12/04/2006 - 10:00
No amplo salão de um hotel carioca, o coreógrafo Celso Nunes reorganiza o mapa do Brasil. “Mato Grosso mais para a direita, Minas Gerais no lado esquerdo, Rondônia no centro.” A estranha geografia é guiada por fitas coladas no chão, onde ele posiciona cada unidade da federação – na verdade, as 27 candidatas do concurso Miss Brasil 2006. Na dura preparação para a 52ª edição da festa, que neste sábado 8 escolhe a vencedora, as meninas esqueceram sua identidade. Eram tratadas e tratavam-se pelo nome do Estado natal. Um esforço imenso para dar formas e conteúdo modernos ao concurso que emocionava o País entre os anos 50 e 70, deu luz à beleza de personalidades como Martha Rocha e Vera Fischer, mas, de lá para cá, perdeu espaço e parte da força para lançar novos talentos. Ele se modernizou. A Canção das misses agora é tocada em ritmo tecno, os maiôs Catalina foram substituídos por vestidos e biquínis ousados e O pequeno príncipe não é mais o livro de cabeceira. Mas uma coisa não mudou: as moças, com raríssimas exceções, ainda se agarram e apostam no evento como trampolim para atingir a luz dos holofotes na profissão de modelo. Buscam nele a porta para o sucesso que não conseguiram encontrar nas novas e concorridas plataformas de lançamento das agências de modelo e dos big brothers da vida.
Carla Rocha, 21 anos, Miss Ceará, que antes de representar seu Estado era assistente de palco de um programa regional de tevê, o João Inácio Show, traduz o sonho de todas: “Agora é a minha vez de ser famosa.” O perfil das misses não faz mais o estilo bonequinha ingênua. Nenhuma delas considera a virgindade uma condição importante. Até mesmo em relação a drogas é possível colher opiniões mais ousadas. “Vivemos numa democracia e cada um faz o que quer”, diz sobre o tema a Miss Espírito Santo, Livia Pratissoli, uma bela jovem de 19 anos que cursa geografia. “Mas não acho o melhor caminho”, ressalva. Pelo menos sete das concorrentes nunca assistiram a um Miss Brasil. “Achava brega”, confessa Tatiane Bezerra, a representante de Alagoas.
Em outros pontos, as misses não mudaram muito. Poucas acompanham a política de perto e, de maneira geral, o gosto literário continua padronizado. O best seller entre elas é O monge e o executivo, o auto-ajuda da moda. Há quem leia Dan Brown, o do Código Da Vinci, ou Luis Fernando Verissimo, mas o segundo lugar da lista de todas é a Bíblia – e não há discussão. “Me inspiro em Ester, a mulher que saiu de uma pequena vila e ficou conhecida por sua beleza, mas nunca esqueceu de Deus”, explica Rhaissa Olmedo, Miss Mato Grosso do Sul, 18 anos.
O grupo é tão heterogêneo como o Brasil. E a diversidade de tipos físicos é grande. Rayana Carvalho, Miss Pernambuco, não via a menor chance de conquistar o título por causa da baixa estatura: 1,68 m. “Passar por isso é divertido, mas a rotina de Miss Brasil deve ser muito chata, com tantos compromissos”, afirma. Outra que antes de subir ao palco já se dava por satisfeita é Patrícia Trindade, 22 anos, do Amapá, uma das poucas candidatas vindas de classe desfavorecida. Vendia farinha nas ruas de Macapá e sua mãe é agricultora. “Estar aqui já é um sonho”, admite ela, que ganhou no grupo o apelido de Calypso graças à sua imitação fiel da
dancinha coreografada do grupo paraense que faz muito sucesso entre os jovens
do Norte e do Nordeste.
Mas algumas se prepararam pesado para chegar ao título. Foi assim com a gaúcha Rafaela Koehler, 19 anos. Nascida num Estado em que o concurso ainda tem grande valor, e onde há escolas de preparação de misses, ela participou de vários concursos do tipo. Ganhou alguns, inclusive o de Rainha das Piscinas, em 2002. Currículos curiosos como esse não faltam. Sileimã Alves, Miss Goiás, 18 anos, por exemplo, ostenta o título de Rainha Nacional do Milho.
Apesar da agenda movimentada, as meninas conseguiram se divertir. Na manhã da terça-feira 4, foram à praia do Pepê, na Barra da Tijuca. Mais tarde, numa sessão de fotos na praia do Arpoador, em Ipanema, as poses protocolares foram desmontadas assim que um surfista passou com sua prancha. “É o Felipe Dylon!”, berrou a Miss São Paulo, Nicole Bernardes. Naquele momento, as 27 moças correram como tietes, para espanto do cantor, que se viu cercado de beldades. “Controlar essas meninas é fácil”, afirma o segurança Ricardo Oliveira, um armário de 1,98 m que conta com a ajuda de um irmão para segurar a turma. “O problema é controlar a mão-boba na hora que os homens pedem para posar ao lado delas.” Haja vigilância.