O governador do Paraná, Jaime Lerner (PFL), é um político diferente. E não apenas pelo seu grande conhecimento
das questões urbanas, mas por uma
certa ojeriza da atividade parlamentar. Talvez por isso, Lerner tenha desistido
de disputar uma vaga no Senado. Ele
não tem paciência para as articulações
de bastidores que imperam em Brasília. Quando acabar o mandato, pretende
sair pelo País explicando seus projetos inovadores, que o transformaram num arquiteto e administrador admirado em vários países. Antes de deixar
o cargo, no entanto, Lerner pretende cumprir uma missão política:
levar o PFL de volta à base de apoio do presidente Fernando Henrique. Com a voz pausada, sem arroubos, Lerner defende uma aliança com
o tucano José Serra, mesmo sabendo que está na contramão
da maioria de seu partido.

ISTOÉ – Que argumentos o sr. pretende usar para levar o PFL à candidatura de José Serra?
Jaime Lerner –
Bom senso, lógica. Vou defender o que tenho defendido há algum tempo, que é o retorno do partido à base de apoio do governo. Se o PFL foi responsável durante sete anos e meio por momentos importantes, pela governabilidade, não encontro razões lógicas que levem a imaginar o PFL como um partido de oposição. É como num divórcio querer ficar com a aliança, com os quadros, os discos, os livros e só devolver a fotografia. Agora que a candidatura do PFL não existe mais, eu defendo o retorno à base do governo e o apoio ao candidato José Serra, que é a melhor solução.

ISTOÉ – Mas como driblar o desgaste do governo na relação com lideranças importantes como o ex-senador ACM e a ex-governadora Roseana Sarney?
Lerner –
Às vezes ocorrem decisões emocionais. Não quero julgar o que já passou. O PFL nunca se preparou, como partido, para lançar um candidato presidencial. Somos de um partido que tem os melhores quadros, excelentes administradores, só que nunca tivemos um discurso que chegasse perto da população.

ISTOÉ – Uma aproximação com Ciro Gomes (PPS) ou Garotinho (PSB) é complicada do ponto de vista ideológico?
Lerner –
De tudo. Tomo por base a declaração do senador Roberto Freire, presidente do PPS. Ele está falando a verdade. Não há possibilidade de liga. Tenho uma relação muito boa com todos. Não tenho nada contra esses nomes, o problema é que o PFL não é oposição. É governo e o candidato do governo é o mais qualificado.

ISTOÉ – Apoiar Serra não racharia o partido?
Lerner –
É o partido que vai decidir. Estou dando a minha opinião. Até agora tem se tratado muito dessas disputas, querelas. Estamos na fase de bravatas e desaforos. E os problemas do País? Eu quero ver a discussão de como é que cada candidato vai resolver os problemas de gente. Nos problemas econômicos, tenho certeza de que todos vão dizer “deixa como está mais ou menos…” Temos que escolher o presidente que cuida melhor de gente e é aí que entra uma coisa que eu gosto de colocar pela minha formação profissional. A grande discussão no mundo hoje é a globalização e a solidariedade. Mário Soares (ex-presidente de Portugal) chama de globalização solidária, outros chamam de solidariedade globalizada, mas na verdade trata-se de encontrar um caminho que chegue mais perto da solidariedade.

ISTOÉ – Com a verticalização mantida pelo STF, ficar sem candidato não é mais cômodo?
Lerner –
Pode ser que o partido chegue à conclusão de que ficar sem candidato é melhor, mas eu não concordo. Ficamos discutindo se as coligações serão verticais, horizontais ou obliquas. Em cada Estado vai haver um jogo. Estamos vivendo um tempo dos cartórios do tempo na tevê. Muitos partidos não acabaram por causa desse cartório. Isso tem deturpado o processo, como a falta de clareza em relação às contribuições de campanha. Isso é outra coisa mal resolvida no País.

ISTOÉ – O sr. não se desincompatibilizou e não pode disputar nenhum cargo. O que vai fazer?
Lerner –
Nunca precisei de um cargo ou mandato para expor os assuntos que conheço bem. Na área da cidade, do meio ambiente, da questão social, sempre me manifestei e tive um espaço importante. Para ter proposta para o País não é necessário ser candidato. Meu Estado está vivendo a melhor fase de sua história e eu, da minha vida. Faço as coisas com alegria, com gosto. Vou exercer o governo até o último minuto. Depois é depois. Na vida pública você acumula qualificação. Eu quero dizer que foi um período extremamente importante na minha vida: ser governador, prefeito, é uma coisa que faço com muita alegria.

ISTOÉ – E um mandato de senador?
Lerner –
Não é o que faz minha alegria.

ISTOÉ – E no Paraná como está a situação?
Lerner –
Temos uma aliança de cinco partidos. Eles fazem a base do governo. Quem vai ser candidato? Aquele que tiver apoio dessa base e mais densidade eleitoral. Acredito que alguém com essa base partidária tenha muita chance de se eleger. Quero me dedicar muito este ano a projetos culturais, que são fundamentais para o País e não apenas para o Paraná. O primeiro é a recuperação de todos os cinemas e teatros do Estado. O segundo é o Museu de Arte do Paraná, o maior do País, com 36 mil m2 e projeto de Oscar Niemeyer. O terceiro é o Parque da Ciência, que vamos terminar em setembro e será o nosso La Villete caboclo, onde pretendo associar professores de ciência, pesquisadores de todo o País em projetos que abram oportunidades para crianças de todas as idades.