Favorito nas prévias eleitorais do PMDB, marcadas para o dia 19, o ex-governador Anthony Garotinho entrou em estado de alerta. No Carnaval, reuniu-se com seu adversário, Germano Rigotto, governador licenciado do Rio Grande do Sul, para firmar um pacto em que o derrotado na consulta às bases do partido apoiará o vencedor. Para isso, no entanto, tem de haver a consulta – e brigar por ela é o primeiro compromisso dos dois concorrentes. “Não aceitamos esse golpe”, reage Garotinho a respeito da manobra da cúpula, que anunciou a intenção de recorrer à Justiça para impedir a escolha pelos filiados. Enquanto monta essa operação, ele trata de desfiar argumentos que mostram o crescimento do PMDB nas eleições em que teve candidato próprio e seu emagrecimento quando abriu mão deste privilégio. Bate duro, é claro, nos adversários de fora, como o presidente Lula e os tucanos Geraldo Alckmin e José Serra. Foi um Garotinho bastante afiado quem recebeu ISTOÉ na semana passada para a entrevista que está nas próximas páginas:

ISTOÉ – Líderes do PMDB intencionam ir à Justiça contra as prévias no partido. O sr. gosta dessa idéia?
Anthony Garotinho

Não há como gostar. É uma tentativa de golpe, sem dúvida. A prévia foi estabelecida em convenção e regulamentada pela Executiva Nacional. Todos participaram de tudo, inclusive os governistas. Não dá para mudar as coisas assim, de uma hora para outra, como se fazia antigamente, num acerto de caciques que os índios têm de cumprir O verdadeiro motivo que os move é a vontade de entregar o partido ao PT.
 

ISTOÉ – O sr. esteve com o governador Germano Rigotto (também inscrito nas prévias) durante o Carnaval. Trataram desse tema?
Anthony Garotinho

Estabelecemos alguns pontos em comum. Nós dois estaremos juntos em qualquer situação. Se eu ganhar as prévias, ele me apóia. E vice-versa. Mas para isso tem de ser mantido o princípio da candidatura própria do PMDB. Nós dois vamos continuar mobilizados para evitar o esvaziamento das prévias, que é a estratégia dos governistas. Na segunda-feira 6, vamos pedir à direção nacional que mobilize uma estrutura jurídica para garantir uma reação nossa caso os governistas tentem qualquer ação na Justiça. Por fim, acertamos que, após a vitória de um ou de outro, vamos lutar para manter o partido unido.

ISTOÉ – Qual vai ser o centro do seu discurso de campanha?
Anthony Garotinho

Sou um apaixonado pelo meu país. Não me conformo em ver uma nação tão rica com um povo tão pobre. Não suporto o crescimento medíocre que estamos vivendo há duas décadas. Primeiro, a década da inflação; depois, a dos juros. Não suporto ver a injustiça social e a concentração de renda aumentando a cada ano. Se eu fosse como a elite e tivesse os olhos fechados para essa realidade, poderia estar preocupado apenas com o cargo. Mas não estou. Tanto que reuni minha família e tomei uma decisão: nessas eleições, só serei candidato a presidente. Se perder as prévias, não vou disputar nada, nem o Senado, nem a Câmara, como querem alguns amigos. Quero fazer o povo brasileiro compreender o quanto vem sendo enganado nos últimos 12 anos pelo PSDB e pelo PT, com uma política econômica covarde. Existe um outro caminho.
 

ISTOÉ – Mas o PMDB apoiou o último governo e faz parte do atual.
Anthony Garotinho

Dois erros. Ao apoiar o governo Fernando Henrique, o PMDB teve um desvio no curso de sua história. Mas o PMDB também fez uma autocrítica ao decidir, agora, lançar candidato próprio a presidente, ao tomar essa decisão ouvindo suas bases e ao convidar o professor Carlos Lessa (ex-presidente do BNDES no governo Lula) para coordenar esse novo programa de governo. O PMDB com que sonhamos agora recupera sua vocação popular, nacionalista e desenvolvimentista.

ISTOÉ – O sr. foi um franco-atirador na campanha de 2002. Pretende ser outra vez?
Anthony Garotinho

 Eu nunca fui franco-atirador. Não fui na outra nem pretendo ser nessa. Tive 15 milhões de votos, o que representa uma parcela expressiva dos brasileiros. Sou um candidato que tem princípios, valores e traz uma proposta objetiva de mudança para o Brasil. Meu comportamento na eleição está definido: vou ser um espectador da hipocrisia. O PSDB vai dizer ao PT: vocês compraram votos no mensalão. E o PT vai dizer ao PSDB: vocês compraram votos na reeleição. E eu vou dizer: os dois têm razão.

ISTOÉ – Ter sido secretário de Segurança Pública do Rio, Estado associado à violência, pode atrapalhar?
Anthony Garotinho

O Rio não tem uma rebelião de presídios há dois anos. De Febem, há três. No ano passado, registramos dois seqüestros, ambos resolvidos em menos de 24 horas. O Rio teve 22% de redução no roubo de cargas. De 1999 para cá, diminuímos em 70% os assaltos a bancos.

ISTOÉ – Mas o Rio que aparece é bem outro.
Anthony Garotinho

 O Rio tem é uma ocupação urbana feita de forma irresponsável pelos gestores municipais, criando na cidade uma situação diferente da dos demais Estados. Em Brasília, os pobres foram empurrados para as cidades-satélites. Em São Paulo, colocados longe dos Jardins. No Rio, temos o confronto visual de uma população muito rica ao lado de uma população muito pobre. Fazer a segurança de uma cidade assim é algo dificílimo. Mas todos os principais líderes do trafico no Rio morreram ou foram presos. Nos últimos seis anos e meio, foram retiradas 100 mil armas das mãos de criminosos.
 

ISTOÉ – E por que a sensação de insegurança continua?
Anthony Garotinho

Por causa da proximidade que os conflitos urbanos têm das pessoas que formam opinião, dos meios de comunicação. Essas coisas acontecem também em São Paulo, em Pernambuco, em outros Estados.
 

ISTOÉ – O tráfico de drogas e armas não é mais grave no Rio?
Anthony Garotinho

Os números dizem que não.
 

ISTOÉ – No que o sr. é melhor do que seus adversários Lula, Serra, Alckmin?
Anthony Garotinho

O meu programa de governo é melhor. Essa eleição não será um concurso de beleza ou simpatia. Os programas de Lula, Serra e Alckmin favorecem os banqueiros. O meu favorece o povo brasileiro. O PT tem a exata compreensão de que essa eleição vai ter três nomes fortes para as duas vagas no segundo turno: o nome do PMDB, o do PT e o do PSDB. Nós vamos chegar a uma disputa final com o PSDB. O PT sabe disso.
 

ISTOÉ – Lula não vai para o segundo turno, é no que o sr. acredita?
Anthony Garotinho

Não está garantido que ele vá. O Lula conseguiu desmoralizar a honestidade. Ele queria ser o símbolo da honestidade, enquanto o PT tinha uma imagem que parecia imaculada. Quando o PT foi pego em adultério, não teve sequer a preocupação de tentar pelo menos disfarçar. Lula procurou atribuir a prostituição do PT à prostituição dos outros. E mais grave: há, agora, um tipo de criminoso, que é o amigo do presidente. A Polícia Federal investigou a Daslu e pediu a prisão de sua proprietária. Mas a lei que valeu para ela não valeu para o Delúbio [Soares, ex-tesoureiro do PT]. Ele confessou diante de uma CPI: “Eu fiz caixa 2, o PT fez caixa 2.” E Delúbio não está atrás das grades. Assim, parece que há dois tipos de criminosos: os passíveis de punição e os amigos do presidente.

ISTOÉ – Mas o presidente está em alta nas pesquisas, à frente de todos os seus adversários.
Anthony Garotinho

Ele está sozinho em campanha, sem contraditório. Nenhum presidente da República apareceu tantas vezes, seguidamente, em horário nobre de tevê, discursando para o Brasil. Lula é um presidente midiático. Ele governa o Brasil pelo Jornal Nacional. Quando começar o horário eleitoral, isso vai acabar. Eleição não é novela das sete.
 

ISTOÉ – Quem vai ser o candidato tucano: Serra ou Alckmin?
Anthony Garotinho

Não sei, e não importa. Sendo tucano, vai defender o modelo neoliberal. Sou o contrário deles.

ISTOÉ – O sr. disse recentemente que o PSDB não trata o governador Alckmin como deveria. Por quê?
Anthony Garotinho

Pela história que o governador tem dentro do partido, pelo seu compromisso com a legenda. Alckmin não merecia ser tratado como está sendo. Estão preparando a sua fritura.
 

ISTOÉ – O ex-presidente FHC acha que o sr. é talhado para bater forte em Lula na campanha. É isso mesmo?
Anthony Garotinho

Vou bater forte em Lula. Mas também no PSDB. Só vou me referir a eles como PT-canos, petistas com alma de tucanos. São iguais.
 

ISTOÉ – O sr. é o candidato dos evangélicos?
Anthony Garotinho

 Eu sou evangélico, mas não vou governar para os evangélicos. Eu, por acaso, governei para os evangélicos no Rio? No governo Rosinha (Matheus, sua mulher), eu era o único secretário evangélico. Não separo o voto de um evangélico do de um católico.
 

ISTOÉ – Como o sr. vê o possível apoio do presidente Lula ao senador Marcelo Crivella, da Igreja Universal, ao governo do Rio?
Anthony Garotinho

O pragmatismo do PT tem levado o PL a cometer barbaridades. Na eleição passada, o PL do bispo (ex-deputado Carlos) Rodrigues apoiou Lula. Agora, uma coisa é a decisão de cúpula das igrejas, outra é a dos evangélicos.

ISTOÉ – O ex-governador Orestes Quércia disse que vai “sentar o sarrafo” no Garotinho para impedir sua vitória nas prévias. Tem revide?
Anthony Garotinho

Não entendi bem o que ele quis dizer, deve ter falado num momento de emoção. Meus adversários são o PSDB e o PT. Os PT-canos, que fazem essa política que beneficia o sistema financeiro. Vou vencer as prévias e conto com o apoio de Quércia e do PMDB paulista.
 

ISTOÉ – Não lhe falta história no partido?
Anthony Garotinho

A fidelidade não se mede pelo tempo que se está num partido, mas se, nesse tempo, você foi fiel ou infiel. Estou há quase três anos no PMDB e sempre cumpri todas as decisões da direção.
 

ISTOÉ – Não lhe falta história no partido?
Anthony Garotinho

A fidelidade não se mede pelo tempo que se está num partido, mas se, nesse tempo, você foi fiel ou infiel. Estou há quase três anos no PMDB e sempre cumpri todas as decisões da direção.
 

ISTOÉ – Em que o sr. é melhor do que o governador Rigotto?
Anthony Garotinho

Me considero mais competitivo. Puxo votos. Quando o partido disputou sua última eleição presidencial com candidato próprio, há doze anos, o PMDB elegeu 107 deputados federais. Na última eleição, indicando o vice de Serra, elegeu 74. Se eu tiver os mesmos 15 milhões de votos da eleição passada, já entramos com 100 deputados federais eleitos. Essa é a diferença.