26/07/2002 - 10:00
A crise que dia a dia deixa os argentinos mais pobres não supera o sofrimento enfrentado no período 1976-1983, os inesquecíveis anos de chumbo da ditadura militar. Contada hoje, a história ainda arrepia, desespera, revolta, humilha. É essa Argentina da tortura assassina que o escritor americano Lawrence Thornton, 65 anos – comparado pelo jornal The New York Times a Jorge Luis Borges e a Gabriel García Márquez –, descreve no romance Imaginando a
Argentina (Editora Best Seller, 254 págs., R$ 26,90). Trata-se de uma história de muito amor, interrompida pela truculência dos ditadores. Numa época em que milhares de pessoas foram presas e torturadas, o personagem Martin Benn conta o drama vivido pelo autor de peças infantis Carlos Rueda depois do desaparecimento de sua mulher, a jornalista Cecília Rueda, raptada pela junta militar após escrever um artigo sobre um sequestro de jovens estudantes que promoveram agitações para a redução das tarifas de ônibus.
Quando Cecília desaparece, Rueda subitamente descobre que é capaz de ter claras visões do destino dos desaparecidos. São visões terríveis e detalhadas de homens que tiveram a língua e os órgãos genitais extirpados com choques elétricos e de mulheres estupradas seguidas vezes entre uma sessão e outra de tortura. Em poucos casos, Rueda consegue dizer que o desaparecido está vivo. Na maioria, confirma a tragédia inaceitável pela família. Seus poderes mediúnicos, porém, não funcionam na busca desesperada de Cecília, a sua amada. É um livro extraordinário, elogiado pelos críticos dos principais jornais americanos. Tão bom que está virando filme. Na tela, Imaginando a Argentina, co-produção de Espanha e Inglaterra, pode enfim proporcionar um suspiro: Antonio Banderas viverá o dramaturgo Carlos Rueda. Ele já está em Buenos Aires. As mulheres argentinas merecem o presente. No lar espiritual do machismo, escreve Thornton, a única resistência substancial partiu das mulheres.