12/11/2003 - 10:00
Wagner Pinheiro nasceu em São Paulo, mas viveu tanto tempo em Campinas – onde estudou economia na Unicamp – que foi seduzido pelo time do Guarani. Em 10º lugar no Campeonato Brasileiro, tudo indica que o time de Campinas está perdendo um torcedor ilustre para o Flamengo, que tem uma torcida espetacular mas está pior ainda que o Guarani, em 12º lugar. Pinheiro, o presidente do fundo de pensão Petros, da Petrobras, desde fevereiro está morando no Rio e seus filhos, Pedro e Diego, já frequentam a escolinha de futebol do Flamengo – com o pai, é claro, fragorosamente seduzido pela cidade maravilhosa. É no Rio de Janeiro que Pinheiro administra um patrimônio de R$ 20 bilhões, construído em pouco mais de 30 anos. É lá também que ele acaba de ser eleito o dirigente nacional do ano pela Associação Nacional das Entidades de Previdência Privada, a Abrapp. Seu grande gol está sendo armado: colocar investimentos dos fundos de pensão – os tradicionais fundos de aposentadoria, formados principalmente em grandes empresas públicas (como o Previ, do Banco do Brasil) – nas obras de infra-estrutura do País, que são urgentes. Nada de filantropia. Fundo de pensão é um fundo de investimento que tem como princípio básico dar retorno a seus investidores. Com regras claras que bloqueiam qualquer desvio, ele calcula que esses fundos poderiam potencialmente proporcionar investimentos de R$ 30 bilhões a R$ 75 bilhões. “Isso é potencial, óbvio, e depende da taxa de juros, do ambiente econômico, do projeto”, se apressa em esclarecer para evitar mal-entendidos. Formado em gestão financeira pela FGV de São Paulo, Pinheiro faz parte de um grupo de debate sobre o papel dos fundos numa nova cultura, uma nova forma de investimento, que é a responsabilidade social. “Não se trata de abandonar os nossos critérios tradicionais de avaliação de investimento, mas, acoplado a esse instrumental, nós queremos construir o que chamamos de padrão mínimo de responsabilidade social”, diz ele nesta entrevista a ISTOÉ.
Nossa idéia é participar dos projetos de infra-estrutura que o governo pretende implementar no próximo ano e nos seguintes, baseado num desenho em que se pretende utilizar, em especial, das parcerias públicas e privadas. Uma lei sobre as parcerias que está no Congresso tem uma regra clara de que os fundos de pensão como investidores de longo prazo poderão participar desses investimentos. Então, em primeiro lugar há essa possibilidade de agirmos de maneira integrada com a sociedade e a necessidade que o Brasil possui de infra-estrutura. O Brasil precisa demais de investimentos nessa área e, se os fundos de pensão puderem participar, estarão contribuindo de maneira mais ampla, ajudando a arrumar emprego e também valorizando nossos artigos. Não podemos deixar de lembrar que esses fundos são parceiros de muitas empresas que precisam exportar, produzir a custos menores. Se, com o nosso investimento, conseguirmos modernizar a malha viária, todos estaremos ganhando.
Não. Este governo está deixando claro que quer oferecer aos investidores – e aí nós, os fundos de pensão, estamos incluídos – regras claras e uma regulamentação objetiva a respeito de parcerias de investimento que se façam com o poder público. Estou convencido de que o governo vai estabelecer uma regulação muito clara, objetiva, para que possa captar recursos, inclusive, de investidores externos – porque de outra maneira não virão recursos externos de longo prazo para o Brasil. Essas regras sendo objetivas – e eu acredito nisso –, nós teremos condições de avaliar claramente se podemos ou não participar do investimento. Também estou tranquilo para dizer que neste governo não haverá nenhuma mudança em relação à questão de investimento, no sentido de soltar uma resolução forçando os fundos a fazer investimentos compulsórios. O governo Lula não fará isso, mesmo porque a legislação hoje avançou muito em vários aspectos regulatórios. No regulamento do Conselho Monetário Nacional está claro que nenhuma regra pode determinar a aplicação compulsória dos fundos de pensão. Estou absolutamente tranquilo de que o governo Lula não vai mudar essa
regra nem fazer um outro tipo de ação para forçar o investimento
numa área que interesse a ele.
Havendo boa regulação e uma análise técnica que nos
permita concluir que temos boas condições de investimento, um outro aspecto importantíssimo nessas parcerias é que o fundo e seus parceiros (como o financiador BNDES, por exemplo) estabeleçam um manual de governança no contrato do projeto para que tenham participação na definição de como será a gestão, como se definirá a equipe executiva do projeto e regras claras de possibilidade de saída do investimento. O nosso objetivo não é um investimento passivo, como se estivesse fazendo um investimento financeiro num banco em que eu ponho lá o dinheiro e fica a cargo do banco fazer com que meu investimento renda. Queremos ter um contrato de governança buscando uma boa integração para participar de todas as ações decisórias do projeto.
Isso é fundamental. Com o tempo nós aprendemos que fundo de pensão não pode dar o dinheiro e esperar a rentabilidade. Dado o seu porte, é um investidor que tem de participar de todas as decisões, não pode ficar afastado porque invariavelmente acaba acontecendo de o gestor – nem sempre por má intenção, mas por ter outros objetivos – desviar a forma de utilização do recurso numa atividade que ele entende que poderia ser rentável, mas não necessariamente vai cumprir com a minha necessidade, até de caixa, por dez, 15 anos. Por isso é preciso ter uma participação ativa num projeto da monta de R$ 20 bilhões.
É difícil dar um número. O que eu tenho falado com tranquilidade é que nós da Petros temos recursos de R$ 2 bilhões a
R$ 2,5 bilhões com possibilidade de investimentos a longo prazo, para retorno com mais de dez anos. Outro dia eu estava fazendo um exercício com o Guilherme Lacerda, presidente da Funcef, e também com o Sergio Rosa (presidente da Previ) e depois de alguns cálculos chegamos à conclusão de que nós teremos um potencial de investimento de R$ 30 bilhões a R$ 75 bilhões. Isso é potencial, óbvio, e depende da taxa de juros, do ambiente econômico, do projeto, enfim. Mais que isso: o fato de os fundos de pensão investirem em projetos dessa natureza pode funcionar como captador de atração de recursos externos.
Nós estivemos nos Estados Unidos e na Holanda numa reunião com representantes de fundos de pensão e ficou muito claro que os fundos desses países têm disposição para investir no Brasil, desde que fundos brasileiros com perfil semelhante ao deles também participem. Isso por uma questão de segurança, assegurada, primeiro, pelos objetivos semelhantes (investimentos de longo prazo com risco moderado) e, segundo, porque a presença de um investidor local afiança o projeto. Então, o potencial de investimento pode ser muito maior nesse tipo de projeto. Por isso, estou bastante tranquilo que o governo vai procurar aprovar no Congresso toda a regulamentação – um dos pilares fundamentais –, que seguirá no sentido de dar segurança ao investidor, sem, no entanto, prejudicar seus cidadãos, usuários, enfim, a população em geral; sem fazer contratos que sejam lesivos ao consumidor porque senão também não adianta. O governo pretende encaminhar o projeto em forma de lei ao Congresso nos próximos dias, na esperança de conseguir a sua aprovação ainda este ano.
No caso, na forma que está sendo desenhado o investimento, não vai ser assim porque o poder concedente – seja Estado, União, município – faz o processo de concessão, faz o
processo da parceria, contratos são estabelecidos e assinados e as obras são implementadas. Acho também que essa história de que um não continua a obra do anterior já é muito menor no Brasil. Nós temos melhorado. Isso ainda existe, mas diminuiu.
Formamos em abril um grupo de debate sobre o nosso papel na nova cultura, na nova forma de investimento, que é a responsabilidade social. Não se trata de abandonar os nossos critérios tradicionais de avaliação de investimento, mas acoplado a esse instrumental nós queremos construir o que chamamos de padrão mínimo de responsabilidade social. Estamos encerrando o primeiro ciclo, que foi um convênio feito entre a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) e o Instituto Ethos para estabelecer alguns parâmetros de responsabilidade social de investimentos dos fundos de pensão, que devem ser debatidos nos próximos dias. Alguns dos parâmetros são governança corporativa, balanço social, inclusão social, relação com a mão-de-obra, questão da mão-de-obra terceirizada, meio ambiente, geração de renda, projetos sociais, ética e transparência, políticas de investimento, além dos critérios tradicionais, obviamente. Em cima desses itens nossa idéia é um dia quem sabe criar padrões como têm as instituições que avaliam riscos de países. Quem sabe um dia a gente também terá a classificação do risco social das empresas. Não estamos falando em filantropia, e sim de ações que integrem aquele investimento de maneira ampla em todos os sentidos. É um processo construtivo.
Estou bastante otimista. Este foi um ano duro para todos nós, mas o governo Lula não teve dúvidas que estabilizar a moeda é fundamental para o Brasil. É claro para todos nós, que já vivemos vários processos inflacionários, que inflação alta prejudica distribuição de renda, prejudica o mais pobre e nisso o governo tomou uma decisão fundamental: acertar a inflação, porque sem isso não se consegue voltar a crescer e não se consegue prover recursos de longo prazo para o País, o que amarra qualquer investidor brasileiro, inclusive nós. Sem dúvida, este primeiro ano foi duro, mas conseguiu estabilizar e trazer os indicadores macroeconômicos para níveis mais razoáveis. Claro que com o custo do não crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e de um crescimento altíssimo do desemprego.
Nunca vale a pena. Eu acredito que esse período duro acaba não possibilitando a retomada do crescimento e, portanto, a retomada de emprego. Foi um período necessário. Se não fosse assim, talvez estivéssemos numa situação muito pior hoje em dia, em condições macroeconômicas bem mais desgastadas, talvez com dificuldades de captação de recursos externos. Foi um período ruim e difícil de enfrentar, mas necessário. Eu acho que daqui para a frente as condições para a recuperação são dadas. O governo tem apontado que as taxas de juros reais vão cair consistentemente, e, dado que as condições macroeconômicas estão estabilizadas, nós poderemos ver a retomada do investimento produtivo, a retomada do crescimento e a geração de empregos que é prioridade do governo Lula.
É difícil dizer. Se hoje em dia a taxa de risco do Brasil é de 600 pontos, o ideal é que a taxa ficasse próxima de 6%, 7%. Tem uma lógica que permite imaginar que o caminho é para isso. Aparentemente poderia cair mais, mas o que está claro para mim é que o governo optou pelo que eles chamam de gradualismo, o devagar e sempre. A recuperação da economia pode e vai se dar, mas aponta para um caminho de redução consistente da taxa de juros de maneira que não surjam surtos repentinos da inflação, soluços inflacionários. Acho que o ano que vem será um ano de muitas realizações. As condições estão dadas para que se inicie a retomada do processo de crescimento.
Acho que as críticas estão vindo um pouco cedo. Crítica faz parte da vida democrática. O governo está com objetivos muito claros na definição das suas políticas de atuação. E, de novo, na área econômica deixou claro desde o início o seu caminho: estabilizar e criar um ambiente favorável à retomada do crescimento.
Acho que as críticas estão vindo um pouco cedo. Crítica faz parte da vida democrática. O governo está com objetivos muito claros na definição das suas políticas de atuação. E, de novo, na área econômica deixou claro desde o início o seu caminho: estabilizar e criar um ambiente favorável à retomada do crescimento.