12/04/2006 - 10:00
A crise da Varig acentuou-se na semana passada. Com pouco dinheiro em caixa para pagar as despesas aeroportuárias e com combustíveis, a maior companhia aérea do Brasil foi buscar ajuda no Palácio do Planalto para continuar em operação. O presidente da companhia, Marcelo William Bottini, solicitou audiência ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Num apelo dramático, teria escrito em seu pedido que a Varig corre o “risco de parar nas próximas horas”. Bottini não confirmou em público os termos utilizados, mas reconheceu que “o caixa está bastante limitado” e a companhia precisa de um aporte de capital urgente. “É necessário que haja investimento na companhia e isso tem que acontecer o mais rapidamente possível”, afirmou. O executivo não foi recebido por Lula e o problema foi encaminhado à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.
Seria apenas mais um capítulo na arrastada novela da Varig, não fosse a gravidade da situação e a frieza com que Bottini foi recebido pelo governo. A empresa está em processo de recuperação judicial desde o ano passado e agora tenta obter um empréstimo emergencial do BNDES para saldar as dívidas com a Infraero e a BR Distribuidora – credores que, no limite, poderiam impedir a decolagem dos aviões da Varig. Em vez de palavras de apoio, Bottini ouviu declarações pouco animadoras e através da imprensa. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, lavou as mãos: “Se a Varig está pensando em dinheiro do BNDES, tem de se dirigir ao BNDES, e não ao Ministério da Fazenda. Não é de minha competência.” De seu lado, o presidente do BNDES, Demian Fiocca, insistiu que o banco “trata todas as operações de maneira técnica”. Em outras palavras, é pouco provável que a Varig – cujo passivo supera R$ 7 bilhões – obtenha recursos oficiais para ganhar um sobrevôo operacional.
A crise já afeta passageiros no Brasil e no Exterior. Somente 54 das 71 aeronaves da empresa estão em operação e muitos vôos têm sido cancelados. Em janeiro e fevereiro, um em cada dez vôos internacionais programados pela Varig não foi realizado. Enquanto tenta obter apoio do governo, o presidente da Varig nega a possibilidade do apagão aéreo. “Já se fala do risco de a empresa parar há dez anos. Mas garanto que não há essa possibilidade”, afirma Bottini. Até os funcionários têm de ser convencidos do contrário. Em e-mail enviado pelo presidente aos empregados, na quarta-feira 5, ele escreveu que “as operações da Varig permanecem inalteradas. Todos devem cumprir rigorosamente suas escalas e atividades de trabalho”. É curioso. Em qualquer empresa, em tempos de normalidade, um aviso de que se deve trabalhar normalmente não tem razão de ser.
O setor aéreo é considerado estratégico em qualquer país e, quando a situação aperta, os governos evitam o caos e entram com recursos – como aconteceu nos Estados Unidos após os ataques de 11 de setembro de 2001. No caso do Brasil, até a quinta-feira 6 a Varig não tinha conseguido convencer o governo de que merece ajuda oficial para enfrentar as dificuldades, em parte causadas por congelamentos de preços em planos econômicos no passado. Ao contrário, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) convocou as concorrentes – Gol, TAM, BRA e Ocean Air – para traçar um plano de emergência que acomode passageiros do mercado doméstico em caso de colapso da Varig. É prudente. Em fevereiro, a empresa operou 19% do total de vôos domésticos.
Quanto às rotas internacionais, a solução seria mais difícil no curto prazo. “Os vôos internacionais requerem know how e acordos bilaterais. A Varig é a única empresa brasileira que tem direito de pousar em 26 aeroportos externos”, afirma Celso Classic, comissário da Varig há 26 anos e presidente da Federação dos Aeroviários. Gabriela Baggio, presidente do Sindicato Nacional dos Aeroviários, também usa este argumento em defesa de uma solução com ajuda oficial. “Se a Varig parar, será um desastre, sobretudo para os vôos internacionais. Não há nenhuma empresa no País que opere 75% dessas linhas, como a Varig”, diz. Se o pior acontecer, o Brasil poderia ser obrigado a abrir esse mercado às empresas internacionais. “O custo social e político seria muito alto para o governo não ajudar a empresa nesse momento crítico”, pressiona Gabriela.
A verdade é que não há solução à vista. Os credores da Varig movimentam-se para tentar atrair novos investidores. Na quarta-feira, eles aprovaram a constituição de um Fundo de Investimento e Participações, que irá concentrar as ações em poder da Fundação Rubem Berta e buscará novos sócios. O fundo será gerido pelo Banco Brascan. Uma proposta de injeção de US$ 350 milhões, feita na véspera pela ex-subsidiária VarigLog, foi mal recebida pelos credores, entre eles o Aerus, fundo de pensão dos funcionários. Não era para menos. Pela proposta, a Varig seria dividida em duas – a parte podre e a parte boa – e os novos investidores ficariam com a saudável. Cinco mil funcionários seriam demitidos e a frota seria reduzida.
No vermelho – R$ 778 milhões foi o prejuízo da Varig até 30 de setembro de 2005. Naquela data, o patrimônio líquido da empresa estava negativo em R$ 7,2 bilhões
Mercado em queda – A participação da Varig nos vôos nacionais caiu de 29,8% em janeiro para 19,3% em fevereiro. Nos internacionais, caiu de 79,9% para 71,5%