Se existe um autor que definitivamente não se incomoda em ostentar a imagem estereotipada do amante latino – aquele que enlouquece as mulheres com uma performance de atleta sexual e uma capacidade inesgotável de realizar as fantasias mais desenfreadas –, este autor é, com certeza, o cubano Pedro Juan Gutiérrez. Seu mais recente livro, Animal tropical (Companhia das Letras, 344 págs., R$ 32), é um dos exemplos de como a pornografia em estado bruto pode ser mais uma arma de contestação ao regime da ilha de Fidel Castro. Uma arma incômoda por mexer num ponto muito frágil do sistema: a total incapacidade de controlar a prostituição no país.

Ao longo das partes que formam o que se apresenta como um romance autobiográfico, no qual o próprio escritor assume cabotinamente o papel do personagem principal – o animal tropical do título –, o leitor vai ver uma das mais escancaradas propagandas sobre o potencial do macho cubano como ferramenta de subversão. Primeiro, com os detalhes de sua relação violenta e viciada com uma mulata cor de canela. Depois, o autor aproveita para esfregar sua superioridade sensual na cara da sociedade oposta à que o gerou, a sueca, e com a qual convive por dois meses como amante de uma moça reprimida e fiel a todas as convenções sociais de um país certinho e depressivo.

Neste capítulo, Gutiérrez deixa bem claro que fugir não é a solução. Não há lugar para o tal animal no mundo organizado e frio que o acolheu. E volta para Cuba, após perverter todos os dogmas de sua loira desacorçoada. Volta, claro, para sua mulata, sua mulher fogosa, seu estereótipo sonhado, sem que na verdade isso tenha deixado de ser uma possibilidade em qualquer momento do livro. Gutiérrez ainda afirma a um jornalista brasileiro não ter “motivo algum para ser amável, nem para fazer concessões”. Só para curtir a ressaca de uma vida movida a rum, sem sentido nem esperanças.