Uma fatalidade aconteceu em novembro de 1995. O cearense Francisco Nilson, 25 anos, foi vítima de uma bala perdida quando passeava na praia de Iracema, em Fortaleza. O rapaz ficou paralítico. Dez meses depois, o vaqueiro Marcus Antônio Araújo, 31, fez uma promessa. Entrou na Igreja Nossa Senhora do Patrocínio e pediu a Deus que fizesse seu irmão voltar a andar. Em agradecimento, viajaria do Ceará até o Santuário de Nossa Senhora Aparecida (SP), a cavalo. Ele não tinha dinheiro e muito menos o animal. Na saída da igreja foi abordado por uma vendedora de bilhetes que insistiu para que ele comprasse um jogo de R$ 3. Tinha só R$ 1 no bolso e, para ajudá-la, comprou uma raspadinha de R$ 0,50. Ganhou R$ 2 mil. Marcus interpretou “aquilo” como um aviso. Comprou um cavalo e resolveu pagar a promessa antes de receber a graça.

Montado em Sertanejo, um mangalarga marchador, saiu do Ceará rumo a São Paulo, em outubro de 1996, com R$ 200 no bolso. “Evitei a BR-116. Fui beirando as praias para não me perder.” O cavalo fazia 30 quilômetros por dia. Quando o dinheiro acabou, eles comiam o que as pessoas davam e dormiam onde era possível. “O importante era pagar a promessa.” Mas nem tudo saiu como esperava. Quando chegou ao Recife foi processado pela Associação Protetora dos Animais. “Para o órgão, a viagem era um desrespeito aos direitos dos animais. Queriam que eu deixasse o cavalo e cumprisse a promessa de bicicleta.” O caso foi parar na Justiça. Diante do conflito, o juiz Waldério Vasconcelos mandou examinar o cavalo. Alguns carrapatos foram encontrados e o vaqueiro foi condenado. “Tive de cuidar dos cavalos do haras da cidade por 30 dias. Depois, o juiz extinguiu minha pena e eu fui embora.”

O vaqueiro e o cavalo pegaram de novo a estrada. Percorreram oito Estados. Mas, no Espírito Santo, Sertanejo caiu, quebrou a pata e foi sacrificado. O acidente virou notícia e Marcus ganhou de um fazendeiro outro manga-larga para terminar de cumprir a promessa. Foi com Corisco que ele chegou a Aparecida, em novembro de 1998, depois de percorrer mais de quatro mil quilômetros. Pagou a promessa, voltou para o Ceará de ônibus e deixou Corisco em Aparecida, com o fazendeiro Jorginho Mansur, que prometeu tomar conta do cavalo até que Marcus voltasse para buscá-lo. Há três semanas, ele saiu do Ceará com a intenção de publicar um livro sobre a promessa e levar Corisco. Desceu no Rio e foi assaltado na rodoviária. “Levaram até a cópia do livro”, lamentou. Mas não se deu por vencido. De carona, foi buscar Corisco. E qual foi a surpresa: “O fazendeiro o vendeu por R$ 350. Quero meu cavalo. Pretendo voltar para o Ceará nele.” Disse que vai brigar na Justiça. O jurista Damásio de Jesus avaliou o caso. “O que o fazendeiro fez se chama apropriação indébita. Vendeu o que não era dele. Se o cavalo for encontrado, a venda pode ser anulada. Se não, o rapaz tem direito a uma indenização.” Sobre o irmão, Marcus foi otimista: “Ele não voltou a andar com os pés, mas com o espírito. Vai se formar em química. Quer ser um Einstein e ganhar o Nobel. Se curou, viu que nada é impossível, nem mesmo para quem vive em uma cadeira de rodas.”