Em cima do muro, os tucanos já não estão há muito tempo. Ao contrário, já afiam o bico para a rinha de 2006, uma das campanhas mais acirradas desde a de 1989, quando o PSDB deu a mão a Lula contra Collor de Mello na reta final. No centro do ringue das disputas de 1994, 1998 e 2002, os dois partidos trocaram sopapos eleitorais. No ano que vem, PT e PSDB prometem travar a mãe de todas as batalhas. Um dos tucanos com posto privilegiado na trincheira da oposição é o líder do PSDB na Câmara dos Deputados, Alberto Goldman (SP), que assumiu essa espinhosa tarefa em fevereiro, apenas quatro meses antes da chegada do furacão Roberto Jefferson, com sua denúncia sobre o mensalão. Goldman tem longa experiência em guerras políticas: começou na trincheira contra a ditadura. É com a firmeza adquirida nos tempos de clandestinidade no Pecebão que Goldman comanda a oposição ao governo Lula dentro da Câmara. Esse engenheiro faz cálculos precisos para construir uma sólida, mas equilibrada oposição: não perde a compostura, nem cai na tentação de fazer críticas irracionais. Diz que o PSDB deve pregar na campanha a “esperança pé no chão”, sem fazer promessas falsas, e afirma que o PT quer criar uma “bolha de euforia” para tentar ganhar a eleição. Escolhido em novembro vice-presidente nacional do PSDB, Goldman também coordena a elaboração do programa de governo do partido para a campanha presidencial. Experiente também no Executivo, Goldman é um dos pré-candidatos tucanos à sucessão do governador Geraldo Alckmin (PSDB). O Estado de São Paulo é o ninho mais rico dos tucanos – segundo orçamento do País, atrás apenas do da União –, conquistado ainda em 1994.

ISTOÉ – O PSDB vai atacar muito o PT na eleição presidencial, que promete ser bem diferente da de 2002, a campanha do Lulinha, Paz e Amor?
Alberto Goldman

É impossível que a gente não debulhe a administração petista, mas o principal é apontar propostas para o futuro. Vai ser uma campanha bastante acirrada. O PT usará todos os meios possíveis e impossíves para se manter no poder. O mote de campanha do PSDB será: “Brasil, este foi um quadriênio perdido.” Vamos criar uma nova esperança, com o pé no chão, falando a verdade. Dizer, por exemplo, que a gente pode aumentar o salário mínimo em 20% em valores reais em quatro anos, nunca em 100%.

ISTOÉ – O PSDB ficou oito anos no poder. O PT pode alegar que ficou só quatro e precisa ter mais quatro para acabar seu projeto.
Alberto Goldman

Se eles ficarem mais quatro anos, acaba mesmo (ri). Eu sempre achei que quatro anos era o preço que a sociedade brasileira pagaria para saber quem é o PT. Oito anos já seria masoquismo.

ISTOÉ – Que esperança o PSDB pode ofecerer ao eleitor, tão desencantado com a política?
Alberto Goldman

Esperança de aproveitar os momentos bons da economia mundial
para diminuir a taxa de juros, fazer uma política voltada para investimento, ter
ousadia na política econômica, não ficar na dependência dos interesses financeiros, gerenciar com pessoas competentes, independentemente de seus partidos, ter a conduta ética como requisito absoluto, tratar o Estado não como se fosse do partido, mas da sociedade. Não vamos vender o paraíso, só prometeremos aquilo que será possível fazer. O PT teve que desmentir sua história para chegar e se manter no poder. Nós não vamos ter que desmentir nossa história. Podemos reproduzi-la sem nenhuma vergonha.

ISTOÉ – Muitos dizem que PT e PSDB no fundo são iguais…
Alberto Goldman

Não vejo nada de igual, nem na economia, nem na conduta ética, nem nos projetos sociais. Vamos mostrar nossas diferenças. Já estamos elaborando um embrião de programa de governo para a campanha presidencial, que estou coordenando.

ISTOÉ – José Serra ou Geraldo Alckmin?
Alberto Goldman

Saberemos no momento adequado, em março.

ISTOÉ – O presidente Lula ainda tem carisma, principalmente com as classes mais baixas. Serra e Alckmin não têm a mesma sintonia com esse setor da sociedade, não?
Alberto Goldman

Lula está desperdiçando e esgotando seu carisma. Serra e Alckmin têm apoios do setor produtivo, da classe média e também dos mais humildes, para quem devem falar a verdade. Olho nos olhos do Lula e não vejo mais o Lula de anos atrás. Só vejo em seus olhos o blá-blá-blá. E o povo começa a ver isso também. As pesquisas mostram isso.

ISTOÉ – Acha que a candidatura à reeleição de Lula pode ser dada como morta, devido às quedas nas pesquisas?
Alberto Goldman

Não. Mas uma coisa concreta é que Lula foi uma das maiores decepções da história brasileira. Eu imaginava problemas como fragilidade administrativa e conflitos ideológicos. Mas não o nível de descomprometimento ético e moral que eles assumiram. A idéia de que pelo poder vale tudo.

ISTOÉ – O sr. acreditou no discurso que o PT fez antes de assumir o poder?
Alberto Goldman

Na economia eu achava que eles não iam chutar o pau da barraca. Na ética, não imaginava que fossem transformar o País numa enorme Ribeirão Preto, numa enorme Santo André, numa enorme São Paulo, apesar dos sintomas que as gestões petistas nessas cidades demonstraram.

ISTOÉ – Mas na questão ética o PSDB tem pontos frágeis também, como a denúncia de caixa 2 que atingiu o senador Eduardo Azeredo (MG).
Alberto Goldman

O Eduardo Azeredo não foi reeleito (a governador de Minas em 1998, quando sua campanha recebeu recursos de Marcos Valério).

ISTOÉ – O PT alega que houve também denúncias de corrupção no governo tucano e várias CPIs arquivadas.
Alberto Goldman

No governo FHC, uma das maiores críticas era com relação ao Proer, o apoio aos bancos. O PT apresentou proposta dessa CPI, que transcorreu com tranqüilidade. Eu era o relator e convoquei o então ministro da Fazenda, Pedro Malan, o então presidente do Banco Central, Armínio Fraga, e toda a sua diretoria. Todos foram depor. Hoje, o PT tem um medo enorme de convocar o ministro Palocci para a CPI (dos Bingos). Não há motivos para esse medo, a não ser que ele tenha culpa no cartório.

ISTOÉ – Mas pesa sobre os tucanos a denúncia de compra de votos para a reeleição no governo FHC.
Alberto Goldman

O PT incluiu essa denúncia agora na CPI do Mensalão e chegaram à conclusão zero. Tanto que encerraram essa CPI.

ISTOÉ – Houve mensalão?
Alberto Goldman

Mensalão tem e vocês vão constatar isso. Pode ser que nem todos recebessem na mesma data mensalmente, mas vários confessaram ter recebido dinheiro, como Roberto Jefferson (PTB), Valdemar da Costa Neto (PL), dos partidos aliados. Talvez não tenha existido mensalão dentro do PT, mas os petistas receberam dinheiro por outras questões.

ISTOÉ – Esse mar de lama vai resultar numa limpeza?
Alberto Goldman

Já deu resultados fantásticos. Ministros e membros de estatais demitidos, presidentes de partidos que foram cassados ou renunciaram. Processos tramitam no Conselho de Ética da Câmara. E o principal foi que todo o lixo emergiu. Ninguém sabe que sociedade os petistas querem fazer, nem eles mesmos. Seu projeto de sociedade virou projeto de poder.

ISTOÉ – O PT acusa a oposição de apelar e cita ameaças como dar surra no presidente, como disse o deputado Arthur Virgílio (PSDB-AM).
Alberto Goldman

Isso são coisas individuais. Não identifica a ação do PSDB. Nós apoiamos emendas constitucionais e projetos do governo, diferentemente do que eles fizeram com a gente no passado.

ISTOÉ – Como vê o embate entre os ministros Antônio Palocci (Fazenda) e Dilma Rousseff (Casa Civil)?
Alberto Goldman

A divergência entre eles não é de interesse público. Os dois estão focados em resultados eleitorais. Ambos pensam em criar uma bolha de euforia. Dilma, que cobra queda da taxa de juros e ampliação dos gastos públicos, verbalizou o que Lula quer. Palocci vende a idéia de que pode criar o mesmo clima de euforia mantendo uma política monetária e fiscal mais restritiva. Mas ambos estão de olho só na eleição.

ISTOÉ – Uma atitude comum entre os políticos como um todo, não?
Alberto Goldman

A diferença é que o PT vendeu e aplicou uma idéia durante esses três anos e agora eles estão sendo obrigados a fazer um ajuste de última hora, que não terá resultados. Nem o plano de Dilma, nem o de Palocci vão criar clima de euforia.

ISTOÉ – Mas o mercado financeiro pelo menos aposta num segundo mandato de Lula.
Alberto Goldman

Lula tem o apoio do mercado financeiro, dos que aumentaram o lucro de forma estúpida nesses três anos, mas certamente não terá do setor produtivo.

ISTOÉ – Mas os petistas podem alegar que FHC também favoreceu os banqueiros…
Alberto Goldman

Só teve altas taxas de juro no governo FHC em momentos de crise internacional, e passamos por várias. No governo Lula não houve uma crise internacional, é um céu de brigadeiro. Vamos ter um crescimento de menos de 3% do PIB. O Brasil cresce menos do que os países em desenvolvimento. É como um cavalo pangaré que corre, mas mais devagar que os outros competidores. Na América Latina, o Brasil só cresce mais do que Haiti, República Dominicana, El Salvador e Guatemala. O governo Lula nunca podia ter deixado a taxa de juros chegar onde chegou.

ISTOÉ – No início, os tucanos aplaudiram a política econômica de Lula e houve até um clima de lua-de-mel…
Alberto Goldman

O governo Lula adotou os princípios básicos do anterior: responsabilidade fiscal, controle monetário, fiscal, da inflação, câmbio flexível. Eles fizeram isso corretamente porque senão haveria um descontrole total. Entre 2003 e 2004, o governo deveria ter seguido uma rota descendente na taxa de juros. Mas a rota foi ascendente. Não há investimento, produção, renda, emprego. O setor produtivo em geral acha o governo Lula um desastre. Não conseguiu fazer o crescimento sustentado. No ano passado disseram que o crescimento do Brasil é de longo prazo e não um vôo de galinha. Mas o que vemos é o vôo do frango.

ISTOÉ – O presidente Lula parece ter o apoio das classes mais pobres, devido a programas como o Bolsa-Família.
Alberto Goldman

Eles contam com a compra de votos via Bolsa-Família, que se tornou apenas um programa assistencial. Dão o peixe, mas não ensinam a pescar. As famílias entram nesse sistema assistencialista sem perspectiva de sair. É quase condenar o cidadão a viver o resto da vida na dependência do Estado. Não há controle da criança na escola, como havia no programa Bolsa-Escola do governo FHC. O nosso governo dava condições para as pessoas aprenderem a pescar.

ISTOÉ – O PSDB governa São Paulo há dez anos. O sr. é um dos pré-candidatos à sucessão do governador Geraldo Alckmin. O que os tucanos poderão apresentar de diferente?
Alberto Goldman

Mário Covas e Geraldo Alckmin implementaram valores éticos, responsabilidade fiscal, uma forma de agir com seriedade que se transformou em um modelo de gestão. Vamos continuar nessa linha, mas ir adiante: fortalecer o papel do Estado que incentiva empreendimentos, melhorar a qualidade da educação, ampliando a ação para o ensino médio e infantil. Vamos dar continuidade sem que seja a mesma coisa. O candidato do PSDB terá apoios decisivos, como os de FHC, Alckmin e Serra. Os pré-candidatos do PSDB são nomes sem mácula (além de Goldman, o ex-ministro Paulo Renato; o secretário municipal de Governo, Aloysio Nunes Ferreira; o líder na Câmara Municipal, José Aníbal; e o Secretário Estadual de Habitação, Emanuel Fernandes). Já os do PT (a ex-prefeita Marta Suplicy e o senador Aloizio Mercadante) estão no meio de um imenso vendaval, são candidaturas baleadas pela crise política. É inevitável fazer ligação dos recursos obtidos pela Direção Nacional do PT para as campanhas deles para o Senado em 2002 e para a prefeitura em 2004.