A maioria das famílias tem alguma criança que não gosta muito de comer. É normal. Mas, se a rejeição à comida ultrapassa os limites, ou seja, se a criança se recusa a ingerir os alimentos mesmo que sua saúde esteja dando sinais de fragilidade, é bom se preocupar. Essa criança pode estar sofrendo de anorexia ou bulimia, dois transtornos alimentares que começam a se tornar cada vez mais comuns em jovens com menos de 18 anos. De origem genética, as enfermidades estão associadas a uma profunda distorção da imagem corporal. No caso da anorexia, o doente sempre se acha gordo, mesmo estando magérrimo. Na bulimia, o indivíduo também manifesta uma obsessiva preocupação com a forma física, sente-se culpado por comer e acaba vomitando o que ingere.

Embora seja um fenômeno ainda recente – por isso ainda não há estatísticas –, o crescimento dos distúrbios em crianças e adolescentes preocupa os especialistas. Tanto é que o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo inaugurou há pouco mais de um mês um serviço específico para tratar pessoas com menos de 18 anos afetadas por esses problemas. “Começamos a notar uma incidência cada vez maior em faixas etárias mais baixas. Cheguei a atender crianças com dez anos sofrendo de anorexia”, afirma Táki Cordás, psiquiatra e coordenador do Projeto de Atendimento à Infância e Adolescência com Transtornos Alimentares.

Em relação à bulimia, os especialistas ainda não detectaram doentes de idade tão precoce, mas registram casos de adolescentes de 15, 16 anos. De acordo com os médicos, a tendência é ocorrer um crescimento ainda maior do problema entre os mais jovens. Uma das razões é o culto ao corpo, atitude que vem sendo demonstrada cada vez mais cedo. “Existe uma supervalorização da estética e a criança está muito influenciada”, comenta Wimer Bottura, psiquiatra de São Paulo. Em seu consultório, Bottura também está atendendo pacientes mirins
com maior frequência.

O tratamento oferecido no HC às crianças e adolescentes não será muito diferente do adotado para adultos. Os pequenos pacientes contarão com atendimento de nutricionista para ensinar a seguir uma dieta saudável, de psiquiatras e também de psicólogos que ajudarão na formação de uma nova imagem corporal. Em alguns casos, poderá ser recomendada a realização de terapia familiar. “Não que a família cause o problema, mas ela pode influenciar ao valorizar, por exemplo, o excesso de atividade física para manter a forma”, comenta Cordás. Quanto mais cedo o tratamento for iniciado, melhor. “É muito mais fácil conseguir tratar um mau hábito quando o paciente ainda é criança ou adolescente, antes de o problema se tornar realmente um vício”, explica Cordás.