O pernambucano Seu Juca, um dos personagens de Tinta fresca, de Paula Alzugaray e Ricardo van Steen – o melhor documentário nacional em média-metragem da recente edição da Mostra BR de Cinema, que será exibido em São Paulo no Resfest, no sábado 26, e na Mostra do Audiovisual Paulista, na terça-feira 29 –, professa em tom solene que “pintar sua aldeia é tornar-se universal”. Não é possível afirmar se a frase foi adaptada da máxima de Tolstói, já que Seu Juca é um homem simples, que dificilmente teria acesso à obra do escritor russo. Mas uma coisa é certa: a frase sintetiza o objetivo do filme, que é registrar as várias formas de expressão – artísticas ou não – nos espaços urbanos. Durante três anos, a dupla de diretores percorreu as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife colhendo imagens de grafites, pinturas, pichações e simples camadas de tinta, tendo como moldura o concreto dos muros, as fachadas de cinema, carrinhos de vendedores ambulantes, paredes de botecos e até portas de banheiros públicos.

“Nossa idéia não foi classificar essas manifestações populares. Nós apenas registramos essa arte efêmera e mostramos que ela conversa com a arte erudita, de galeria”, explica Paula.

Outras conversas seduzem em Tinta fresca, a
começar pelas histórias curiosas de Seu Juca,
que vive de confeccionar cartazes de bares com
pérolas como “O wisky (sic) é o melhor amigo do homem, é o cão engarrafado”. Ou a do sr. Ling, o
autor das pinturas de filmes do Cine Marabá, no
centro de São Paulo. O diálogo entre anônimos e eruditos acontece ao longo do média-metragem com
o depoimento de artistas plásticos, como Artur Barrio e Marepe. Ainda há espaço para a polêmica, como a discussão sobre a legitimidade das pichações urbanas. Caso do depoimento do pichador Anêmico, que fornece dados para entender um pouco as motivações e a “política territorial” desse universo à margem.