Apesar do nome pomposo, objetos de
design não têm de ser necessariamente caros, feitos para poucos eleitos. Ao contrário. Um bom designer é aquele que consegue criar soluções para problemas do cotidiano ou simplesmente injetar beleza em artigos utilizados há gerações. Esta foi a preocupação dos mais de 300 profissionais inscritos na 17ª edição do Prêmio Design Museu da Casa Brasileira, que será entregue em São Paulo na quarta-feira 6, Dia do Designer. Arquitetos, desenhistas industriais e artistas plásticos de todas as regiões do País enviaram projetos para a seleção. O mais experiente deles, o designer Michel Arnoult, 81 anos, conquistou o primeiro lugar na categoria mobiliário.

Considerado um dos introdutores do modernismo no móvel brasileiro, Arnoult veio de Paris para o Rio de Janeiro, em 1950, para fazer um estágio no escritório do arquiteto Oscar Niemeyer. Especializado em móveis do tipo “faça-você-mesmo”, um ano depois mudou-se para São Paulo e criou seu escritório de design. Há peças suas no próprio Museu da Casa Brasileira e na rede Tok & Stok. Depois de ter atuado várias vezes como jurado, resolveu estrear na competição com a cadeira Pelicano, um móvel de linhas modernas, pra lá de engenhoso. “Como o bico da ave é grande o suficiente para levar seus filhotes, pensei que seria confortável sentar dentro dele”, explica. Assim, Arnoult criou uma poltrona semelhante àquelas de diretor, só que mais confortável e fácil de desmontar. É feita de lona de algodão costurada em forma de saco e presa a uma estrutura de madeira por apenas quatro pinos. “Esse é o meu conceito de móvel prático, com bom desenho e barato”, diz. “Sonho convencer o dono das Casas Bahia (Samuel Klein) a comprar meu trabalho e vendê-lo para o grande público.”

Visitantes – Nem sempre é fácil pôr o melhor design ao alcance da população. Que o diga Adélia Borges, diretora do Museu da Casa Brasileira. Jornalista e professora de história do design na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), há seis meses ela assumiu a missão de trazer o público àquele que é o único museu brasileiro dedicado exclusivamente ao mobiliário e à decoração. Quando Adélia chegou, a bela mansão em estilo neo-clássico recebia apenas 200 visitantes por mês. “Todos ficavam intimidados, achando que um casarão semicerrado em plena avenida Faria Lima só podia ser prédio do governo ou morada de algum ricaço”, lembra Adélia.

Para mostrar que o espaço é aberto à comunidade, a diretora mandou abrir os portões de ferro. Além disso, colocou cartazes no muro anunciando as atrações que o visitante poderia conhecer: uma retrospectiva do mobiliário brasileiro desde o século XVI (leia quadro à pág. 64), uma livraria especializada em obras sobre desenho industrial, um restaurante e um jardim com mais de 500 árvores, onde todo domingo é possível assistir a concertos e atividades lúdicas. Além das exposições de peças do acervo, montou um calendário de mostras temporárias. A primeira, sobre artesanato brasileiro, foi um sucesso e ajudou o museu a atingir a marca de três mil visitantes por mês. A atual, Inovações Suecas, tem atraído amantes de tecnologia e fãs de objetos hi-tech, como um aspirador de pó automático e celulares de última geração.

Acervo – Além da programação variada, o Museu da Casa Brasileira oferece uma imagem de como viviam os integrantes da burguesia paulista do início do século XX. É que a mansão onde está instalado pertenceu ao casal Fábio Prado e Renata Crespi. Ele, um legítimo herdeiro de barões do café, foi prefeito da cidade de 1934 a 1937 e contratou o modernista Mário de Andrade como secretário da Cultura. Ela, filha do conde italiano Rodolfo Crespi, foi amiga de artistas como Victor Brecheret e dedicou a vida a garimpar obras de arte e relíquias de mobiliário em antiquários do Brasil e da Europa. Ambos costumavam encomendar obras a artistas então iniciantes, como Cândido Portinari, Pedro Alexandrino e Alfredo Volpi. Como não tiveram filhos, doaram a casa e todos os seus tesouros ao povo paulista. Em 1970, por idéia do sociólogo Sérgio Buarque de Hollanda, foi criado o Museu da Casa Brasileira. Dois anos depois, a Coleção Crespi Prado, que inclui móveis e antiguidades como louças da Companhia das Índias, foi incorporada à instituição.

A partir da quinta-feira 7, quando a mostra Prêmio Design Museu da Casa Brasileira estará aberta ao público, será possível ter acesso ao passado e ao futuro do design brasileiro. Além da cadeira Pelicano, haverá um fogão idealizado pelo carioca Guto Índio da Costa para ilustrar como até mesmo essa peça pode ser renovada. Outro objeto curioso é o cabide Sequinha, do designer baiano Manuel Bandeira. Feito de plástico, tem ganchos para pendurar calcinhas e ventosas que grudam no azulejo. Entre as 60 peças selecionadas, há artigos curiosos como a linha de xícaras para café com pires ovalados, criada por Sara Rosemberg e Anete Ring, e móveis de piscina, criados com o mesmo material daqueles espaguetes de natação (a espreguiçadeira Anelídeos, de Eulália Anselmo). Além desses, há uma infinidade de objetos desenvolvidos com o melhor do design brasileiro: tapetes, mochilas escolares, aparelhos médicos e móveis de botequim. É ou não é uma chance imperdível para o dono das Casas Bahia dar uma bela arejada no seu estoque?