07/12/2005 - 10:00
A depressão, por si só, já é um sofrimento. Agora, o que a ciência tem descoberto é que ela também pode estar por trás ou agravar ainda mais outras enfermidades. É como se a doença estendesse seus tentáculos sobre vários sistemas do organismo, sabotando funções importantes. Uma das conexões mais evidentes é entre a depressão e os males cardíacos. Muitos estudos dão conta de que pacientes com problemas do coração estão mais vulneráveis a padecer de depressão. E vice-versa. Isso porque, de acordo com as investigações realizadas, a depressão pode afetar o ritmo cardíaco, aumentar a pressão arterial e predispor à formação de coágulos que entopem as artérias.
Além disso, em geral a doença promove uma elevação na produção dos hormônios resultantes do stress (cortisol e adrenalina, por exemplo), que também contribuem para desgastar o coração. Mais. Quando deprimidos, os doentes tendem a relaxar nos cuidados com a saúde. “Muitos perdem a vontade de se cuidar”, afirma o cardiologista Raul Dias, do Instituto do Coração, de São Paulo. E, por sua vez, os portadores de males cardíacos têm mais chance de se deprimir, angustiados com os distúrbios no coração. Fecha-se, assim, um cruel círculo vicioso.
A associação entre a diabete e a depressão também é forte e aparece em diversas pesquisas. De acordo com uma delas, realizada na Universidade de Miami, nos Estados Unidos, a incidência de depressão entre pacientes diabéticos é quatro vezes maior do que na população em geral. A interação entre as duas enfermidades é complexa e envolve fatores ambientais, genéticos e psicológicos. Mas sabe-se que um dos pontos de conexão pode ser a confusão hormonal desencadeada pela depressão. Ela poderia prejudicar a maneira com a qual o organismo produz e aproveita a insulina, o hormônio responsável pela entrada da glicose nas células e que, na diabete, ou não é fabricado ou não é absorvido adequadamente.
Há doenças nas quais a depressão pode aparecer como conseqüência do próprio diagnóstico. Nessa categoria, o câncer é o melhor exemplo. “As crises costumam ocorrer no momento em que os doentes recebem a notícia de que estão com câncer, quando iniciam o tratamento e ao saberem que estão com metástase (células cancerosas que se espalham pelo organismo). São as etapas em que o chão se abre”, conta Zenaide Madeiros, chefe do Departamento de Psiquiatria do Instituto Nacional do Câncer, no Rio de Janeiro. Dos cerca de 240 pacientes que ela recebe por mês, 90% sofrem da forma branda da depressão e 10%, da severa.
Vítimas de dor crônica e de doenças respiratórias que levam a grande dificuldade para respirar também estão mais propensas a desenvolver quadros depressivos. Estudos analisados pelo Centro Multidisciplinar da Dor, no Rio, indicam, por exemplo, que até 87% das pessoas que sofrem de dor crônica apresentam transtornos de humor e que 75% dos pacientes com depressão apresentam dor.
“A melhor forma de compreender os vínculos entre a depressão e demais doenças é lembrar que não dá para separar o cérebro do resto do corpo”, lembra o psiquiatra Teng Chei Tung, do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo. De fato, a ligação não pode ser esquecida. E é também por isso que médicos e pacientes estão cada vez mais atentos para, em muitos casos, não tratar apenas uma doença, mas duas.