Nem Marcelo Boreli acredita. Apontado pela Polícia Federal como o responsável pela gravidez da cantora mexicana Gloria Trevi, dentro da Superintendência da Polícia Federal em Brasília, o assaltante Marcelo Boreli afirma: “Tenho certeza de que não sou o pai.” Preso sozinho na cela 3 do Presídio de Segurança Máxima de Campo Grande (MS), onde guarda no rosto deformado e no corpo as cicatrizes e queimaduras do linchamento que sofreu na carceragem da Polícia Federal, em setembro, Boreli diz que Gloria não engravidou por inseminação artificial, mas como resultado das relações sexuais que tinha com policiais federais. Boreli, que estudou veterinária, contou que em dezembro do ano passado sugeriu a Sergio Andrade, ex-empresário da cantora, também preso no Distrito Federal, que ela escapasse da extradição engravidando. Quatro meses depois, tendo como portador o preso Adail Pereira de Paula, Boreli garante que enviou seu sêmen misturado com leite, num copinho de plástico, até a cela de Gloria. Foram cinco “contribuições” em uma semana. Boreli admite que nunca ouviu nenhum pedido de Gloria ou de Sergio para que enviasse o sêmen e não sabe sequer se ela o inoculou. Acha que não. O que Boreli tem certeza é que Gloria era retirada da cela de noite, duas a três vezes por semana, e todos sabiam que ela tinha relações com policiais. Às 13h15 da quinta-feira 6, no momento em que conversava com ISTOÉ, Boreli, 34 anos, recebeu uma péssima notícia: o resultado do primeiro teste que fez no Laboratório Central de Mato Grosso do Sul atesta que ele é portador do vírus da Aids. Leia trechos da entrevista.

ISTOÉ – Você teve relações sexuais com Gloria Trevi?
Marcelo Boreli – Nunca.

ISTOÉ – Você está sendo apontado como o pai da criança porque disse à Polícia Federal que doou sêmen para uma inseminação artificial. Como surgiu essa idéia?
Boreli – Em dezembro (de 2000), eu estava no pátio e falei com o Sergio Andrade que uma súmula no Supremo dizia que o estrangeiro com filho brasileiro ficava no país. Sugeri uma inseminação. Eu estudei veterinária um ano e vi sendo feito com vaca.

ISTOÉ – Ele achou boa a idéia?
Boreli – Não, ele já achava que seriam extraditados. Quatro meses depois, falando novamente com o Sergio, eu disse que ia doar. Acho que não foi nem usado o que eu passei porque, se a situação dela é complicada, a minha é pior ainda.

ISTOÉ – Em nenhum momento eles disseram que aceitavam a idéia?
Boreli – Nunca.

ISTOÉ – Como você fez?
Boreli – O café é servido às 7h da manhã e vem com um copo descartável. O leite é servido numa vasilha. Eu colocava o leite no copo, esperava esfriar e ia pro banheiro. E colocava o sêmen no leite. Fiz isso cinco vezes. O Adail, o preso que ficava solto, entregava. Se ela usou, eu não sei.

ISTOÉ – Em algum momento você ouviu da Gloria Trevi, do Sergio ou de alguém que o filho era seu, que a inseminação tinha funcionado?
Boreli – Nunca falaram isso.

ISTOÉ – Você acredita que pode ser o pai?
Boreli – Tenho certeza que não sou o pai. Tanto que doei sangue para fazer DNA. No dia em que a criança nascer, quem for suspeito que faça o mesmo. De preso, o filho não é.

ISTOÉ – A Gloria diz que nunca fez inseminação artificial.
Boreli – Ela diz que foi estuprada por policial e eu acredito nela. A Gloria ficou presa junto com a Cristina e a Maria Ilda e elas sabem que na PF de Curitiba acontece isso também. Uma mulher lá, que foi presa junto comigo, estava grávida de dois meses e fez um aborto. E não sabia se o pai era polícia ou preso.

ISTOÉ – A Gloria tinha relações sexuais na carceragem?
Boreli – Com preso ou com policial?

ISTOÉ – Com preso.
Boreli – Preso não tinha como estuprar preso. Homens e mulheres nunca ficam soltos ao mesmo tempo. É impossível.

ISTOÉ – E com policial?
Boreli – Com policial, lógico. A polícia tem o poder de ir lá, abrir a cela, tirar… Um policial chega às 8h da manhã e sai às 5h da tarde. Quando ele vai embora, o outro policial faz a contagem e fica fora da carceragem. Os presos são trancados para receber o jantar às 4h30 e a cela não abre mais. Mas a Gloria e a Maria eram tiradas depois desse horário. A Maria era tirada de dia, depois das 5h. Diziam que era pra estudo de religião. A Gloria era tirada mais tarde, depois das 10h (da noite). Duas, três vezes por semana. Às vezes voltava e eu já tava até dormindo. Falavam que ia no advogado. Só que ninguém tem direito de receber advogado fora de horário. Quando eu cheguei lá, já havia um boato de que a Gloria transava com um tal policial. Isso eu ouvi. Não vou citar nome de ninguém. Isso a carceragem toda sabia.

ISTOÉ – Outros presos eram retirados da cela de noite?
Boreli – Não.

ISTOÉ – Você não sabe se sua idéia da inseminação foi levada adiante, mas a PF comprou a tese. Por quê?
Boreli – Querem tirar o problema de cima deles. A PF me usou como bode expiatório. E tinha interesse em me matar…

ISTOÉ – Como assim?
Boreli

– Ali dentro existe uma máfia de delegados que quer se proteger. Essa gravidez acabou com a imagem da PF. E eles sabem que eu sei muito. No dia 28 (de agosto), eu mandei uma carta pro meu advogado (Júlio Militão) falando da gravidez da Gloria, que ia cair delegado, e a carta foi sequestrada pela PF. No dia 5 (de setembro), o dr. Rômulo (Menezes, ex-chefe da Delegacia Regional Policial) se reuniu com três presos, que fazem parte dos seis que me espancaram no dia 10 (de setembro). As câmeras mostraram tudo e as imagens iam pra sala do Rômulo. Você acha que a Gloria tem tanto medo de falar por quê?