05/11/2003 - 10:00
O ministro do Planejamento, Guido Mantega, tem um compromisso importante na semana que vem. O presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP), estará à sua espera para receber um documento de
seis folhas, cinco capítulos e uma proposta que promete abrir uma nova frente na relação entre o Estado e a comunidade empresarial. Trata-se do projeto de lei que institui as Parcerias Público-Privadas (PPPs), nascidas basicamente para combater a notória incapacidade da União
em fazer investimentos. “Com as PPPs, o governo vai reconstituir a capacidade de planejamento que havia perdido e passar a dividir os
riscos com a iniciativa privada”, diz Mantega.
O modelo é relativamente novo. Faz menos de uma década que começou a ser implantado, com muitos sucessos e alguns fracassos, em países como Inglaterra, Portugal, Espanha e África do Sul. No Brasil, é novidade absoluta que já nasce com avanços em relação a esses países, segundo um dos principais articuladores do projeto, o assessor especial do ministério Fernando Haddad. “As parcerias já acontecem, mas não do modo como estamos propondo. Vamos inaugurar um modelo misto, que une as virtudes do Estado, como sua visão de longo prazo, com a eficiência do setor privado”, afirma o ministro. Quando aprovado (Cunha já disse ao ministro que vai se esforçar para que isso aconteça ainda
em 2003), o projeto vai permitir que obras de infra-estrutura sem apelo comercial sejam construídas. A previsão é de que pelo menos R$ 36 bilhões sejam investidos por empresas privadas nos próximos quatro anos em obras como ferrovias, rodovias, portos, projetos de saneamento e habitação e tudo o mais que envolva serviços públicos.
No papel, as coisas são bem simples. O governo aponta quais obras
quer ver erguidas. As empresas fazem o investimento, sozinhas ou junto com alguma esfera estatal (União, Estados, municípios e companhias estatais são contempladas pela lei) Para tornar o projeto atraente, o Estado garante uma rentabilidade do empreendimento por um período.
Um exemplo prático: a BR-101, em seu trecho nordestino, precisa ser duplicada e reformada. O governo não tem dinheiro e a iniciativa privada não se atrai a tocar a obra, pois não há fluxo suficiente para garantir a lucratividade do empreendimento. Se a obra surgir de uma parceria
nos novos moldes, o governo garante à empresa que desembolsou milhões para fazer a estrada uma rentabilidade pré-determinada durante algum tempo. “A sociedade ganha a estrada, o governo não gasta um dinheiro que não tem e a empresa faz um investimento seguro e rentável”, diz o ministro.
“A União investe muito menos que o necessário, o que condena o
cidadão brasileiro a não ter as obras que tem direito”, diz o presidente
da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústria de Base, José Augusto Marques. “As PPPs vêm preencher uma lacuna importante
como instrumento de aplicação de recursos”, diz o executivo, um dos principais interlocutores do Ministério no processo de discussão do projeto de lei. “É uma questão de escolha: ou utilizamos as PPPs ou não teremos as obras desejadas”, afirma o engenheiro Pio Gavazzi, diretor de infra-estrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Ambos fazem uma ressalva importante, nascida da eterna fama de mau pagador do Estado: é preciso garantias fortes de que os empreendedores privados vão receber o devido. Afinal, são projetos de até 30 anos de duração que não podem morrer à primeira mudança de governo (outra prática que o Brasil conhece bem). “Estamos criando fundos com ativos públicos valorizados e de liquidez para garantir os pagamentos”, diz Mantega. O futuro agradece.
O ovo de Mantega |
O ministro Guido Mantega, embora cumprindo uma agenda de trabalho quase desumana (“o Ministério está a mil por hora”, diz, em tom eufórico), recebeu ISTOÉ em seu gabinete, no início da tarde da quarta-feira 29. Seguem os principais trechos da entrevista, na qual ele detalha o que considera um “ovo de Colombo”, o projeto de Parcerias Público-Privadas. ISTOÉ – Qual a importância das PPPs para o projeto de desenvolvimento do governo? ISTOÉ – Por que essa necessidade? A demanda não acaba por atrair investimentos? ISTOÉ – E por que os esforços estão centrados nos projetos de infra-estrutura? ISTOÉ – Hoje o Estado não possui mais essa capacidade de ISTOÉ – O mundo já adota esse modelo? ISTOÉ – Quais as vantagens do modelo? ISTOÉ – Qual o volume de investimentos esperado? ISTOÉ – Será mais rentável investir em infra-estrutura do que no mercado financeiro? ISTOÉ – A garantia de rentabilidade não elimina o risco? ISTOÉ – As obras públicas no Brasil padecem de três problemas crônicos: os custos, os prazos e a corrupção. As PPPs se defenden deles? João Paulo Nucci |