28/01/2004 - 10:00
Lutar contra a balança é, frequentemente, uma tarefa difícil. E lutar contra a epidemia de obesidade que afeta cerca de 300 milhões de adultos no planeta também não está fácil. Na semana passada, o comitê executivo da Organização Mundial da Saúde (OMS) se reuniu em Genebra, Suíça, para discutir, entre outros temas, as diretrizes globais para diminuir a incidência de doenças associadas ao excesso de peso – enfermidades cardiovasculares e a diabete, por exemplo. Entre as recomendações, estão limitar o consumo de açúcar e criar subsídios que possibilitem a redução de preços de alimentos saudáveis.
Mas representantes dos Estados Unidos questionaram o relatório da organização, que apontava para a necessidade de adoção das medidas. Durante a assembléia, William Steiger, chefe da delegação americana, alegou que as recomendações estavam baseadas em estudos incompletos. O resultado: a OMS deu mais tempo para o debate das propostas. As diretrizes globais só devem ser votadas em maio.
Esse movimento contrário já era esperado. No começo de janeiro, Steiger havia enviado uma longa carta para a OMS criticando várias propostas da entidade. Um dos pontos divergentes era o que considerou falta de ênfase na responsabilidade das pessoas. Porém, para a Força Tarefa Internacional de Obesidade, entidade que reúne especialistas do mundo inteiro, os Estados Unidos estão dando mostras de que cederam ao lobby da indústria alimentícia. Em comunicado distribuído no início da semana, o chefe da entidade, Philip James, afirmou que em 1990 a indústria do açúcar, apoiada pelo governo americano, tinha erguido um muro de oposição a propostas similares ao plano da OMS. “Foi um escândalo que agora corre o risco de se repetir”, declarou.
Para o endocrinologista brasileiro Walmir Coutinho, vice-presidente da Federação Latino-Americana de Sociedades de Obesidade, o respaldo da OMS é importante. “Ela não pode regulamentar medidas nos países, mas estimula os governos a adotar estratégias”, diz. Segundo ele, as acusações dos americanos não têm fundamento. “Há evidências científicas acumuladas ao longo de décadas. Eles podem ter retardado o processo, só que a tendência de impor limites é irreversível”, garante. Neville Rigby, diretor de relações públicas da Força Tarefa, que esteve em Genebra, conta que a posição americana ganhou o apoio de diversos países, como Paquistão e Filipinas. “Eles ganharam tempo para negociar propostas. Mas não há como confrontar o embasamento científico. Não se trata de uma pesquisa, mas de vários estudos feitos com investigação exaustiva”, pondera.
Enquanto não se fecha um consenso mundial com o aval da OMS, a indústria se cerca de ações para evitar o rótulo de vilã. Recentemente, a rede Burger King anunciou a oferta de refeições mais leves para os clientes. É o caso, por exemplo, do hambúrguer sem pão. O concorrente McDonald’s, que chegou a ser processado por um grupo de adolescentes obesos, também incrementou o cardápio com itens saudáveis. “Hoje, na maioria dos países, temos muitas opções de salada, iogurtes e até frutas e leite para as crianças”, revelou a ISTOÉ Cathy Kápica, chefe global de nutrição da rede.
Há também mais uma notícia alvissareira. Os promotores da dieta
Atkins, aquela que permitia comer grandes quantidades de gordura, estão recomendando limites no consumo de carne vermelha e de alimentos com gordura saturada. Eles argumentam que o médico Robert Atkins, o criador do regime, sempre orientou a ingestão de outros alimentos, além da carne vermelha. A novidade estaria na forma de expressar essa orientação. Os promotores dizem que agora estão tentando deixar a informação mais clara. Então, tá.