14/10/2009 - 10:00
"Ele era um bon vivant, construiu um palácio monumental só para conquistar mulheres e entreter as autoridades da época com grandes festas", diz a arqueóloga francesa Françoise Villedieu, responsável pela recente descoberta de uma mesa giratória instalada em um dos 300 cômodos do Palácio Dourado de Nero, o imperador que marcou a história de Roma de outubro de 54 até a sua morte, em junho de 68.
O achado é mais uma peça do mosaico histórico que tenta reconstruir a personalidade de um dos maiores mitos da Antiguidade. "O tamanho do seu poder pode ser medido pela suntuosidade de tudo que lhe cercava", diz Françoise.
De fato, Nero era muito extravagante e um notável oportunista. Foi a partir de um incêndio que o imperador se apropriou de uma área de um quilômetro quadrado, no melhor ponto de Roma, para nela construir o palácio que estaria à altura de seus delírios.
As paredes eram de mármore, cobertas por pinturas, ouro e madrepérola. Nos jardins, havia um lago artificial, em cujas margens mulheres da aristocracia se prostituíam, segundo os cronistas romanos. Para completar, uma estátua com 45 metros de altura retratava o próprio imperador, nu. "Mais uma vez fomos surpreendidos.
O mecanismo usado na mesa giratória que descobrimos coloca Nero novamente à frente de seu tempo. Em suas biografias, muitos afirmam que ele não media esforços para impressionar as mulheres. Comprovamos isso", afirma a pesquisadora. Na última semana, graças ao resgate de mais um pedaço da história romana, pesquisadores de todo o mundo conheceram novos detalhes da luxúria que imperava nas suntuosas salas do Palácio Dourado do imperador.
Enquanto belas mulheres desfilavam pela sala principal do palácio, uma mesa giratória, com diâmetro superior a 16 metros, repousava sobre um pilar de quatro metros de largura. Quatro mecanismos esféricos, que provavelmente utilizavam a energia da água corrente, faziam girar a estrutura.
"Para entender a história, precisamos juntar mais essa peça a relatos já conhecidos", diz a arqueóloga francesa. O quadro revela uma mente inquieta, de um homem que temia a monotonia e que usava a criatividade para ter grandes invenções à sua volta.
Tal afirmação é confirmada na biografia de Nero escrita pelo historiador latino Suetônio, que teria vivido em Roma entre os anos 70 e 160. Segundo ele, a mesa da sala de jantar girava "dia e noite, acompanhando o ritmo do céu".
Sobre ela, peras, romãs e uvas eram oferecidas às convidadas do imperador, sempre acompanhadas de carne de carneiro embalsamado em vinho. Depois, essas mulheres fantasiavam-se para participar de jogos amorosos com Nero e as demais autoridades. "Isso não se compara a nada que conheçamos da arquitetura romana antiga. Ele se superava constantemente", diz Françoise.
JOGOS AMOROSOS Biografias de Nero relatam construções erguidas apenas para agradar às mulheres
Acima da mesa giratória, um mecanismo engenhoso, movimentado por escravos, fazia com que o teto da cúpula girasse como os céus da astronomia antiga, ao mesmo tempo que perfumes e pétalas de rosa eram lançados sobre os comensais. Suetônio ainda revela que o mecanismo giratório encontrado pela arqueóloga era parte de um ambiente minuciosamente criado para que Nero seduzisse novas amantes.
Com uma dose a mais de luxúria ou não, é certo que as extravagâncias arquitetônicas do imperador, alçado ao poder com apenas 16 anos, se transformaram em um de seus mais importantes legados. Além de ser o pai da mesa giratória, Nero ainda criou outros mecanismos engenhosos.
As duas salas de jantar de seu palácio localizavam-se em um pátio octogonal, tendo como teto uma cúpula que permitia a entrada natural de luminosidade, solução depois usada em outras grandes edificações. Outro atrativo especial, criado para agradar aos olhos das suas amantes, foram os mosaicos reproduzindo belas formas e desenhos. "Iremos escavar por mais dois meses e podemos esperar novas descobertas. O tempo não foi capaz de apagar a história única do império de Nero", diz Françoise.