quando estavam conversando, Cará teria desconfiado de dois homens de gravata que pareciam ouvir o que falavam e resolveu tirar satisfações. Os dois se apresentaram como procuradores municipais e alegaram que estava havendo um mal-entendido. Diante da dúvida, Cinchetto, Cará e Kátia terminaram o encontro na doceria Amarante, perto dali.

Cará, segundo Cinchetto, disse que Paulinho teria telefonado para José Francisco Campos, tesoureiro do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, pedindo que viabilizasse os R$ 3 milhões que seriam entregues a Cinchetto. O pagamento seria feito em dólar e o próprio Campos seria o responsável pela entrega do dinheiro. Depois da reunião, Cinchetto resolveu anunciar o que ocorrera nos dois encontros em mensagens cifradas no jornal. “Achei que eles poderiam estar armando uma cilada para me desmoralizar e diriam que era eu quem estava tentando obter vantagens para não dizer o que sei”, disse Cinchetto. Na página 11 do caderno de classificados do Diário de S.Paulo da quinta-feira 1º, consta o seguinte anúncio, sob o título “São Vagner Ltda”. “A São Vagner Ltda. informa que, continuando as negociações realizadas no dia de ontem, visando preservar o cargo de vice-presidente, as partes fixam o valor de R$ 3 milhões à tonelada de cará a serem entregues pela empresa Campos Ltda., localizada à rua do Carmo, nesta capital.” No dia seguinte, o mesmo diário publicou o seguinte: “Dando prosseguimento às tratativas referentes à preservação do cargo de vice-presidente, as partes informam que o entrevero com a Procuradoria do Município no pastifício Yokohama não atrapalhará a remessa de carás.”

Na noite da quinta-feira 1º, ISTOÉ tentou localizar Paulinho em seu telefone celular e em sua residência, mas ambos não responderam. Também Cará não foi encontrado nem no celular nem no Campinas Flat Service, onde mora com a mulher. As precauções tomadas por Cinchetto são suficientes para afastar a hipótese de uma tentativa de extorsão, mas não comprovam que de fato Cará estivesse autorizado por Paulinho a conduzir tamanha picaretagem. Aparentemente, somente Paulinho ou o próprio Cará é que poderão esclarecer se o candidato a vice está mesmo empenhado em comprar o silêncio de antigos desafetos ou se o sindicalista ligado à Força Sindical e auxiliar de campanha da Frente Trabalhista anda por aí usando o nome do vice de Ciro para tentar obter vantagens financeiras.