A carioquice é uma arma perigosa. Joaquim Ferreira dos Santos sabe do que está falando. Como carioca, ele evita chiar nos esses, foge da tolice de algumas expressões típicas e, imitando Celly Campello, se mantém branco como a neve ao só ver a praia protegido por um ar condicionado. No entanto, é difícil nestes tempos modernos ler histórias tão saborosamente cariocas como as dele. Jornalista experiente, dono de um dos textos mais brilhantes das teclas nacionais, Joaquim selecionou 39 crônicas de sua autoria, publicadas em jornais e revistas entre 2002 e 2003, e as arrumou no livro O que as mulheres procuram na bolsa (Record, 156 págs., R$ 22). O universo feminino, seus meandros e atitudes incompreensíveis para a maioria masculina domina boa parte das crônicas. Todas escritas num estilo leve, porém recheado de referências divertidas, sarcásticas, inteligentes e até circunscritas, mas que não fazem ninguém se sentir por fora do assunto. Mesmo que não se tenha vivido, como o autor, os primeiros passos das décadas douradas da segunda metade do século XX ou então não se esteja necessariamente em sintonia com certas modernidades que só ganham importância quando Joaquim as cita e as descarta com a maior elegância.

Até para mostrar uma divertida estupefação com o “tiroteio do
palavrório” do morro que desceu para o asfalto, ele constrói um
castelo literário jogando devidamente no calabouço da “preguiça
moderna da fala” toda a promiscuidade verbal. Nem o filho de Marisa Monte que, sabe-se lá por que foi batizado de Mano Wladimir, escapa
de um olhar moderadamente cáustico. Mas é às mulheres, visivelmente
as institucionalizadas musas do autor, que sua pena se mostra mais impiedosa e carinhosa. Sem nenhum ranço de machão abobado ou
de cinquentão em pose de lobo, Joaquim diverte e se diverte com o comportamento, com a sensualidade explícita ou com as expressões ditas por elas, à maneira delas. Não há como não lembrar da ex-namorada,
da amiga, da amiga da amiga. Descontroladas, descabeladas, aflitas, maliciosas, necessárias, para Joaquim Ferreira dos Santos elas sempre serão as eternas giseles, donas do truque perfeito de, nos momentos cruciais, partir numa busca frenética por nada dentro das bolsas.

 

Brasileira, essa muçulmana
Trecho de O que as mulheres procuram na bolsa

Pare de lamentar o destino delas. Ser muçulmana, andar com
aqueles véus todos, é não estar nem aí para o segredo do bumbum durinho da Tiazinha, como anuncia todo mês a capa da Nova. A propósito: você, mulher brasileira, está livre dessa armadilha estética? Já fez seu spinning hoje?… Quem folheia qualquer uma das revistas femininas nas bancas fica com a sensação de que ser brasileira é como incorporar uma muçulmana moderna. Sofre-se pelo avesso – e com duplo sentido, por favor. Era melhor não ter aprendido a ler. As afegãs são talibãs. As brasileiras precisam ser taliboas. Ordem da Nova.