01/03/2006 - 10:00
Vestir-se de Oxum, deusa do candomblé, ou de índio durante a celebração de uma missa é pinto para um padre que resolveu desafiar o conservadorismo da Igreja na terra de todos os santos. Polêmico ou midiático? Não importa a resposta, o padre José Pinto, 58 anos, está longe de se aposentar, como quer a Arquidiocese de Salvador, e continua polemizando. Ele acusa o cardeal primaz, dom Geraldo Majella, que o afastou das funções na paróquia da Lapinha, Salvador, “de ser pouco sensível aos excluídos”. E dispara: “Sou um revolucionário, com bases nos documentos da Igreja, em prol dos pobres, dos negros e dos índios”.
Mas, depois de provocar o alto clero – que quer transferi-lo para o sisudo Convento São Caetano, cheio de regras e horários –, ele desistiu de participar da festa de que mais gosta: o Carnaval. Não vai desfilar no bloco Filhos de Ghandi e não será visto nos disputados camarotes do ministro da Cultura, Gilberto Gil, e da cantora Daniela Mercury. Vai trocar o axé por um retiro mais artístico do que espiritual na Ilha de Itaparica. Na fantasia de artista plástico, tentará desfazer a imagem de religioso folclórico pintando os quadros que faltam para completar sua futura exposição. “Vou evitar as festas para não carnavalizar minha imagem.” Mas há quem duvide de que ele fique fora da folia baiana. Tanto é que o religioso ganhou uma marchinha. “O Padre Pinto é quem mostra bem/Este poder que a alegria tem/Na missa não tem sermão/É tudo celebração/Pois este Pinto não é mole não”, diz os versos do músico Major Nelson.
A repercussão da sua liturgia de vanguarda trouxe da Itália, na segunda-feira 20,
o superior geral da Congregação Vocacionista, Ludovico Cabultto, para resolver
o imbróglio. Padre Pinto minimiza o fato. “Cabultto quer conhecer de perto minha relação com os fiéis” à frente da Lapinha há 30 anos. A chegada do superior
não impediu que batesse duro nos dogmas da Igreja. Ele defende trios elétricos católicos, já que a Praça da Sé é palco, no domingo de Carnaval, de bandas evangélicas, e é favorável à distribuição de garrafas de água e lenços brancos
para os católicos por ocasião da Lavagem do Bonfim. O bem-humorado padre compara dom Geraldo com os ex-cardeais dom Lucas Moreira Neves e dom
Avelar Brandão Vilella, que o ordenou. “Eles tinham uma sensibilidade artística extrema e entendiam o sincretismo. Dom Geraldo foi reducionista. Tem uma
cultura castradora. Não foi capaz de ver com outros olhos o belo trabalho que
é feito na Lapinha”, dispara.