12/04/2006 - 10:00
Marisa Letícia Lula da Silva queria ficar na Granja do Torto. Ela estava embevecida com o aconchego do casarão e com a sua criação de patos. Mas o presidente Lula queria porque queria deixar a vida campestre. Há três meses ele se convenceu de que existiria uma misteriosa relação astral entre sua vida pública e privada. “O Torto dá azar”, disse Lula à mulher, diante de amigos e ministros. O presidente se convenceu de que seus problemas no governo começaram quando decidiu se mudar para o idílio no Torto, liberando o Palácio da Alvorada para uma grande reforma. No anoitecer da quinta-feira 6, oito dias após a mudança, o presidente Lula abriu os salões do Alvorada para cerca de 80 autoridades e empresários a fim de mostrar o resultado final de R$ 18,4 milhões em obras. Seu desejo era chamar a fina flor da corte, num grande baile de reinauguração que marcaria a retomada do alto astral do governo. Chegou a programar a data – seria na semana em que Antônio Palocci caiu. Mas diante das comparações maldosas com o antológico Baile da Ilha Fiscal, que marcou a queda do império, Lula riscou 150 convidados da lista e optou por uma cerimônia menor – só com discurso, coquetel e tour. “No Brasil, sempre que você faz uma restauração tem um engraçadinho que diz que é melhor usar o dinheiro em outras coisas, como comprar cesta básica”, reclamou Lula em pleno discurso às autoridades. “Se depender de mim, tem muita coisa para ser restaurada neste País.”
Com quase 50 anos, o palácio desenhado por Oscar Niemeyer precisava de restauração profunda. Havia goteiras, mofo e instalações hidráulicas degradadas na ala residencial. Houve uma reforma superficial em 1992, quando Rosane Collor resolveu pintar os puxadores da cozinha de branco porque não gostava da madeira original. FHC chegou a ensaiar a restauração, mas, quando viu o tamanho da conta, voltou atrás. “Imagine o que o PT vai falar de mim!”, justificou na ocasião. Lula foi lá e fez, com dinheiro privado. A Associação Brasileira da Indústria de Base, Abdib, tomou conta das obras e organizou um pool de 20 empresas patrocinadoras, como a Andrade Gutierrez e o Grupo Gerdau. Cada cota ficou em R$ 920 mil. Os mecenas não ganharam sequer incentivos fiscais. Mas curiosamente 16 deles têm algum tipo de interesse no governo, como concessões e obras.