03/04/2002 - 10:00
Com mais de três dezenas de vistos no passaporte, foi no interior do Amapá que o fotógrafo italiano Giuseppe Bizzarri, 43 anos, aumentou sua coleção de experiências inesquecíveis. Como um pai de primeira viagem, esperou ansiosamente por 15 dias o nascimento de Carlos Brito Júnior, que veio ao mundo pelas mãos experientes de Maria de Nazaré Ribeiro. O garoto é o quinto filho da dona-de-casa Gesilene Gomes, 27 anos, moradora de Laranjal do Jari, uma pequena cidade de palafitas. “O menino não nascia e eu tinha medo de perder o parto. Afinal, ninguém sabe o momento certo. No hotelzinho onde fiquei pensavam até que o bebê era meu”, diverte-se ele. Solteiro e sem filhos, Bizzarri nunca tinha presenciado um nascimento. “Fiquei emocionado”, confessa ele. Bizzarri se enfronhou pelos povoados ribeirinhos do rio Amazonas para registrar a lida das parteiras –mulheres de obra quase invisível, que passam a vida “puxando menino” em regiões onde nem se ouve falar de médicos. O resultado de seu trabalho pode ser apreciado na exposição Buchudas – parteiras do Amapá, realizada até 7 de abril no Sesc Pompéia, em São Paulo. O espaço foi ambientado para dar a idéia de um útero, com a reprodução de sons de partos e da pequena Laranjal do Jari como trilha sonora.
“O propósito da mostra é trazer aos grandes centros urbanos um Brasil distante e desconhecido”, afirma o fotógrafo, que mora há oito anos em São Paulo. A iniciativa de documentar o dia-a-dia de Gesilene e Maria nasceu de um convite do governo do Amapá para conhecer o Projeto de Resgate e Valorização das Parteiras Tradicionais. Desenvolvida na região desde 1995, a ação capacita a mão-de-obra espontânea e tradicional dessas mulheres que, segundo o governo do Estado, trazem ao mundo 18% das crianças nascidas no Brasil. Estima-se que elas componham um exército de 40 mil nas regiões Norte e Nordeste do País. Em sete anos, o projeto cadastrou 1.373 delas, reconhecendo sua importância social na prática do parto humanizado e garantindo a quase todas uma renda mensal de meio salário mínimo.
Mulheres como Maria, que tinha 13 anos quando fez o primeiro parto, estão sempre à disposição. Não cobram nada e não conhecem empecilhos para chegar às suas parturientes. Andam, remam e cavalgam por quilômetros para cuidar das mães e dos bebês com métodos passados
de geração em geração e, muitas vezes, não aprovados pela medicina oficial. “Elas massageiam a barriga para aliviar as dores e mexem no bebê para posicioná-lo”, conta o fotógrafo. As parteiras são figuras muito respeitadas e amadas em regiões onde a maternidade começa cedo.
“O instinto, o tato e as rezas são o seu arsenal. Tudo roda entre ação
e fé. A tranquilidade com que cuidam de suas buchudas impressiona”, descreve Bizzarri.