30/11/2005 - 10:00
No início do ano, barbeando-se diante do espelho de um hotel, o cantor canadense Neil Young notou uma mancha em um dos olhos. Foi ao médico e recebeu um diagnóstico assustador: tinha um aneurisma que poderia matá-lo. Com horas de estúdio já marcadas em Nashville, capital da música caipira americana, Young não mudou a agenda. Gravou a maior parte das dez faixas de Prairie wind (Warner Music), foi para a mesa de operação e, já recuperado, terminou o trabalho, um dos seus melhores álbuns nos últimos anos. Dito assim, pode parecer que ele recebera a notícia com indiferença. Mas o susto é patente na maioria das canções, dedicadas ao pai, morto também na ocasião.
Apelidado “avô dos grunges” pela fúria de certos álbuns, Young, 60 anos em setembro, optou neste 31º álbum pela calma e doce sonoridade folk-country de clássicos como Harvest (1972) e Comes a time (1978). Empunhando violão, guitarra e gaita, o canadense repassa a infância em Far from home, que lembra os “bons velhos tempos em família”, quando o pai pegava a guitarra, o tio sentava ao piano e a prima cuidava dos vocais. “Me enterrem na pradaria, onde os búfalos costumam pastar”, canta. Na faixa-título, cortada por metais e a aspereza das cordas de aço, ele recorre à sabedoria paterna e à visão quase mística dos campos perdidos da juventude no Canadá.
O mesmo sentimento paira sobre a balada country This old guitar, atravessada por uma chorosa guitarra slide, homenageando – adivinhem – o seu violão velho de guerra. Apesar dos temas, sempre cantados naquele registro desprotegido que virou sua marca desde a antológica Helpless, da época do hippie Crosby, Stills, Nash & Young, nenhuma canção cai no sentimental. Mesmo quando em Falling off the face of the Earth, Young salta do anasalado para cantar no mais descarado falsete o valor dos momentos simples vividos com a mulher.