Exatamente às 16h30 da terça- feira 26, chovia muito e no horizonte já se descortinava um leve nevoeiro. Depois de 14 dias isolados na plataforma P-18, a 109 quilômetros do continente, 17 funcionários da Petrobras embarcaram no helicóptero Super Puma L2, comemorando o fato de estarem voltando para casa. Já a bordo, estavam dois tripulantes, comandados pelo piloto, Paulo Roberto Calmon – o mais experiente no percurso entre a plataforma e a cidade de Macaé (RJ), ao qual dedicara 20 dos seus 30 anos de vôo. Menos de um minuto depois da decolagem, a 280 metros da P-18, a alegria deu lugar a um drama que duraria quase duas horas. O helicóptero começou a soltar fumaça de uma das turbinas, girou em torno de seu eixo, em sentido horário, e caiu em direção às geladas águas da bacia de Campos. Tudo foi muito rápido. O piloto tentou um pouso forçado no mar e conseguiu acionar os flutuadores, mas o forte impacto na água dividiu o aparelho em duas partes e fez as primeiras vítimas, lançadas para fora da cabine. Dos 20 a bordo, 15 sobreviveram.

Antes de afundar, o aparelho permaneceu cerca de uma hora flutuando, mas adernando à esquerda. Era preciso deixar o helicóptero e enfrentar o mar, o frio e o vento. Ajudados pelo piloto, um a um os sobreviventes iam deixando a cabine parcialmente destruída. Entraram na água de mãos dadas. O piloto, porém, não teve tempo de abandonar o helicóptero e acabou tragado para as profundezas. “Ele ajudou quase todos a sair. Acho que afundou com o helicóptero, infelizmente. Foi um herói”, disse Jailson Moraes Bastos, primeiro a sair do Hospital da Unimed em Macaé. Para Valéria Cristina Taveiros, atendida no mesmo hospital, o frio do mar e da chuva, a força das ondas de dois metros e o medo de morrer não serão as únicas lembranças do horror, gravadas na memória para sempre.

Ela não esquece o cheiro de querosene que tomou conta da aeronave no pouso forçado. “Por Deus não explodiu, tinha querosene para todo lado.” Na queda, ela caiu em cima do colega Marcelo Manhães dos Santos. “Acho que ele já estava morto. Me soltei e saí do helicóptero”, recorda.

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O HELICÓPTERO da Petrobras, um Super Puma L2, flutuou por mais de uma hora antes de afundar 820 m

O corpo de Marcelo foi encontrado próximo ao helicóptero. Ele tinha 27 anos, era solteiro, gostava de funk e pagode. Os muitos amigos que acompanharam seu enterro em Rio das Ostras, próximo a Macaé, lembravam sua alegria de viver. Valéria e Jailson são contratados por firmas que prestam serviços à Petrobras, os chamados “terceirizados”. Marcelo e o piloto Paulo Roberto também eram. Todos, terceirizados ou não, segundo a estatal, recebem treinamento para saber como agir em acidentes. As instruções valeram para a maioria. Eles passaram de 30 a 40 minutos flutuando com salva-vidas, abraçados ou de mãos dadas. O procedimento, chamado “roda”, reduz o risco de hipotermia (queda de temperatura corporal) e ajuda na localização. Unidos pelo medo e pelo instinto, os sobreviventes eram arremessados pelas ondas, enquanto faziam juntos algo que o curso não ensina. “Rezamos o tempo todo e isso nos deu força”, contou Bastos, o único a falar com os jornalistas no hospital. Como sempre acontece em acidentes envolvendo a Petrobras, o episódio foi logo cercado de sigilo e os sobreviventes receberam a orientação de não falar com a imprensa.

O helicóptero, partido em dois, foi localizado por robôs submarinos a 820 metros de profundidade. Operados por controle remoto, os submarinos robotizados cortaram as ferragens e resgataram os corpos de Durval Barros da Silva e Adinoelson Simas Gomes, o único funcionário de carreira da Petrobras que morreu. O quarto corpo também foi encontrado no fundo do mar, mas até a noite de quinta-feira 28 a estatal não sabia informar se era de Paulo Roberto, o piloto herói, ou de Guaraci Novaes Soares, da empresa De Nadai Serviços e Alimentação. Dois dias depois do acidente, a Petrobras anunciou ter encontrado o quarto corpo. Outro continuava desaparecido até a noite da quinta-feira 28.

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