“Somos do FSB. Larguem as armas, se alguém se mexer, a gente atira.” Parece cena de filme, mas isso de fato aconteceu. Explica-se: FSB é o sucessor do temido KGB (serviço secreto da extinta União Soviética) e usou esse famoso bordão para prender o homem mais rico da Rússia, no sábado 25. Mikhail Khodorkovsky, 40 anos, principal acionista e executivo da maior empresa russa – a gigante do petróleo Yukos –, foi abordado e detido em seu jato particular na cidade siberiana de Novosibirsk, quando se dirigia para Moscou. Pesam contra ele sete acusações de fraudes e sonegação de impostos.

A Yukos é a quarta maior empresa de petróleo do mundo e responsável por mais de 5% do PIB russo. Como seu principal controlador, Khodorkovsky possui uma fortuna estimada pela revista americana Forbes em US$ 8 bilhões (o que o torna o 26º homem mais rico do mundo). Seria ingênuo pensar que uma operação desse porte não tivesse a anuência do presidente Vladimir Putin. Na quinta-feira 30, o governo congelou as ações da Yukos, praticamente tomando o controle da companhia. Se isso se efetivar, será uma intervenção sem precedentes desde a época soviética.

O episódio causou grande tumulto no setor financeiro da Rússia. Na segunda-feira 27, a Bolsa de Valores de Moscou despencou mais de 10%, e a queda no valor das ações da Yukos foi tão acentuada que sua negociação foi suspensa por uma hora. Três dias depois, o chefe de gabinete, Alexander Voloshin, foi demitido por se opor à prisão do empresário. Houve temores de que uma crise parecida com a de 1998, causada pela moratória russa, pudesse se repetir.

Ex-militante comunista, Khodorkovsky fundou o banco Menatep
em 1987 e iniciou uma trajetória milionária, comprando empresas
estatais privatizadas pelo governo de Bóris Yeltsin a preços simbólicos. Seu pulo do gato aconteceu em 1995, quando o Menatep arrematou a Yukos pela bagatela de US$ 350 milhões. Hoje, a empresa vale mais de US$ 30 bilhões. As enroladas privatizações das estatais russas geraram uma hiper-restrita classe de dirigentes, os oligarcas – empresários
que fizeram fortuna com as privatizações depois do colapso soviético.
Os 20 principais oligarcas controlam nada menos que 70% da economia do país. Com a subida ao poder do ex-chefe do KGB Vladimir Putin, há três anos, houve um certo “acordo”, segundo o qual os oligarcas se manteriam afastados da política. Bilionários que ousaram desafiar essa “lei”, como os magnatas da comunicação Boris Berezovsky e Vladimir Gusinsky, foram processados, tiveram seus bens confiscados e foram obrigados a se exilar.

Khodorkovsky, como o mais vistoso executivo do país, adotou uma linha de confronto. Recentemente, comprou o Moskovsky Novosti, famoso jornal de Moscou, e contratou Yevgeny Kiselyov, um ferrenho crítico do Kremlin, como editor. O bilionário russo ainda cutucou Putin com vara curta ao financiar dois partidos políticos de oposição. As eleições parlamentares em dezembro e as presidenciais em março podem ter pesado no endurecimento de Putin.