Por incrível que pareça, a solução para grandes problemas do cotidiano pode estar em uma feira de ciências. A 18ª Mostratec (Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia), realizada este mês em Novo Hamburgo, RS, reuniu centenas de jovens inventores com espírito empreendedor e olhos atentos à realidade. Durante sete dias, estudantes de 11 países apresentaram 142 projetos. A julgar pela qualidade das propostas, ninguém diz que seus autores têm entre 15 e 20 anos. Robôs que fazem o trabalho de vigilância, programas de computador que facilitam o aprendizado e até um alarme que impede o motorista de dormir ao volante foram alguns dos projetos mais criativos.

Organizada pela Fundação Liberato, principal instituição de ensino técnico da região do Vale dos Sinos, no Rio Grande do Sul, a Mostratec é o evento estudantil mais prestigiado da América do Sul. Anualmente, reúne representantes do Brasil e de países como Argentina, Chile e Peru. A competição é dividida em 13 categorias, como eletrônica, mecânica e química. Mas não engloba somente aparatos tecnológicos. Há prêmios para ciências sociais, meio ambiente e saúde. Neste ano, venceram pesquisas de interesse social. A gaúcha Renata Witt, 18 anos, ficou em primeiro lugar com um estudo sobre a distribuição de leite enriquecido com ferro em escolas públicas para amenizar a desnutrição. Já o prêmio de melhor pesquisa em grupo ficou com os paraguaios Willian Bejarano, Derlis Ojeda, Mateo González e Jorge Ortiz. Moradores de Assunção, eles discorreram sobre fontes alternativas de água, em uma tese sobre lençóis freáticos. Receberam patrocínios para participar de outros eventos e passagens para a Isef, a Feira Internacional de Ciência e Engenharia, em Oregon, Estados Unidos.

O problema da água também foi tema do trabalho do peruano César Salvatierra, 16 anos. Ele fez jus ao sobrenome desenvolvendo um projeto de irrigação planejada. “Cerca de 30% da costa do Peru virou deserto. Meu sonho é recuperar áreas com erosão e trazer a população de volta para o campo”, diz. Assim como esta, várias idéias apresentadas na Mostratec têm chances de conquistar o mercado. Um exemplo é o Sistema de Vigilância Remoto, de Gabriel Mineiro e José Ricardo Langiwinski, 18 anos, alunos da Escola Técnica Estadual Monteiro Lobato, de Taquara, RS. Depois de ver um amigo vigilante ficar paralítico ao ser baleado enquanto tentava evitar um assalto, eles criaram um robô-vigia. Dotado de câmera, o protótipo faz a ronda dentro de um banco ou uma loja e envia imagens à empresa de segurança em tempo real. “Funciona como uma extensão dos olhos do vigia, que vê onde está o perigo antes de entrar”, diz Gabriel. O físico Guilherme Breier, orientador do projeto, afirma que já há um supermercado interessado. “Isso prova que, com incentivo à pesquisa, alunos do ensino médio podem virar empreendedores”, diz.

Outro invento que deve ser aproveitado na indústria é o programa Couro & Cor, de Pedro Castagna e Liliane de Almeida, ambos de 18 anos. Alunos da Fundação Liberato, eles passaram dois anos tentando resolver um velho dilema da indústria calçadista: identificar com precisão as diferentes tonalidades do couro. É que, só no Rio Grande do Sul, erros na análise do material acarretam prejuízo de R$ 1 milhão por ano. “Se é para solucionar um problema, que seja um bem grande”, brinca Pedro.

Essa é a mesma opinião de Rafael Weber, 18 anos, Gabriel Lipp, 18, e Joel Gonçalves, 17. Ao saber que 10% das mortes no trânsito são causadas por motoristas que dormiram ao volante, eles criaram o Sistema Anti-Sonolência. É composto por um chip programável e um medidor de frequência cardíaca semelhante aos dos esportistas. “É só colocar o sensor na orelha que ele monitora seus batimentos. Se caírem mais de 10%, o que indica que o usuário vai dormir, soa um alarme”, diz Rafael. O trio espera emplacar o projeto na indústria automotiva. Para quem subestima o potencial de jovens cientistas, o diretor da Fundação Liberato, André Lawisch, lembra: “Foi aqui que surgiu, em 1980, um dos primeiros protótipos da máquina de preencher cheques.”